EUA aceleram reformulação das defesas de Taiwan para dissuadir a China de uma invasão

Estratégia do governo Biden é fazer da ilha semiautônoma um lugar repleto de armas e "perigoso demais" para ser invadido

Tendo em mente uma presença militar mais vigorosa na região, que possa fazer frente ao exército chinês no caso de tentativa de anexação de Taiwan, o presidente dos EUA, Joe Biden, está agindo mais rapidamente na reformulação do sistema de defesa na ilha semiautônoma. As informações são do jornal The New York Times.

Levando em conta o exemplo vindo da invasão russa à Ucrânia, duas coisas ficaram claras para autoridades norte-americanas e taiwanesas: a de que um líder autocrata pode declarar guerra a qualquer momento e que um pequeno território pode resistir a um “Golias”.

A estratégia é fazer de Taiwan aquilo que as autoridades definem como “porco-espinho”, ou seja, um território abarrotado de armamentos que se mostre perigoso para ser atacado, particularmente por conta da sombra do maior aliado: Washington.

Os modernos caças J-16D são invisíveis ao radar e foram projetados para atuar em condições idênticas às encontradas em Taiwan (Foto: Global Times/China)

Não é de hoje que a ilha tem mísseis capazes de atingir a China. Porém, as armas de fabricação norte-americana recentemente adquiridas, entre elas plataformas de foguetes móveis, caças F-16 e projéteis antinavio, são o que há de melhor para dar uma resposta a Beijing no caso de uma incursão.

Alguns analistas militares ainda sustentam que, a exemplo do que acontece na Ucrânia, o governo Biden, embora rejeite a possibilidade de enviar tropas, poderia fornecer inteligência para potencializar a letalidade das armas.

Washington têm feito um lobby discreto para que Taiwan compre equipamentos mais apropriados para um formato de “guerra assimétrica”, tipo de conflito no qual um exército menor usa sistemas móveis para realizar ataques letais contra uma força muito maior.

Enquanto isso, navios de guerra americanos atravessam o Estreito de Taiwan desde o início de 2020, e nações parceiras como Austrália, Grã-Bretanha, Canadá e França são elogiadas por autoridades dos EUA quando fazem o mesmo.

Na opinião de analistas, agindo assim, os EUA estariam sendo provocativos em vez de estarem impondo meios de dissuasão, atitude que pode motivar o presidente chinês Xi Jinping a ordenar um ataque a Taiwan.

Uma ofensiva chinesa contra a ilha pode ser executada de diversas maneiras: um ataque marítimo e aéreo em grande escala contra a ilha principal, uma invasão de pequenas ilhas mais próximas da costa sudeste da China, um bloqueio naval ou até mesmo ciberataques.

Uma declaração de Biden durante visita a Tóquio nesta semana, tida como uma das mais fortes de um mandatário norte-americano em relação à espinhosa questão China-Taiwan em décadas, foi interpretada como provocativa por Beijing. Quando foi perguntado se “estaria disposto a se envolver militarmente para defender Taiwan”, a resposta do chefe da Casa Branca foi “sim”, alegando um “compromisso” com o território semiautônomo.

Além disso, falou de forma explícita que tomaria medidas que vão além do que seu país fez na Ucrânia. Embora o governo chinês possa enxergar beligerância nessas colocações, segundo a reportagem, “elas são consistentes com a nova ênfase de Washington na dissuasão forçada”.

China contra a parede

Os Estados Unidos têm instado seus aliados a se manifestem sobre a questão Taiwan, de modo a dar demonstrações a Beijing de que Washington tem poder de influência para colocar outras nações contra a China se ela tornar a invasão uma realidade. Na segunda-feira (23), o primeiro-ministro japonês Fumio Kishida declarou a repórteres que ele e Biden estão de acordo quanto à “importância da paz e da estabilidade do Estreito de Taiwan”.

Desde que o conflito no Leste Europeu teve início em 24 de fevereiro, Washington organizou uma coalizão de parceiros europeus e asiáticos para decretar sanções contra a Rússia. Autoridades dos EUA alegam que tais medidas servem como uma mensagem endereçada à China e outras nações sobre o preço a pagar por uma invasão como a coordenada pelo presidente Vladimir Putin.

As mesmas autoridades inclusive já discutem como replicar as penalidades econômicas e a mesma ajuda militar oferecida à Ucrânia no caso de um evento semelhante em Taiwan.

Os líderes chineses precisam fazer um cálculo complexo para avaliar se suas forças conseguiriam tomar Taiwan sem cometer um atentado astronômico contra o próprio país. Para conquistar a ilha, a Marinha chinesa precisaria cruzar mais de 160 quilômetros de água e fazer um ataque anfíbio, uma operação ainda mais complicada do que qualquer estratégia de Putin no seu país vizinho.

O Exército de Libertação Popular da China realizou manobras militares perto de Taiwan na quarta-feira (25). O treinamento, uma resposta às declarações de Biden, serviram como uma “advertência contra a conspiração entre as forças separatistas e os Estados Unidos”, disse o coronel Shi Yi, porta-voz do Comando do Teatro Oriental, em comunicado.

Ele acrescentou que “é hipócrita e fútil que os Estados Unidos digam uma coisa e façam outra sobre a questão de Taiwan”.

Por que isso importa?

Taiwan é uma questão territorial sensível para os chineses. Nações estrangeiras que tratem a ilha como autônoma estão, no entendimento de Beijing, em desacordo com o princípio defendido de “Uma Só China“, que também encara Hong Kong como parte do território chinês. Diante da aproximação entre Taipé e Washington, desde 2020 a China endureceu a retórica contra as reivindicações de independência da ilha.

Embora não tenha relações diplomáticas formais com Taiwan, assim como a maioria dos países do mundo, os EUA são o mais importante financiador internacional e principal fornecedor de armas do território, o que causa imenso desgosto a Beijing, que tem adotado uma postura belicista na tentativa de controlar a situação.

Jatos militares chineses passaram a realizar exercícios militares nas regiões limítrofes com Taiwan e habitualmente invadem o espaço aéreo taiwanês, deixando claro que a China não aceitará a independência do território “sem uma guerra“.

embate, porém, pode não terminar em confronto militar, e sim em um bloqueio total da ilha. É o que apontaram relatórios produzidos pelos EUA e por Taiwan em junho de 2021. O documento taiwanês pontua que Beijing não teria capacidade de lançar uma invasão em grande escala, justamente por se tratar de uma ilha. Já segundo o Pentágono, isso “provavelmente sobrecarregaria as forças armadas chinesas”.

Caso ocorresse, a escalada militar criaria um “risco político e militar significativo” para Beijing. Ainda assim, ambos os relatórios reconhecem que a China é capaz de bloquear Taiwan com cortes dos tráfegos aéreo e naval e das redes de informação. O bloqueio sufocaria a ilha, criando uma reação internacional semelhante àquela que seria causada por uma eventual ação militar.

Em artigo publicado em novembro, Michael Beckley e Hal Brands alertaram que o tempo está se esgotando para frear o ímpeto belicista chinês. “Os sinais de alerta históricos da China já estão piscando em vermelho. Na verdade, ter uma visão de longo prazo de por que e sob quais circunstâncias a China luta é a chave para entender o quão curto o tempo se tornou para os Estados Unidos e os outros países no caminho de Beijing”.

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