Ativista que inspirou ‘Hotel Ruanda’ será julgado à revelia por ‘terrorismo’

Paul Rusesabagina ajudou a salvar mais de 1,2 mil de tutsis durante o genocídio de 1994 e é acusado de "terrorismo" pelo governo

Paul Rusesabagina, cuja história inspirou o longa “Hotel Ruanda”, de 2004, desistiu de seu próprio julgamento nesta quarta (24), em Ruanda, ao alegar que as exigências contra si foram forjadas. “Não espero justiça”, disse, em registro da agência catari Al-Jazeera.

Crítico do governo de Paul Kagame, Rusesabagina estava exilado na Bélgica até o fim de agosto do ano passado. Agentes do governo ruandês teriam interceptado um voo que levava o ativista para o Burundi e o levado para Ruanda, onde está preso desde setembro.

“Ele [Rusesabagina] disse que não mais comparecerá a este tribunal, agora ou em audiências futuras”, aponta a carta escrita pelo diretor prisional, Michel Kamugisha.

Em Ruanda, Rusesabagina desiste de julgamento e diz que provas são 'forjadas'
O ativista Paul Rusesabagin palestra na Universidade de Michigan durante o 20º aniversário do Genocídio de Ruanda, em março de 2014 (Foto: Flickr/University of Michigan)

Segundo autoridades ruandesas, Rusesabagina é o líder da FLN (Frente de Libertação Nacional) – grupo armado acusado de liderar diversos ataques mortais no país nos últimos anos. O ex-gerente de hotel admitiu ter ajudado a formar a FLN, mas negou qualquer participação em seus crimes.

O juiz Antoine Muhima, porém, decidiu que o julgamento continuará à revelia. Enquanto isso, a família do réu insiste que não teve acesso às mais de cinco mil páginas de documentos sobre o caso.

Outros 20 acusados de terrorismo teriam o ligado a atos criminosos, o que o porta-voz da Fundação Hotel Ruanda, mantida por Rusesabagina, nega. “O presidente [Kagame] já declarou publicamente que Rusesabagina é culpado e isso elimina seu direito de ser considerado inocente”.

Acusações e provas

À época do genocídio, Rusesabagina ajudou a abrigar mais de 1,2 mil tutsis e hutus moderados dentro do hotel cinco estrelas onde trabalhava na capital Kigali.

Um conflito entre etnias – divisão estimulada pelos belgas à época da colonização – fez com que hutus se revoltassem contra os tutsis, ruandeses classificados para ocupar os postos de poder por serem “mais parecidos” com os europeus.

A onda sangrenta matou 800 mil tutsis em Ruanda, em 1994. A violência ficou mais conhecida após a produção de Hollywood, que rendeu ao ator Don Cheadle uma indicação ao Oscar em 2004.

A visibilidade internacional logo conduziu o ex-gerente de hotel a uma posição de destaque como um dos principais críticos de Kagame, o que o transformou em “inimigo do Estado”. O atual presidente de Ruanda está no poder desde 1994 e críticos o acusam de perseguir oponentes para garantir a estabilidade de seu governo.

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