Trump reeleito: quais os efeitos globais esperados?

Em meio a conflitos na Europa e Oriente Médio e guerras comerciais, o cenário global pós-eleição do republicano é marcado por incertezas

A carreira política de Donald Trump parecia ter chegado ao fim após suas falsas alegações de fraude eleitoral em 2020, que incitaram uma multidão de apoiadores a invadir o Capitólio em 6 de janeiro de 2021, em uma tentativa malsucedida de reverter sua derrota no pleito daquele ano. Ledo engano. Nem o episódio em maio deste ano, quando o republicano se tornou o primeiro presidente norte-americano condenado por um crime, ao ser considerado culpado de falsificar registros comerciais para ocultar o pagamento de uma estrela pornô em troca de silêncio, foi o suficiente para sepultar a sua imagem.

A vitória de Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, oficializada nesta quarta-feira (6), promete ter impactos significativos e imediatos na economia global. Com um discurso que enfatiza políticas protecionistas e uma agenda fiscal agressiva, Trump, aos 78 anos, não apenas reafirma seu controle sobre o Partido Republicano, mas também acende preocupações entre aliados e rivais internacionais.

A vitória de Trump, definida por ele como um “mandato poderoso”, poderá influenciar as finanças globais de maneira profunda. Especialistas alertam que suas propostas, incluindo tarifas de importação elevadas e desregulamentação, podem alavancar a inflação e aumentar as taxas de juros nos Estados Unidos. A expectativa é que o Federal Reserve (Fed) reaja a essa inflação crescente com uma política monetária mais restritiva, o que já se reflete em um aumento significativo nos juros futuros e na valorização do dólar frente a outras moedas

Trump e seu vice, JD Vance, em setembro de 2024 (Foto: WikiCommons)

A vitória de Trump também traz incertezas para as relações diplomáticas. Sua postura firme em apoio a Israel pode dificultar os esforços de paz no Oriente Médio, enquanto sua pressão sobre a Ucrânia para negociar com a Rússia gera preocupações sobre a estabilidade europeia.

Aliás, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, parabenizou Trump por telefone e discutiu com ele “a ameaça iraniana” e a necessidade de colaborar pela segurança de Israel, segundo seu gabinete, relatou a Reuters. A conversa foi descrita como “calorosa e cordial”. Por outro lado, o Hamas, grupo militante palestino, exigiu o fim do “apoio cego” dos Estados Unidos a Israel.

Trump, que já pediu a Israel para “terminar o trabalho” no Oriente Médio, segundo repercutiu a Radio Free Europe (RFE), também afirmou que poderia resolver a guerra entre Rússia e Ucrânia rapidamente. Peter Skerry, professor de ciência política no Boston College, prevê que Trump buscará um acordo entre Moscou e Kiev, que exigirá grandes concessões da Ucrânia.

Skerry afirma que as ações de Trump em relação a Israel são menos claras, mas acredita que ele oferecerá forte apoio ao país enquanto tenta reviver os Acordos de Abraão, que buscam a normalização das relações entre árabes e israelenses.

Em relação à Europa, os países europeus podem enfrentar um aumento nos custos de defesa caso Trump decida diminuir o apoio militar à Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), forçando os aliados a investir mais em suas próprias Forças Armadas em um momento já complexo.

Zelensky parabeniza Trump e espera “paz justa”

O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky parabenizou Donald Trump por sua vitória nas eleições dos EUA e expressou esperança de que seu segundo mandato traga uma “paz justa” para a Ucrânia, repercutiu o The Moscow Times. Zelensky elogiou a abordagem de Trump, “paz pela força”, como uma possível solução para o conflito com a Rússia.

No entanto, a vitória do republicano levanta dúvidas sobre o futuro apoio dos EUA à Ucrânia, já que o ex-presidente tem sido crítico à assistência militar americana a Kiev.

O cenário político dos EUA, com suas divisões internas sobre a ajuda à Ucrânia, sugere que a relação futura entre os dois países pode passar por ajustes significativos, dependendo da postura que o novo governo dos EUA decidir adotar em relação ao conflito no leste europeu.

Trump e China: uma relação conturbada

O mandato anterior de Donald Trump foi marcado por uma intensa guerra comercial com a China, na qual o ex-presidente aplicou tarifas sobre centenas de bilhões de dólares em produtos chineses e iniciou uma campanha global contra a gigante de telecomunicações Huawei, lembrou a RFE. Essa abordagem agressiva, incluindo ameaças de tarifas de mais de 60% sobre todas as importações da China, provocou tensões significativas entre os dois países.

Com a economia chinesa já enfrentando desaceleração e Beijing ponderando sobre a implementação de um estímulo fiscal, essas políticas podem trazer dores econômicas no curto prazo. No entanto, analistas observam que, a longo prazo, essa postura pode ser benéfica para a China, especialmente sob a liderança de Xi Jinping. A divisão interna gerada pela política “América em Primeiro Lugar” de Trump, que desafia alianças tradicionais dos EUA e enfraquece os laços com parceiros europeus e asiáticos, pode abrir espaço para Beijing expandir sua influência global.

Essa estratégia de Trump pode ser vista por analistas chineses como uma oportunidade para Beijing ultrapassar Washington, explorando a fragilidade das relações diplomáticas dos EUA para fortalecer sua posição no cenário internacional. Caso a postura de Trump se mantenha em um eventual segundo mandato, a China poderá encontrar ainda mais brechas para ampliar sua presença diplomática e econômica, aproveitando o enfraquecimento das alianças dos EUA e ganhando terreno em um mundo cada vez mais multipolar.

Brasil

Para o Brasil, a reeleição de Trump significa um distanciamento nas relações bilaterais. A diferença ideológica entre o republicano e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode restringir a colaboração entre os dois países. Especialistas apontam que o Brasil enfrentará desafios econômicos consideráveis, com a valorização do dólar e a possível queda nas exportações para os Estados Unidos, seu segundo maior parceiro comercial. A combinação de tarifas elevadas e uma política econômica mais protecionista pode gerar um ciclo de dólar forte e inflação em ascensão no Brasil.

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