Como os EUA responderão militarmente ao ataque que matou três de seus soldados

Washington já iniciou o contra-ataque, que poderia inclusive atingir o território iraniano, o que aumentaria ainda mais a tensão

No domingo passado (28), um ataque realizado por drones atingiu uma base militar norte-americana na Jordânia e deixou três militares mortos, além de cerca de 40 feridos. A resposta militar dos EUA teve início na sexta-feira (2), com ataques contra posições inimigas no Iraque e na Síria, segundo a agência Reuters. Mas Washington pode não se limitar a isso. Em artigo publicado na quinta-feira (1º) pelo think tank Atlantic Council, a analista Kirsten Fontenrose, especialista em segurança no Oriente Médio, listou alguns possíveis cenários, que consideram inclusive a possibilidade de ataques dentro do Irã. Trata-se de uma possibilidade real, embora delicada, pois desencadearia um conflito mais amplo.

Segundo o governo norte-americano, o ataque que matou os três militares foi realizado por um grupo chamado Resistência Islâmica no Iraque, que engloba dentro dele várias milícias, com destaque para o Kataib Hezbollah, organização xiita iraquiana patrocinada pelo Irã.

A acusação levou os radicais a recuar, anunciando o fim dos ataques às forças dos EUA no Oriente Médio. Nada, porém, que amenize o desejo de vingança de Washington, que pela primeira vez na história teve soldados mortos em um ataque de drone. “E parece ser a primeira vez que um membro do Exército ou dos Fuzileiros Navais é morto pelo poder aéreo inimigo desde 1953”, diz Fontenrose.

Militares das Forças Armadas dos EUA no Havaí, setembro de 2023 (Foto: facebook.com/USarmy)

Além do próprio Kataib Hezbollah, a resposta militar norte-americana pode se focar no Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC, na sigla em inglês), que Washington acusa de patrocinar não somente os xiitas iraquianos, mas outras organizações rebeldes que têm atacado bases e navios dos EUA no Oriente Médio desde o início da guerra em Gaza, desencadeada pelo ataque do Hamas a Israel.

Entre as opções analisadas pela especialista, três preveem ataques dentro do território iraniano, enquanto outra projeta a manutenção dos planos atuais, de atacar capacidades do Irã e seus parceiros em outros territórios, como o Iêmen, além do Iraque e da Síria, estes já sob ataque.

Ataques à máquina de guerra do Irã

A primeira opção analisada prevê que os Estados Unidos ataquem as capacidades militares convencionais do Irã dentro de seu território, atingindo aeronaves, defesa antiaérea e tanques blindados das Forças Armadas regulares, conhecidas como Artesh. É, porém, um plano pouco eficiente, pois o objetivo não é apenas infligir perdas a Teerã, mas reduzir sua capacidade de continuar patrocinando os ataques. E tal ataque não atingira as capacidades que de fato causam os problemas aos militares de Washington.

Segundo o artigo, atacar a máquina de guerra iraniana “não impediria a continuação dos ataques que o Irã tem apoiado contra as forças dos EUA no Médio Oriente até agora”. E ainda arrastaria para o conflito as Forças Armadas iranianas, ainda mais poderosas que o IRGC.

Ataques a bases e ao arsenal do IRGC no Irã

Aqui, o alvo não seriam as Forças Armadas regulares, e sim os paramilitares do IRGC, também a serviço de Teerã. O ponto favorável deste ataque seria testar as armas defensivas dos paramilitares, vez que os EUA ainda não têm profundo conhecimento do que está à disposição da Guarda. Sobretudo, testaria o sistema de defesa antiaéreo iraniano Sayyad.

Há, porém, mais um aspecto negativo nessa opção. Os ataques “reduziriam, mas não eliminariam” a capacidade do IRGC de atacar os EUA. Fontenrose explica que uma operação como esta “não reduziria a probabilidade de os Estados Unidos continuarem a enfrentar os mesmos tipos de ataques por procuração” que pretende impedir, como o que matou seus militares na Jordânia. Ao contrário, tais ações possivelmente aumentariam.

Ataques a instalações no Irã que armazenam equipamentos para aliados

Com base em informações de inteligência, os EUA poderiam direcionar seus ataques a instalações dentro do território iraniano que armazenam armas e outros equipamentos direcionados aos aliados de Teerã no exterior, como o Kataib Hezbollah. Tal ação ajudaria a retardar ou prevenir ataques, mas os parceiros de Teerã seguiriam ativos durante anos, graças aos amplos estoques de armas atuais. Somente o Hezbollah, do Líbano, tem cerca de cem mil mísseis à disposição hoje.

A analista projeta que uma ação do gênero não levaria a uma reação militar específica do Irã, que optaria por “demonizar” a agressão e manter os atuais ataques contra alvos norte-americanos em todo o mundo. Mas Teerã obteria uma vantagem, ao manter as tropas de Washington ocupadas em proteger todas as suas bases e as missões diplomáticas do país no exterior.

Ataques ao IRGC em Estados vizinhos

Esta é a medida adotada atualmente pelos EUA, com alvos no Iraque e na Síria e, possivelmente, no Iêmen. “No entanto, o ataque a arsenais fora do Irã até agora não dissuadiu o Irã ou os seus ataques por procuração contra pessoal e parceiros dos EUA”, diz o artigo.

Uma solução, de acordo com a especialista, seria atacar não somente os armazéns de armas de aliados, mas também os estoques do próprio governo do Irã no exterior. “Espelhando os atuais ataques dos Houthis, os navios iranianos que transitam pelo Mar Vermelho poderiam ser incluídos sem que isso fosse considerado uma escalada.”

Conclusões

A analista cita que outro objetivo do presidente Joe Biden, além de enfraquecer o poder de fogo inimigo, é agradar a opinião pública em um ano eleitoral. Para tanto, é crucial evitar uma escalada, pois o eleitor norte-americano não quer seu país envolvido em uma guerra de grandes proporções no Oriente Médio.

O texto ressalta que há outras formas de atingir Teerã sem usar armas, como ações cibernéticas e sanções financeiras. No entanto, considerando somente as opções militares citadas, a analista dá a entender que a tendência é a manutenção dos planos atuais, concentrados na quarta alternativa.

“Independentemente da amplitude e da profundidade da retaliação, se os alvos forem exclusivamente militares e não no território nacional do Irã, a análise comparativa diz que são um reflexo das táticas do Irã e, portanto, não são uma escalada”, diz o texto. O resultado, porém, não é garantido. “A maioria das opções fica aquém de alcançar o objetivo de travar ataques apoiados pelo Irã contra pessoal, amigos e interesses dos EUA. O sucesso deve ser definido e as expectativas devem ser gerenciadas de acordo.”

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