Um ataque realizado por extremistas deixou ao menos 12 pessoas mortas no norte de Burkina Faso na última quarta-feira (7). Dez delas são civis, membros do grupo VDP (Voluntários de Defesa da Pátria, da sigla em francês), uma milícia armada ligada ao governo que auxilia o exército. As informações são do site The Defense Post.
Este foi o quarto ataque extremista registrado no país somente nesta semana, sendo que o total de mortos pelos insurgentes no período é de ao menos 27 pessoas.
“Pelo menos dez voluntários foram mortos e vários ficaram feridos, sendo levados ao centro médico de Boulsa”, disse um dos moradores sobre a mais recente ação extremista, referindo-se à principal cidade da província de Namentenga. Segundo ele, o ataque ocorreu em Boala, na região Centro-Norte do país.
Já um oficial da VDP afirmou que “vários terroristas foram neutralizados por voluntários após uma luta de duas horas”.
Embora nenhum grupo tenha assumido a autoria do ataque, são duas as facções mais atuantes em Burkina Faso: o Grupo de Apoio ao Islã e aos Muçulmanos (GSIM, na sigla em francês), também conhecido pelo nome em árabe Jamaat Nasr al-Islam wal Muslimin (JNIM) e ligado à Al-Qaeda, e o Estado Islâmico no Grande Saara (EIGS).
Milícia reestruturada
Em setembro, o governo burquinense deu início a uma campanha para recrutar 50 mil civis que seriam inseridos na luta contra os grupos extremistas islâmicos que marcam presença no país. O destino dos novos combatentes é a milícia VDP, que foi criada em 2019 e passou a atuar no ano seguinte.
Habitualmente, os civis recrutados passam por um treinamento que dura entre 15 dias e dois meses e então recebem armas, munição e equipamentos de comunicação. De acordo com o coronel Boukare Zoungrana, a missão da VDP é “proteger a população e os bens dos distritos juntamente com as forças de segurança”.
Em junho deste ano, as forças armadas anunciaram que o grupo seria reorganizado para que fosse “completamente integrado à estrutura militar e de segurança empregada para combater o terrorismo”. Por isso, os membros da milícia são frequentemente alvo de ataques jihadistas. Cerca de 90 mil cidadãos se inscreveram para ingressar na VDP nos últimos meses.
Por que isso importa?
Burkina Faso convive desde 2015 com a violência de facções da Al-Qaeda e do Estado Islâmico (EI), insurgência que levou a um conflito com as forças de segurança e matou milhares de pessoas. Grupos armados lançam ataques ao exército e a civis, desafiando também a presença de tropas estrangeiras.
Os ataques costumavam se concentrar no norte e no leste, mas agora estão se alastrando por todo o país, com cerca de 40% do território nacional fora do controle do governo central. Burkina Faso superou o Mali e o Níger como epicentro da violência jihadista na região.
O pior ataque extremista já registrado em Burkina Faso ocorreu em 5 de junho de 2021, quando insurgentes incendiaram casas e atiraram em civis ao invadirem a vila de Solhan, no norte. Na ocasião, 160 pessoas morreram.
Após um período de relativa calmaria, a violência aumentou nos últimos meses, após a tomada do poder no país por uma junta militar em janeiro de 2022. Oficiais descontentes derrubaram o presidente eleito Roch Marc Christian Kabore, que vinha enfrentando protestos pela forma como lidou com a sangrenta insurgência jihadista. Mais tarde, em setembro, um novo golpe levou a nova mudança no poder, com ais um militar assumindo o governo central. A instabilidade só faz crescer o problema da insurgência.
Para especialistas, os extremistas decidiram aproveitar a divisão pública no país. “Os novos ataques sinalizam uma onda crescente de militância no norte de Burkina Faso e levantam preocupações sobre o alcance crescente de grupos terroristas que, sem dúvida, estão dificultando ainda mais o trabalho da junta de proteger o país”, disse Laith Alkhouri, CEO da Intelonyx Intelligence Advisory, uma empresa que realiza análises no setor de inteligência.
Os ataques de grupos extremistas geraram uma crise humanitária que forçou mais de dois milhões de pessoas a fugirem de suas casas, com cerca de duas mil mortes ligadas ao conflito. Estima-se que quase 5 milhões de pessoas sofram de insegurança alimentar, com quase 3 milhões em situação de insegurança alimentar aguda no país.
No Brasil
Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.