MP da Rússia pede nove anos de prisão para político que faz oposição a Putin

Preso desde junho, Ilya Yashin não deixou o país e foi um dos últimos críticos ao governo russo detido pela dura repressão estatal

O Ministério Público da Rússia pediu que seja imposta uma pena de nove anos de prisão ao proeminente oposicionista Ilya Yashin, crítico do presidente Vladimir Putin e da guerra na Ucrânia. Ele está preso desde o final de junho, por supostamente desacatar policiais, e agora é alvo de um processo criminal por divulgar o que o governo considera “notícias falsas” sobre as ações das forças armadas. As informações são da rede independente Current Time.

Yashin foi detido em junho em um parque de Moscou e deveria ficar preso durante 15 dias por desacato. Ele afirma que estava sentado em um banco com um amigo quando policiais surgiram e exigiram que os acompanhasse, sem maiores explicações. As autoridades, por sua vez, alegam que o homem reagiu com ofensas e que segurou um dos agentes.

Em vez de libertá-lo após os 15 dias, a Justiça apertou o cerco contra Yashin, um dos últimos críticos notórios de Putin que permanecia em liberdade na Rússia. Foi então aberto o processo criminal contra ele, sobretudo em função do conteúdo geralmente veiculado através do canal do político no YouTube.

O oposicionista russo Ilya Yashin após ser preso na Rússia em 13 de julho (Foto: Facebook/arquivo pessoal)

Na acusação, o promotor responsável pelo caso diz que Yashin ignora os relatos da mídia local e de seus correspondentes de guerra e dá preferência a informações divulgadas por “Estados hostis”, citando “os Estados Unidos e seus satélites”, que “fornecem instrutores e armas à Ucrânia”.

Em seu canal, Yashin comentou, por exemplo, as acusações de que as tropas russas teriam executado sumariamente civis e combatentes ucranianos. “Tudo isso é um quadro absolutamente apocalíptico, sabe? Como nos filmes de terror. Cadáveres de olhos abertos, com as mãos amarradas nas costas”, disse ele em um dos vídeos anexados ao processo.

O promotor contestou as afirmações e disse que as denúncias de crimes de guerra contra Moscou são “provocações do regime de Kiev”. O MP afirmou ainda que o político “não gosta do sistema político da Federação Russa” e “nega a necessidade óbvia de garantir a segurança da Federação Russa contra ameaças externas”.

Por que isso importa?

Na Rússia, protestar contra o governo já não era uma tarefa fácil antes da eclosão da guerra na Ucrânia. Os protestos coletivos desapareceram das ruas a partir do momento em que a Justiça local passou a usar a pandemia de Covid-19 como pretexto para punir grandes manifestações, alegando que o acúmulo de pessoas feria as normas sanitárias. Assim, tornou-se comum ver manifestantes solitárias erguendo cartazes com frases contra o governo.

Desde a invasão do país vizinho por tropas russas, no dia 24 de fevereiro, o desafio dos opositores do presidente Vladimir Putin aumentou consideravelmente, com novos mecanismos legais à disposição do Estado e o aumento da violência policial para silenciar os críticos. Uma lei do início de março, com foco na guerra, pune quem “desacredita o uso das forças armadas”.

Dentro dessa severa nova legislação, os detidos têm que pagar multas que chegam a 300 mil rublos (R$ 25,5 mil). A pena mais rigorosa é aplicada por divulgar “informações sabidamente falsas” sobre o exército e a “operação militar especial” na Ucrânia, que é como o governo descreve a guerra. A reclusão pode chegar a 15 anos.

O cenário mudou com a mobilização militar parcial anunciada por Putin no dia 20 de setembro. O risco de serem obrigados a lutar na Ucrânia levou milhares de reservistas a fugir do país, com fronteiras lotadas em países como GeórgiaMongólia e Cazaquistão. Entre os que ficaram, a ideia de aceitar a convocação não é unanimidade, e protestos populares voltaram a ser registrados em todos os cantos. 

Somente na primeira semana que sucedeu o anúncio, a ONG OVD-Info, que monitora a repressão estatal na Rússia, registrou quase 2,5 mil detenções em protestos populares contra a mobilização. E o número real de detidos tende a ser maior, vez que a entidade contabiliza somente os nomes que confirmou e que foi autorizada a divulgar, tendo sempre como base as listas fornecidas pelas autoridades.

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