Com o aumento da violência no Haiti, milhares fogem de Porto Príncipe rumo ao campo

Números da ONU indicam que mais de 53 mil deixaram Porto Príncipe entre 8 e 27 de março rumo às zonas rurais, que carecem de infraestrutura

Um êxodo está em curso na capital do Haiti, Porto Príncipe, com dezenas de milhares de pessoas escapando da escalada da violência das gangues. A ONU (Organização das Nações Unidas) relata que mais de 53 mil pessoas deixaram a cidade, que tem uma população de 3 milhões, durante o período de 8 a 27 de março. As informações são da rede BBC.

As Nações Unidas estão preocupadas porque as áreas rurais para as quais muitos estão fugindo não têm recursos suficientes para lidar com esse grande número de deslocados. Os deslocamentos a partir da área metropolitana da capital haitiana seguem-se a ataques e à insegurança generalizada que “levam cada vez mais pessoas a abandonar a área em busca de refúgio nas províncias”, segundo a Organização Internacional para Migrações (OIM).

Enquanto isso, a violência das gangues é direcionada contra empresas na capital, com incêndios em farmácias e vandalismo em escolas. A polícia local conseguiu defender o palácio presidencial de um ataque na segunda-feira (1º), mas homens armados invadiram o Hospital da Universidade Estadual do Haiti, pretendendo usá-lo como base de operações. A casa de saúde estava fechada desde o mês passado por conta da situação de segurança deteriorada no país caribenho, e deveria ter reaberto as portas no começo desta semana.

Jimmy Chérizier, conhecido como “Barbecue” (“churrasco”, em inglês). Ele comanda uma das gangues mais poderosas por trás da violência no Haiti (Foto: WikiCommons)

Os estragos causados pelas gangues estão causando ainda mais atrasos na reabertura desses centros de saúde. O acesso aos cuidados médicos já era limitado, mas a situação piorou após ataques a um hospital no bairro Delmas 18, uma área urbana densamente povoada, e a um centro de saúde em Saint-Martin na semana passada.

As gangues controlam não só o principal porto de Porto Príncipe, mas também muitas das estradas que levam até lá, o que dificulta o transporte de suprimentos médicos. Enquanto os hospitais na capital enfrentam uma situação terrível, a ONU destaca que o deslocamento de dezenas de milhares de pessoas para áreas rurais despreparadas também apresenta desafios graves.

Após fugirem de Porto Príncipe, a maioria se dirigiu para o sul, região ainda se recuperando do terremoto de 2021, que tirou a vida de mais de duas mil pessoas. A OIM alertou na terça-feira (2) que essas áreas carecem de infraestrutura e recursos para lidar com esse grande influxo de deslocados.

Violência voltou após Páscoa

A recente escalada da violência começou em fevereiro, quando o primeiro-ministro Ariel Henry viajou ao Quênia para negociar um acordo para liderar uma força de segurança multinacional.

As gangues da capital se uniram para derrubar Henry, impedindo sua volta ao país com um ataque ao aeroporto internacional, que foi fechado.

O primeiro-ministro concordou em se afastar após a criação do conselho presidencial de transição, mas este ainda não tomou medidas efetivas para restaurar a ordem democrática.

Enquanto isso, os ataques violentos na capital recomeçaram nesta semana, depois de um período de relativa calma durante a Páscoa.

A crise haitiana

O Haiti vive há anos uma profunda crise econômica e estrutural, com mais de quatro milhões de pessoas passando fome, segundo o Programa Mundial de Alimentos (PMA). Já a violência de gangues atingiu seu ápice no final de fevereiro, com confrontos entre os bandidos e as forças de segurança. Duas prisões foram invadidas, com cerca de 4,5 mil presos libertados, entre eles líderes das quadrulhas armadas.

Somente a área metropolitana de Porto Príncipe tem 160 mil deslocados internos, de acordo com dados da ONU (Organização das Nações Unidas). Já o país inteiro tem aproximadamente 362 mil deslocados, a metade crianças, sendo 15 mil apenas em uma semana.

O Conselho de Segurança destacou que um combustível para a violência é o fluxo constante de armas para o país, o que acaba por fortalecer as gangues. A situação foi classificada como “caótica” pelas Nações Unidas.

“A capital está cercada por grupos armados e perigo. É uma cidade sitiada ”, afirmou Philippe Branchat, chefe da Organização Internacional para Migrações (OIM) no país. “As pessoas que vivem na capital estão presas. Elas não têm para onde ir”, acrescentou.

A ONU determinou que uma força de apoio multinacional seja enviada ao Haiti, como foi citado pelo Southcom dos EUA. Os governos de Benin e Quênia já ofereceram seus soldados.

O Haiti está há mais de um ano sem um governo efetivo, desde que o então presidente Jovenel Moise foi assassinado. O primeiro-ministro Ariel Henry, atualmente em Porto Rico e incapacitado de retornar, é o governante em exercício e se recusa a renunciar, uma exigência das gangues para que reduzam a onda de violência.

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