A coalizão liderada pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu enfrenta uma das maiores tensões internas dos últimos anos devido ao projeto de lei que pretende regular o recrutamento militar obrigatório para jovens ultraortodoxos (haredi). A proposta reacendeu um debate histórico em Israel e colocou em risco a estabilidade do governo. As informações são do Financial Times.
O tema ganhou urgência após mais de dois anos de guerra em Gaza, período em que as Forças de Defesa de Israel (IDF, da sigla em inglês) afirmam necessitar de milhares de soldados adicionais para atuar em múltiplas frentes. Ao mesmo tempo, cresce a pressão social por maior equidade no serviço militar obrigatório.

Por que o projeto de lei é tão controverso
O texto, elaborado por um parlamentar do Likud e por partidos ultraortodoxos, busca atender determinações do Supremo Tribunal, que desde 2012 exige novas regras para corrigir o desequilíbrio no alistamento. Pela legislação vigente, jovens haredi são dispensados do serviço militar caso estudem em yeshivas, tradição que remonta à criação do Estado de Israel em 1948.
O número de dispensados ultrapassa atualmente 80 mil homens, impulsionado pelo forte crescimento demográfico da comunidade.
A nova versão do projeto prevê metas de alistamento flexíveis e penalidades postergadas, algo que parlamentares da direita religiosa e parte do próprio Likud consideram insuficiente para garantir um “recrutamento real”.
Revolta dentro da coalizão
O ministro da Imigração e Absorção, Ofir Sofer, classificou a proposta como “vergonhosa” e afirmou que votará contra, mesmo sob ameaça de demissão. Parlamentares do partido Sionismo Religioso reforçaram que só apoiarão uma lei que implemente o serviço militar obrigatório de fato.
Pelo menos cinco deputados do Likud também exigem mudanças significativas. Facções haredi mais radicais, por sua vez, rejeitam qualquer forma de alistamento.
A divisão interna levanta dúvidas sobre a capacidade de Netanyahu de aprovar a legislação sem alterar as bases de apoio que mantêm seu governo de pé.
Risco político para Netanyahu
O projeto é visto por analistas como peça central para a sobrevivência da coalizão. Mudanças consideradas “duras demais” podem afastar partidos ultraortodoxos; ajustes “brandos demais” podem provocar deserções na direita religiosa e nas fileiras militares do Likud.
O Supremo Tribunal também pode considerar o texto inválido, caso avalie que as metas propostas não representam avanço concreto.
Netanyahu tenta equilibrar as pressões, mas enfrenta crescente desgaste público, especialmente entre reservistas e famílias de soldados mortos nas recentes operações em Gaza, no Líbano, na Síria e na Cisjordânia ocupada.
Depoimentos emocionam comissão parlamentar
Durante as discussões, familiares de soldados mortos criticaram duramente o projeto. Hagai Lober, pai de um militar morto em Gaza, afirmou que a proposta diferencia “entre sangue e sangue” e que seus filhos serviram mais de 900 dias na reserva nos últimos dois anos. Ele disse que, no atual modelo, “quem nasce no setor certo tem uma vida muito mais segura em Israel”.
Impacto e próximos passos
A versão atual deve seguir em debate nas próximas semanas, enquanto Netanyahu tenta consolidar apoio suficiente para levar a lei a votação. Caso o projeto fracasse ou seja barrado pelo Supremo, a coalizão pode entrar em colapso, abrindo caminho para novas eleições, cenário que o primeiro-ministro tenta evitar.