A ONG Anistia Internacional (AI) afirmou na sexta-feira (16) que, um ano após o incêndio criminoso e os ataques em massa contra igrejas e bairros cristãos em Jaranwala, o governo do Paquistão não conseguiu fazer justiça à comunidade cristã minoritária, nem impedir o uso abusivo das leis de blasfêmia.
Segundo informações obtidas pela AI através de uma Solicitação de Direito à Informação no Departamento de Polícia da Cidade de Faisalabad, mais de 90% dos suspeitos envolvidos nos ataques em Jaranwala, no distrito de Faisalabad, em Punjab, ainda permanecem foragidos.
Enquanto isso, os julgamentos dos detidos em conexão com os ataques, que foram desencadeados por falsas acusações de blasfêmia contra dois moradores cristãos, ainda não tiveram início. Além disso, cerca de 40% das famílias cristãs minoritárias afetadas pela violência ainda esperam pela indenização prometida pelo governo.
As autoridades relataram que o incidente foi instigado por um grupo de extremistas religiosos muçulmanos, que acusou uma família cristã local de profanar o Alcorão, o que levou à eclosão da violência e dos ataques. A polêmica começou quando páginas rasgadas da obra foram encontradas perto da residência onde vivem os acusados e levadas ao conhecimento de uma liderança religiosa local.
Babu Ram Pant, diretor regional adjunto da Anistia Internacional para o Sul da Ásia, criticou a resposta inadequada das autoridades ao caso de violência em Jaranwala, destacando que isso criou “um clima de impunidade para os perpetradores”.
“Um ano depois, a comunidade cristã minoritária está sendo forçada a se reconciliar com o fato de que seus agressores continuam a viver entre eles sem repercussões. O governo do Paquistão deve garantir que a justiça seja feita e que os grupos minoritários sejam protegidos contra discriminação e violência”, disse Pant.
Marginalização
A resposta insuficiente das autoridades à violência em Jaranwala deixou a comunidade cristã local vivendo em constante medo, enfrentando ameaças persistentes e marginalização. O aumento das tensões resultou na perda de empregos para muitos, impactando negativamente os negócios e a vida cotidiana na cidade.
Famílias cristãs, ainda amedrontadas, continuam a lidar com as ameaças dos agressores que foram libertados no último ano. Em busca de segurança, algumas dessas famílias migraram para cidades próximas. Enquanto isso, líderes religiosos que incitaram a violência continuam livres e exercendo influência na região.
Violência no Paquistão ocorreu em região majoritariamente cristã (Foto: Twitter/Captura de tela)
Embora o governo tenha restaurado igrejas destruídas, muitos cristãos em Jaranwala ainda aguardam a indenização prometida. Khalida Bano, uma moradora cristã, relatou que, apesar de algumas pessoas terem recebido a compensação de 2 milhões de rúpias (R$ 38,4 mil), sua família ainda não recebeu nada. Além disso, seu marido continua desempregado devido ao estigma associado ao incidente.
Samuel Payara, principal representante da comunidade cristã em casos relacionados aos ataques de Jaranwala na Suprema Corte, criticou a impunidade em casos de violência contra minorias religiosas. Ele destacou que, apesar de milhares de pessoas terem sido acusadas, apenas cerca de 400 foram presas, e a maioria já está solta. Além disso, o homem que incitou a violência usando o alto-falante de uma mesquita também foi liberado sob fiança, e grupos têm assediado as vítimas para evitar que testemunhem nos processos.
Pena capital
No Paquistão, a blasfêmia, que envolve insultos percebidos ao Islã ou figuras islâmicas, pode resultar em pena de morte. Embora ninguém tenha sido executado por isso, há registros de linchamentos por multidões furiosas contra acusados.
Muitos estão detidos sob acusações de blasfêmia, e os julgamentos frequentemente são adiados por medo de retaliações caso pareçam brandos. Organizações de direitos humanos afirmam que tais acusações são, às vezes, usadas para ajustar contas pessoais.