Beijing usa até drones para vigiar jornalistas estrangeiros no país, diz relatório

Celulares invadidos, ameaça de processos judiciais e abordagem truculenta da polícia marcam a rotina da imprensa na China

As condições de trabalho para os jornalistas estrangeiros na China não tiveram uma melhora significativa após a pandemia de Covid-19, mesmo com a reabertura do país e o fim das duras restrições impostas pelo governo. Relatório divulgado nesta semana pelo Clube de Correspondentes Estrangeiros da China (FCCC, na sigla em inglês) mostra que os profissionais de mídia vindos de outros países são vigiados constantemente durante o trabalho, e as autoridades usam inclusive drones para isso.

“Durante a pandemia, a situação no terreno era terrível”, disse David Rennie, chefe do escritório de Beijing da revista The Economist. “Agora a situação é muito mais aleatória. É mais difícil prever quando você será seguido ou quando viagens a trabalho sem supervisão serão interrompidas pelo departamento de propaganda local.”

Para produzir o relatório, o FCCC entrevistou profissionais de mídia que atuam no país asiático e fez a eles uma série de perguntas. Quase todos os entrevistados, ou 99%, disseram que as condições de trabalho para a imprensa na China raramente ou nunca atendem aos padrões internacionais. E 81% dos ouvidos afirmaram ter sofrido algum tipo de interferência, assédio ou violência durante o trabalho.

Drone com câmera: arma chinesa contra a liberdade de imprensa (Foto: stockvault.net)

Uma novidade no relatório divulgado nesta semana, que aborda a atuação da mídia em 2023, é o uso de drones pelo governo para vigiar os jornalistas.

Dois entrevistados que atuam na imprensa europeia disseram ter passado por isso, em momentos e locais distintos. Ambos contam que estavam em viagens a trabalho e eram seguidos por carros com autoridades chinesas à paisana. Em determinados pontos do trajeto, quando a vigilância de dentro do automóvel se tornava complicada, os jornalistas relatam ter avistado drones sobre os veículos que os transportavam.

“É um jogo interminável de gato e rato. Seja qual for a estratégia que você tente, o sistema chinês de vigilância e segurança se adapta e preenche a lacuna. Quaisquer que sejam as estratégias que você use, o espaço para reportagem fica cada vez menor”, afirmou um terceiro profissional de um veículo de mídia europeu.

Um sistema mais frequentemente adotado pelas autoridades chinesas para monitorar o trabalho da imprensa é a vigilância digital. A maioria dos entrevistados disse ter motivos para acreditar que “possível ou definitivamente” o governo tinha acesso a seus aplicativos WeChat (81%), seus telefones (72%) e/ou colocado escutas em escritórios ou mesmo residências (55%).

A atuação da imprensa é consideravelmente mais complicada em áreas sensíveis, como Xinjiang e o Tibete. Mais recentemente, regiões próximas às fronteiras com a Rússia, a Mongólia e com países do Sudeste Asiático têm-se tornado gradativamente mais vigiadas. Aqueles que fazem vídeos ou fotos tendem a ser abordados por policiais à paisana, sob ordens de apagar os arquivos.

Quando o sistema de vigilância falha, Beijing tem uma alternativa extrema. “Houve vários casos em que as autoridades ou as fontes, presumivelmente sob pressão, ameaçaram jornalistas com ações judiciais. Em 2021, quando isto chamou a atenção da FCCC pela primeira vez como uma tática cada vez mais comum, nove colegas foram alvo de uma ação judicial”, diz o relatório.

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