Fim da política ‘Zero Covid’ pode matar até um milhão na China, dizem especialistas

Flexibilização repentina das medidas restritivas pode levar a 684 mortes por milhão de habitantes, de acordo com um estudo

O fim dos bloqueios de Covid na China, anunciado no início deste mês pelo governo, pode levar a até um milhão de mortes em função da doença no país asiático. A projeção foi feita por três professores da Universidade de Hong Kong, em estudo financiado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) chinês e o governo honconguês. As informações são da rede CNN.

Beijing vinha adotando severas regras de combate ao coronavírus, a política “Zero Covid”, com relatos de milhões de cidadãos trancados em casa durante períodos longos e empresas impedidas de funcionar. Isso impactou duramente nas vidas das pessoas e na economia do país, gerando protestos populares.

Manifestações foram registradas em todo o país, algo raro sobretudo no governo do presidente Xi Jinping. Então, com a insatisfação crescente inclusive entre os empresários, Beijing optou por afrouxar as medidas repentinamente, uma decisão que vem sendo contestada por especialistas.

Mercado de rua em Beijing, junho de 2009 (Foto: Robin Zebrowski/Flickr)

Entre as medidas de flexibilização, doentes assintomáticos ou com sintomas leves estão autorizados a se isolar em casa, não mais em instalações do governo. Testes de PCR e o aplicativo de monitoramento de saúde deixaram de ser obrigatórios para acessar locais públicos. Já os bloqueios de rua, que antes atingiam distritos inteiros, agora são menores, concentrados em andares ou edifícios específicos.

Para o trio de especialistas, o fim repentino das medidas restritivas pode levar a até 684 mortes por milhão de habitantes. Considerando a população atual de 1,4 bilhão de pessoas, a China poderia perder 964,4 mil pessoas para o novo coronavírus.

O problema do afrouxamento das medidas é justamente o fato de que os cidadãos ficaram trancados durante muito tempo, o que reduziu entre os chineses a imunidade encontrada em outros países. Aumenta a preocupação a baixa taxa de vacinação entre os idosos, sendo que apenas 40% das pessoas a partir dos 80 anos receberam a terceira dose da vacina.

Junto das mortes ocorreria a sobrecarga do sistema de saúde, com o número de internações atingindo entre 1,5 e 2,5 vezes o limite dos hospitais. Já há relatos de médicos que receberam ordens para permanecer no trabalho mesmo após terem testado positivo, devido ao alto número de pacientes que demandam tratamento, segundo o jornal Financial Times (FT).

Primeiras mortes

Na segunda-feira (19), Beijing anunciou oficialmente as duas primeiras mortes em função da doença desde o fim das medidas restritivas. Porém, há fortes indícios de que o governo esteja omitindo os números reais.

Nas redes sociais, há vários relatos de que cresceu bastante a demanda pelos serviços das funerárias, com pessoas dizendo que precisaram esperar até 24 horas para conseguir cremar o corpo de parentes. As buscas pela expressão “casas funerárias” também explodiu no Baidoo, o principal site de buscas chinês.

Na semana passada, um crematório na capital relatou que pelo menos 30 vítimas de coronavírus foram cremadas em um dia, segundo o FT. “Nós cremamos 150 corpos, muito mais do que em um dia típico no inverno passado”, disse um funcionário da funerária estatal Beijing Dongjiao, que falou sob condição de anonimato. “Trinta ou 40 tiveram Covid”.

Outro sinal de que o problema é sério foi a suspensão da divulgação de dados oficiais dos casos assintomáticos, que representam a maioria dos registros. O governo admitiu que não era mais possível rastrear o número real de infecções.

Segundo Wu Zunyou, epidemiologista-chefe do CDC, a primeira onda nessa nova etapa da pandemia na China deve durar até meados de janeiro, com uma segunda onda prevista para se estender até fevereiro.

E a situação não preocupa apenas os chineses. O governo norte-americano alertou mais de uma vez que o novo surto na China pode se espalhar por todo o mundo. Segundo Anthony Fauc, consultor médico da Casa Branca, o risco é o de que novas variantes da Covid surjam por lá e posteriormente se espalhem.

A preocupação foi reforçada na segunda-feira (19) por Ned Price, porta-voz do Departamento de Estado dos EUA. “Vimos isso ao longo de muitas mutações diferentes desse vírus, e certamente é outra razão pela qual estamos tão focados em ajudar países ao redor do mundo a lidar com a Covid”, disse ele.

Tags: