O Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu uma ordem de prisão contra o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, em uma decisão histórica que ecoa a medida tomada anteriormente contra o presidente russo, Vladimir Putin. A acusação contra Netanyahu e seu ex-ministro da Defesa, Yoav Gallant, está ligada a supostos crimes de guerra e crimes contra a humanidade, marcando a primeira vez que líderes de uma democracia ocidental moderna enfrentam tais acusações em uma corte judicial global.
A decisão do TPI encontra paralelo no mandado de prisão emitido em março de 2023 contra Putin, que foi acusado de crimes de guerra relacionados à deportação e transferência ilegais de crianças ucranianas para a Rússia. Essa medida legal exige que cada um dos 123 Estados-Partes do TPI prenda Putin e transferi-lo para Haia para julgamento se ele pisar em seu território.
Apesar de os Estados Unidos e Israel não serem signatários do Estatuto de Roma, tratado que criou o TPI, a adesão de mais de 120 países impõe um obstáculo considerável para Netanyahu e Gallant. Qualquer visita a essas nações poderia resultar em sua prisão, mesmo em circunstâncias inesperadas, como um pouso de emergência em território sob jurisdição do tribunal.
O ocorreu o mesmo com o chefe do Kremlin, que não veio ao Brasil para a 19ª reunião de cúpula do G20 no Rio de Janeiro pelo fato de que uma eventual visita colocaria as autoridades brasileiras sob pressão para detê-lo. “Tenho relações amistosas maravilhosas com o presidente Lula, mas por que eu iria lá de propósito para atrapalhar o trabalho normal deste fórum?”, disse Putin, de acordo com a agência Reuters.
Segundo ele, bastaria uma acordo entre governos para eximir o Brasil de prendê-lo, mas ainda assim optou por ficar de fora do evento. “Decisões desse tipo são muito fáceis de contornar, basta assinar um acordo intergovernamental e pronto, a jurisdição do TPI será limitada”, afirmou.
Dentro do território russo, o que garante proteção legal a Putin é o fato de o país ter deixado o TPI em 2016. A situação foi esclarecida, em abril do ano passado, por Flávio de Leão Bastos Pereira, professor de Direitos Humanos e Direito Constitucional na Universidade Presbiteriana Mackenzie, que conversou com a reportagem de A Referência.
“Se ela (a Rússia) estivesse no TPI como um dos 123 países que estão lá hoje, seria obrigada a entregar Putin”, disse ele na oportunidade.
Mundo ficará menor
Ao The New York Times, o especialista em direito internacional Philippe Sands reforça que os mandados de prisão emitidos pelo TPI são vinculantes para todos os estados membros. Isso exige que indivíduos procurados sejam detidos e enviados a Haia ao entrarem em território de um estado parte. Contudo, o cumprimento varia, especialmente em casos envolvendo nações poderosas.
Exemplos recentes ilustram essa discrepância. A Mongólia, dependente da Rússia para combustível, recebeu Putin com honras de estado, ignorando o mandado do TPI por crimes de guerra na Ucrânia. Na África do Sul, a situação foi contornada quando Putin não compareceu a uma cúpula, enviando outro representante.
No Brasil, o presidente Lula afirmou que Putin não enfrentaria problemas para participar do G20 no Rio, embora o líder russo tenha enviado seu chanceler. Enquanto isso, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, enfrenta apoio em estados membros do TPI, como a Argentina de Javier Milei, que criticou as ações do tribunal contra Netanyahu e defendeu o direito de Israel à autodefesa.
Netanyahu e Gallant enfrentarão um mundo mais limitado, onde será necessário planejar cada viagem com extrema cautela, afirmou Daniel Reisner, advogado e ex-chefe do departamento de direito internacional da divisão jurídica do exército israelense.