Estado Islâmico é derrotado após tentativa de tomar prisão repleta de crianças na Síria

Dados extraoficiais sugerem centenas de extremistas mortos durante os violentos combates que duraram seis dias

As Forças Democráticas Sírias (FDS) retomaram na quarta-feira (26) o controle da prisão de Ghwayran, na cidade de al-Hasakah, na Síria, que havia sido invadida por combatentes do Estado Islâmico (EI). Dados extraoficiais sugerem dezenas de integrantes das FDS e centenas de extremistas mortos durante os violentos combates que duraram seis dias.

Os jihadistas invadiram a prisão com o objetivo de libertar centenas de seguidores do EI detidos no local. Diante da rápida resposta das FDS, os extremistas se refugiaram em um espaço no qual cerca de 700 meninos e adolescentes estavam encarcerados. Os jovens chegaram a ser usados como escudo humano durante o combate.

Problema global

As FDS contam com o suporte de uma coalização liderada pelos EUA e composta por mais de 30 países, cuja missão é combater o EI na Síria e no Iraque. Nos últimos anos, com o grupo extremista derrotado nesses dois países, muitos dos combatentes capturados foram jogados em prisões e campos de detenção criados para funcionar temporariamente, até que os presos retornassem a seus países de origem. O problema é que muitas nações simplesmente se recusam a receber seus cidadãos de volta.

“Este não é um problema apenas dentro desta cidade (al-Hasakah). Este é um problema global que exige que muitas nações se unam para desenvolver uma solução duradoura a longo prazo. As prisões improvisadas em toda a Síria são um terreno fértil para a ideologia fracassada do Daesh (sigla em árabe para Estado Islâmico)”, afirmou o major-general norte-americano John W. Brennan Jr., que comanda a coalizão.

Cidade de al-Hasakah, na Síria, vista do alto (Foto: Wikimedia Commons)

A prisão de Ghwayran era a maior do gênero gerida pelas FDS. Estava repleta de ex-combatentes do EI presos quando o grupo foi derrotado. São cidadãos de diversas nacionalidades que jamais sofreram qualquer acusação formal ou passaram por um tribunal, segundo o jornal The New York Times. Além dos adultos, também ficavam ali as 700 crianças, cujos pais haviam se juntado ao grupo extremista. Lá os jovens eram um alvo fácil para a radicalização, podendo criar assim uma nova geração de jihadistas

Segundo Brennan Jr., a retomada da prisão é apenas uma pequena vitória na batalha contra o grupo extremista. “O Daesh continua sendo uma ameaça existencial para a região e não deve ser permitido que se regenere”, disse o militar. “Devemos investigar minuciosamente as circunstâncias que permitiram que esse ataque acontecesse. Embora ainda haja muito trabalho a ser feito em Hasakah, continuamos comprometidos em aconselhar, ajudar e capacitar nossos parceiros no Iraque e no nordeste da Síria”.

John W. Brennan Jr., que lidera a coalizão de combate ao Estado Islâmico (Foto: Wikimedia Commons)

Por que isso importa?

Nos últimos anos, o EI se enfraqueceu financeira e militarmente. Em 2017, o exército iraquiano anunciou ter derrotado a organização no país, com a retomada de todos os territórios que ela dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do Iraque, hoje mantém apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos, quase sempre focados em agentes do governo. Já as FDS, uma milícia curda apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela organização extremista na Síria.

De acordo com um relatório do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), publicado em julho de 2021, a prioridade do EI atualmente é “o reagrupamento e a tentativa de ressurgir” em seus dois principais domínios, Iraque e Síria, onde ainda mantém cerca de 10 mil combatentes ativos. O documento sugere, ainda, que o grupo teve considerável perda financeira, devido a dois fatores: as operações antiterrorismo no mundo e a má gestão de fundos por parte de seus líderes.

Paralelamente à derrocada do EI, a pandemia de Covid-19 reduziu o número de ataques terroristas em regiões sem conflito, devido a fatores como a redução do número de pessoas em áreas públicas. Entretanto, grupos jihadistas têm se fortalecido em zonas de conflito, e isso pode causar um impacto na segurança global conforme as regras de restrição à circulação são afrouxadas.

Esse cenário permitiu ao EI, particularmente, ganhar uma sobrevida, fazendo uso sobretudo do poder da internet. À medida em que as restrições relacionadas à pandemia diminuem gradualmente, há uma elevada ameaça de curto prazo de ataques inspirados no grupo fora das zonas de conflito. São ações empreendidas por atores solitários ou pequenos grupos que foram radicalizados e incitados através da internet.

Atualmente, o principal reduto do EI é o continente africano, onde consegue se manter relevante graças ao recrutamento online e à ação de grupos afiliados regionais. A expansão do grupo em muitas regiões da África desde o início de 2021 é alarmante e pode marcar a retomada de força da organização.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

Tags: