Após morte de Raisi, ONG pede justiça em nome das vítimas do ‘Carniceiro de Teerã’

Segundo a Anistia Internacional, morte não deve privar vítimas e famílias do direito de ver os cúmplices do ex-presidente punidos

Ebrahim Raisi, que desde 2021 presidia o Irã, morreu no último domingo (19) em um aparente acidente de helicóptero em uma região montanhosa do país. Para a ONG Anistia Internacional, a morte do autoritário chefe de governo não deve privar de justiça as inúmeras vítimas dele, apelidado de “Carniceiro de Teerã” devido ao envolvimento em diversas violações dos direitos humanos no país.

“Ebrahim Raisi deveria ter sido investigado criminalmente, inclusive pelos crimes contra a humanidade de homicídio, desaparecimento forçado e tortura enquanto estava vivo”, afirmou Diana Eltahawy, diretora regional adjunta da Anistia para o Oriente Médio e o Norte de África. “Sua morte não deve privar as vítimas e suas famílias do direito à verdade e a ver todos os outros cúmplices dos seus crimes responsabilizados.”

Desde que Raisi assumiu o primeiro cargo público de relevância, em 1980, a Anistia alega que ele pode ser ligado, direta ou indiretamente, a inúmeras atrocidades do governo iraniano.

Diz a ONG que “ele esteve diretamente envolvido ou supervisionou” desaparecimentos forçado e execuções extrajudiciais de dissidentes políticos, assassinato, detenção arbitrária, desaparecimento forçado e tortura de manifestantes e perseguição violenta de mulheres e meninas que desafiam o uso obrigatório do hijab, o véu islâmico.

Ebrahim Raisi: morte não pode privar suas vítimas de justiça (Foto: Meghdad Madadi/WikiCommons)

“Durante décadas, os perpetradores com responsabilidade criminal desfrutaram da impunidade sistemática que prevalece no Irã”, disse Eltahawy. “A comunidade internacional deve agir agora, em nome das vítimas dos crimes, para estabelecer caminhos para a responsabilização ao abrigo do direito internacional e de outras violações graves dos direitos humanos cometidas por Ebrahim Raisi e outros responsáveis ​​iranianos”.

O “Carniceiro de Teerã”

Raisi era um fervoroso defensor da Revolução Iraniana e ficou conhecido como “Carniceiro de Teerã” por seu papel em tribunais que sentenciaram um número incerto de pessoas à morte por fuzilamento. Ele assumiu como vice-procurador-geral da capital aos 25 anos e desempenhou papel crucial nas execuções impostas por tribunais secretos estabelecidos em 1988 conhecidos como “Comitê da Morte”.

A maioria das vítimas submetidas à pena de morte integrava o movimento oposicionista Mujahedin do Povo (MEK), embora membros de outros grupos de esquerda também tenham sido sentenciados e executados.

Em maio de 2018, três anos antes de assumir a presidência, Raisi defendeu publicamente os assassinatos em massa, descrevendo-os como “uma das orgulhosas conquistas do sistema.” Pouco depois, a Anistia publicou um relatório segundo o qual havia indícios suficientes para que ele fosse investigado por crimes contra a humanidade.

Derrotado na eleição de 2017, ele passou a comandar o Judiciário do país, onde permaneceu até a vitória no pleito de 2021, estritamente supervisionado pelo líder supremo aiatolá Ali Khamenei, que tinha em Raisi um discípulo e possível sucessor.

Já na presidência do país, impôs uma violenta repressão a protestos populares que tomaram as ruas do país após a morte da jovem Mahsa Amini em setembro de 2022. Ela teria sido agredida até a morte por integrantes da “polícia da moralidade”, que a abordaram, encarceraram e agrediram por não respeitar as regras de uso do hijab.

Grupos humanitários estimam que mais de 500 pessoas foram mortas somente durante o período de repressão aos recentes protestos, que começaram no Curdistão, província onde vivia Mahsa, e depois se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedidos pelo fim da República Islâmica.

Também há inúmeros casos de cidadãos presos por participar das manifestações e executados pelo governo, submetidos a julgamentos secretos semelhantes aos liderados por Raisi nos tempos de procurador. De acordo com a Anistia Internacional, ao menos 853 execuções foram realizadas no país em 2023, aumento de 172% em relação a 2021.

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