As autoridades militares do Sudão apresentaram uma queixa formal ao Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) acusando os Emirados Árabes Unidos (EAU) de patrocinar mercenários colombianos para lutar ao lado das Forças de Apoio Rápido (RSF), paramilitares envolvidos em uma disputa sangrenta pelo poder no país. As informações são do Financial Times.
Segundo a carta enviada pelo representante sudanês na ONU, Al-Halif Idriss Al-Halif, centenas de veteranos colombianos teriam sido recrutados por meio de empresas de segurança privadas nos EAU. Os mercenários teriam sido transportados via Bosaso, na Somália, e pelo leste da Líbia, onde os Emirados Árabes Unidos apoiaram o senhor da guerra Khalifa Haftar, de acordo com documentos supostamente recuperados de combatentes capturados.
“As autoridades sudanesas coletaram extensas evidências de uma campanha sistemática dos Emirados Árabes Unidos para minar a paz, a segurança e a soberania do Sudão, financiando e enviando mercenários para lutar junto à RSF”, diz a carta.

Abu Dhabi nega as acusações, afirmando que elas se baseiam em “evidências fabricadas”. O Ministério das Relações Exteriores da Colômbia não respondeu a pedidos de comentário.
A disputa ocorre em meio a um agravamento das relações entre Port Sudan e Abu Dhabi. O Sudão acusa os EAU de apoiar a RSF e de ampliar a intervenção de outros atores regionais na guerra, enquanto Abu Dhabi afirma que Port Sudan estaria bloqueando esforços internacionais de mediação.
Desde 2023, mais de 150 mil sudaneses foram mortos e 12 milhões deslocados, segundo agências da ONU. Ambos os lados são acusados de crimes de guerra. A RSF, apoiada por Egito, Arábia Saudita e milícias locais, tenta recuperar territórios perdidos no leste e centro do país e avançar sobre El Fasher, último reduto do exército e antigos rebeldes aliados em Darfur.
Especialistas apontam que as rotas aéreas usadas para transportar os mercenários a partir do Golfo exigiriam a sanção estatal de Abu Dhabi. Os Emirados Árabes Unidos, por sua vez, negam qualquer envolvimento direto, alegando que as acusações se baseiam em postagens de redes sociais e vídeos manipulados.
Promessas de altos salários
Entre 350 e 380 colombianos, conhecidos como “Lobos do Deserto”, estariam destacados junto à RSF, principalmente em Darfur. Suas funções incluiriam operar drones, artilharia e veículos blindados, além de participar de ataques diretos, segundo as autoridades sudanesas.
Muitos mercenários teriam sido enganados para participar do conflito, atraídos por promessas de salários muito maiores do que o que recebiam na Colômbia. “Existem intermediários na Colômbia que claramente enganam as pessoas”, afirmou um ex-soldado colombiano.
Port Sudan pretende levar a questão à Assembleia Geral da ONU ainda este mês, alegando que o envolvimento dos Emirados Árabes Unidos poderia configurá-los como responsáveis por crimes de guerra e genocídio.
Por que isso importa?
O Sudão vive um violento conflito civil que coloca frente a frente dois generais que comandam o país africano desde o golpe de Estado de 2021: Abdel Fattah al-Burhan, chefe das SAF, e Mohamed Hamdan “Hemedti” Daglo, à frente da milícia das RSF.
As tensões decorrem de divergências sobre a incorporação dos combatentes das RSF às Forças Armadas, o que levou a milícia a se insurgir. Hemedti tinha originalmente entre 70 mil e cem mil homens sob seu comando, de acordo com a rede Deutsche Welle (DW), enquanto al-Burhan liderava um efetivo de cerca de 200 mil no início do conflito.
No dia 16 de abril, um domingo, explosões puderam ser ouvidas no centro da capital Cartum, mais precisamente no entorno do quartel-general militar do Sudão e do palácio presidencial, locais estratégicos reivindicados tanto por militares quanto pelas RSF.
O aeroporto internacional da capital, tomado pela milícia, foi bombardeado com civis dentro. Aeronaves foram destruídas, e caças da força aérea sudanesa e tanques foram usados contra os paramilitares.
Embora as SAF sejam mais bem equipadas e em maior número, as RSF são igualmente bem treinadas, o que equilibra as ações. O balanço de forças apenas prolonga as hostilidades e a violência decorrente, com nenhum dos dois lados conseguindo se impor sobre o inimigo.
A terrível situação gera uma grave escassez de suprimentos essenciais, já que as entregas de produtos comerciais e de ajuda humanitária foram fortemente restringidas pelos combates e pelos desafios de acesso ao território controlado pelas RSF.