Bares e centros culturais viram alvo preferencial da repressão estatal na Rússia

Estabelecimentos como o Underdog, um bar punk de Moscou, têm sofrido batidas policiais em busca de críticos à guerra

Um ação das forças de segurança da Rússia ocorrida recentemente em Moscou indica o que pode estar se tornando uma nova tendência na repressão imposta pelo governo local contra quem se opõem à guerra da Ucrânia. O alvo foi um pequeno bar punk no bairro de Kitai-Gorod, de acordo com o jornal independente The Moscow Times.

O Underdog foi invadido na última sexta-feira (17) por policiais, que intimidaram os frequentadores e obrigaram alguns deles a entoar canções patrióticas russas. Cenas semelhantes foram vistas em um estabelecimento irmão, o La Virgen Taqueria, de onde cerca de 50 pessoas foram levadas para prestar depoimento.

Um vídeo divulgado pelo aplicativo de mensagens Telegram mostra o que seriam policiais forçando os frequentadores do Underdog a cantar musicas patrióticas russas. “As forças de segurança chegaram hoje ao bar Underdog no centro de Moscou, verificaram os presentes e deixaram o estabelecimento sem deter ninguém”, diz o texto que acompanha o vídeo, publicado na última sexta.

De acordo com Konstantin Yerokhin, advogado que representa o estabelecimento, as pessoas que estavam no Underdog no momento da ação policial foram obrigadas a exibir suas tatuagens e o conteúdo de seus celulares. Possivelmente os agentes de segurança buscavam arte corporal ou conteúdo digital de apoio a Kiev.

O La Virgen Taqueria anunciou pelas redes sociais, em 2022, um bazar beneficente de discos de vinil, que seriam vendidos com renda revertida a uma instituição de caridade ucraniana. O post nas redes sociais que anunciava o evento foi excluído, mas chegou ao conhecimento das autoridades. Entretanto, não está claro se a ação policial está relacionada à antiga postagem.

Pavel Kosov, um dos donos dos dois bares, usou sua conta no Instagram nesta semana para dizer que deixou o negócio. “Esta decisão foi tomada por toda a equipa de gestão dos projetos, uma vez que a minha participação criaria dificuldades e colocaria em risco toda a equipe de 50 pessoas e o projeto empresarial”, disse ele, que sempre negou ter fornecido qualquer tipo de ajuda à Ucrânia.

O caso do Underdog e do La Virgen, porém, não é isolado. Bares e espaços culturais, como centros de exposições e palestras, têm sido cada vez mais visados pelas autoridades russas. Na cidade de São Petesburgo, a segunda maior do país, ao menos 20 bares foram fechados pelas autoridades, acusados de envolverem menores de idade em “atos antissociais”, segundo a agência de notícias Fontaka.

Homem arrastado por policiais em Moscou, março de 2022 (Foto: Avtozak LIVE/Reprodução Telegram)

No domingo (19), um dos alvos foi o Open Space, um centro cultural que recebia o lançamento de uma revista em quadrinhos escrita por Alexandra Skochilenko, artista local presa e julgada por protestar contra a guerra. Ela participou do movimento que substituía etiquetas de preços em mercadorias de supermercados por outras contentando mensagens antiguerra.

Desde a invasão russa à Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022, a ONG OVD-Info, que monitora a repressão na Rússia, registrou mais de 19,5 mil detenções em protestos contra a guerra em todo o país, com cerca de 400 pessoas levadas ao tribunal para responder criminalmente por seus atos.

A enorme maioria dos casos, cerca de 15 mil, foi registrada no primeiro mês de guerra. Depois, houve um pico entre setembro e outubro, quando começou o recrutamento obrigatório de cidadãos para servir às forças armadas no conflito. Então, entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023, foram registradas apenas 22 detenções, sinal de que a repressão estatal tem funcionado.

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