Ataques aéreos obrigam milhares de civis a fugirem de suas casas em Mianmar

Oposição fala em 20 mortos nas ações militares, realizadas em uma região que resiste ao golpe de Estado ocorrido em fevereiro deste ano

O exército de Mianmar coordenou ataques de helicóptero a comunidades civis no último fim de semana, levando milhares de pessoas a fugirem de suas casas na região de Sagaing, território que resiste ao golpe de Estado orquestrado por militares em fevereiro deste ano. Segundo a mídia local, pelo menos sete pessoas morreram no sábado (27). As informações são da agência catari Al Jazeera.

As ofensivas tinham como alvo 15 vilarejos no município de Depayin, mesmo local em que em 2003 foram mortos aproximadamente 70 militantes do partido LND (Liga Nacional pela Democracia), comandado pela presidente deposta Aung San Suu Kyi, presa durante a intervenção junto de outros líderes da sigla. As vítimas foram executadas por uma gangue apoiada pelas forças birmanesas.

Sagaing, capital e maior cidade na região de mesmo nome, é reduto de insurgentes, sendo uma das primeiros zonas em que civis se armaram para enfrentar a junta militar que assumiu o poder. A área é cenário de confrontos sangrentos, sendo frequentemente atingida por massacres executados por soldados, que também perseguem e matam lideranças locais.

O movimento de resistência crescente chamado Força de Defesa do Povo (PDF, na sigla em inglês), formado por grupos armados, continua a encarar as tropas do governo. O PDF de Depayin assumiu a responsabilidade de um bombardeio que atingiu um comboio militar no domingo (28) e que matou 20 soldados.

Segundo o Governo de Unidade Nacional paralelo de Mianmar (NUG, da sigla em inglês), nomeado por legisladores eleitos nas pesquisas de 2020, a estimativa é de que 20 civis podem ter morrido durante os ataques aéreos, e que os esforços de busca e identificação foram prejudicados pela sucessão de investidas militares.

Ataques no município de Depayin, na região de Sagaing, mataram pelo menos sete civis no fim de semana (Foto: Twitter/Reprodução)

“Os direitos humanos e o direito internacional são totalmente ignorados. Os militares estão dispostos a demolir tudo no caminho para um trono”, disse uma declaração do Ministério de Assuntos Humanitários ligado ao NUG.

Já os moradores de Depayin que tiveram que abandonar suas casas supostamente foram buscar refúgio nas florestas e em outras aldeias. De acordo com a agência de notícias local Irrawaddy, o número de pessoas forçadas a fugir de suas casas pode chegar a 30 mil.

Austrália, Canadá, Nova Zelândia, Noruega, Coreia do Sul, Reino Unido e Estados Unidos divulgaram uma nota na sexta-feira (26) apelando à comunidade internacional para “suspender todo o apoio operacional aos militares”.

“Estamos preocupados com as alegações de estocagem de armas e ataques militares, incluindo bombardeios e ataques aéreos, uso de armas pesadas e o envio de milhares de soldados”, disse o comunicado.

Escudos humanos

O organização de direitos humanos Karen Peace Support Network (KPSN) emitiu um relatório nesta quarta-feira (1) que denuncia bombardeios contra alvos civis no distrito de Mutraw, ataques que já teriam deslocado mais de 82 mil pessoas de seus lares.

A KPSN também acusou os militares de sequestro de civis, tortura e de usá-los como escudos humanos.

“A maioria dos deslocados internos permanece abrigada na selva, não ousando voltar para casa em caso de novos ataques aéreos após as chuvas”, disse o relatório, observando “sobrevôos frequentes” de aeronaves militares.

Por que isso importa?

Mianmar enfrenta “uma campanha de terror com força brutal”, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas). A repressão imposta pelo governo já causou a morte de ao menos 1252 pessoas desde o golpe de 1º de fevereiro deste ano, uma reação dos militares às eleições presidenciais de novembro de 2020.

Na ocasião, a NLD (Liga Nacional pela Democracia) venceu as eleições com 82% dos votos, ainda mais do que havia obtido no pleito de 2015. Em fevereiro, então, a junta militar, que já havia impedido o partido de assumir o poder antes, derrubou e prendeu a presidente eleita Aung San Suu Kyi.

O golpe deu início a protestos no país, respondidos com violência pelas forças de segurança nacionais. Centenas de pessoas foram presas sem indiciamento ou julgamento prévio, e muitas famílias continuam à procura de parentes desaparecidos. Jornalistas e ativistas são atacados deliberadamente, e serviços de internet têm sido interrompidos.

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