Índia revoga os privilégios de visto para os críticos do premiê Narendra Modi, diz ONG

Nova Délhi leva repressão para além das fronteiras e atinge indianos no exterior que se opõem às políticas do partido governista BJP

As autoridades indianas estão revogando os privilégios de visto de críticos estrangeiros de origem indiana que se manifestam contra as políticas do Partido Bharatiya Janata (BJP), do qual faz parte o primeiro-ministro disse Narendra Modi. A denúncia foi feita no domingo (17) pela Human Rights Watch (HRW).

Segundo a ONG de direitos humanos, o premiê costuma participar de grandes reuniões de partidários nos Estados Unidos, na Europa, na Austrália e em outros lugares. Embora celebre nesses eventos a democracia indiana, seu governo não hesita em punir pessoas que, segundo Modi, estão “manchando a imagem” do país.

O status de OCI (Overseas Citizenship of India), que significa cidadão estrangeiro na Índia, oferece amplos direitos de residência para estrangeiros de origem indiana ou casados com cidadãos indianos, mas não concede cidadania. Muitos críticos do BJP, incluindo acadêmicos, ativistas e jornalistas de origem indiana, tiveram seus vistos OCI revogados. Alguns recorreram aos tribunais indianos, com base em fundamentos constitucionais para proteger seus direitos de expressão e subsistência.

Primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi (Foto: Mark Garten/UN Photo)

Elaine Pearson, diretora da HRW na Ásia, expressou preocupação com as represálias do governo indiano contra membros da diáspora que criticam as políticas abusivas do BJP. Ela afirma que essa hostilidade crescente reflete a intenção das autoridades de expandir a repressão política além das fronteiras indianas.

Nos últimos anos, o governo do BJP tem restringido os privilégios dos portadores do cartão OCI, exigindo permissão especial para atividades como pesquisas e jornalismo na Índia. Em 2021, o governo rebaixou os privilégios dos 4,5 milhões de portadores do cartão OCI, recategorizando-os como “cidadãos estrangeiros” e exigindo que eles buscassem permissão especial para realizar pesquisas e jornalismo ou visitar qualquer área na Índia listada como “protegida”.

Nos últimos dez anos, mais de 100 permissões foram canceladas e alguns detentores do status OCI foram deportados sob a acusação de expressarem “descontentamento com a Constituição”. Isso gerou preocupações entre os portadores do cartão OCI, especialmente aqueles com laços familiares fortes na Índia e no exterior.

Em 2022, Ashok Swain, um acadêmico sueco de ascendência indiana, teve seu status OCI revogado pelas autoridades indianas. Ele apelou ao Tribunal Superior de Nova Délhi, que anulou a ordem, argumentando que o governo não apresentou justificativas claras para suas ações. Em julho de 2023, o consulado indiano na Suécia emitiu outra ordem cancelando o status OCI de Swain devido a suas postagens nas redes sociais, alegando que elas feriam sentimentos religiosos e tentavam desestabilizar a sociedade indiana, sem fornecer evidências específicas.

Após contestar a ordem em setembro de 2023, autoridades afirmaram ter recebido informações confidenciais de agências de segurança. Em fevereiro de 2024, sua conta no X, antigo Twitter, foi bloqueada na Índia e hackeada em seguida. Swain afirmou à HRW que seu caso foi usado como “exemplo para intimidar outros acadêmicos a não criticarem o regime indiano”, criando “um clima de medo” entre aqueles que desejam retornar ao país.

Imprensa

As autoridades indianas intensificaram a utilização de táticas políticas contra repórteres estrangeiros com estatuto de OCI. Vanessa Dougnac, jornalista francesa que viveu na Índia por 22 anos, recebeu um aviso de “causa espetáculo” – termo usado para descrever uma situação na qual alguém ou algo atrai atenção pública devido a seu comportamento, ações ou circunstâncias consideradas dramáticas, controversas ou sensacionalistas – em janeiro de 2024, ameaçando cancelar seu cartão OCI devido a suas reportagens. Ela teve permissão negada para trabalhar como jornalista em 2022 e não recebeu explicações do Ministério do Interior.

Em 2023, um jornalista americano teve seu estatuto de OCI revogado após reportar ações criminosas de uma empresa indiana, sem acusações específicas ou provas apresentadas.

O jornalista, optando por permanecer anônimo, informou à Human Rights Watch que não recebeu acusações específicas nem evidências, apesar de ter feito vários pedidos.

A HRW relatou que escritores, jornalistas, acadêmicos e ativistas estrangeiros têm enfrentado crescentes restrições de acesso à Índia, aparentemente por motivos políticos. Em março de 2022, o antropólogo britânico Filippo Osella, que visitava o país há mais de 30 anos, foi impedido de entrar, mesmo possuindo um visto válido. Outros negados incluem a escritora australiana Kathryn Hummel, a acadêmica paquistanesa Annie Zaman, o ex-diplomata suíço e ativista Kurt Vogele, Mukunda Raj Kattel do Fórum Asiático para Direitos Humanos e Desenvolvimento, e os ativistas do Greenpeace Aaron Gray-Block e Ben Hargreaves.

O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP), do qual a Índia é signatária, trata dos direitos dos estrangeiros legalmente presentes em um país no artigo 13, e proíbe a discriminação contra “todas as pessoas”, incluindo não nacionais, no artigo 26.

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