Restrições à liberdade de imprensa por governos autoritários ultrapassam fronteiras, diz ONG

Segundo relatório, jornalistas exilados estão sujeitos a agressões, assédio e deportação ilegal perpetrados pelos regimes dos quais fugiram

Vozes críticas que desafiam regimes autoritários ao redor do mundo enfrentam o risco de serem silenciadas para sempre mesmo se estiverem longe de casa. É o que revela um novo relatório da ONG de direitos humanos Freedom House divulgado nesta quarta-feira (6), que detalha como autocracias estão indo além de suas fronteiras para atacar jornalistas e controlar informações.

Entre 2014 e 2023, 26 governos, incluindo Belarus, Camboja, China, Irã, Paquistão, Rússia, Arábia Saudita e Turquia, cometeram pelo menos 112 atos de repressão transnacional, segundo o estudo intitulado A Light That Cannot Be Extinguished (Uma Luz Que Não Pode Ser Apagada: Jornalismo Exilado e Repressão Transnacional, em tradução livre). Entre as as táticas utilizadas contra profissionais de imprensa exilados, o documento destacou ataques físicos, represálias contra familiares, deportações, detenções e assédio digital.

“O mais recente capítulo no crescente manual autoritário envolve a perseguição de jornalistas exilados que ousam revelar a verdade sobre as prioridades, o desempenho e os erros de um regime”, declarou Michael Abramowitz, presidente da Freedom House. Ele ressaltou que os jornalistas enfrentam ameaças crescentes de assassinato, intimidação e coerção no desempenho de suas funções.

Protesto pela liberdade de imprensa em Zagreb, na Croácia (Foto: WikiCommons)

A análise surge em meio a um aumento global nos ataques à imprensa livre e independente, forçando um número crescente de jornalistas a se refugiarem no exílio. Fundamentado em entrevistas com mais de uma dúzia de repórteres exilados, o relatório ilustra de que forma a repressão transnacional tem impactado profundamente as vidas desses profissionais, causando prejuízos consideráveis a uma atividade tida como um pilar da democracia.

Os jornalistas exilados vivenciam uma ameaça constante de danos físicos, detenções e sequestros, restringindo sua mobilidade, comunicação com fontes e cobertura de temas sensíveis, diz a Freedom House. Além disso, ameaças digitais, como ataques cibernéticos, vigilância, doxing (exposição de informações privadas de uma pessoa na internet sem consentimento, visando prejudicá-la) e assédio, prejudicam sua capacidade de alcançar o público.

Outra situação registrada são campanhas difamatórias que minam a credibilidade desses profissionais, ao passo que a intimidação de seus familiares exerce um impacto psicológico expressivo.

Um dos casos mostrados é o de Idris Hasan, um defensor dos direitos humanos uigur que reside na Turquia desde 2012. Em julho de 2021, ao chegar ao aeroporto de Casablanca, no Marrocos, foi preso pelas autoridades locais com base em um aviso da Interpol. O governo chinês alega que Hasan tem conexões com uma organização terrorista, uma acusação comum contra os uigures, minoria étnica com raízes turcas que habita a província de Xinjiang, no extremo oeste do país.

Embora a Interpol tenha cancelado a notificação pouco depois de sua prisão, Hasan permanece detido, enfrentando a ameaça de deportação para a China, onde há temores de que possa ser submetido a tortura.

As ameaças fora do país complicam ainda mais os desafios práticos e financeiros dos jornalistas exilados. Os líderes autocráticos que tentam silenciar esses profissionais podem aumentar os custos de manutenção dos meios de comunicação no exterior e criar dificuldades para se estabelecer em um novo país seguro, aponta o estudo.

Jessica White, co-autora do relatório e analista sênior de pesquisa para meios de comunicação e democracia na Freedom House, enfatizou a necessidade de as democracias agirem em apoio aos jornalistas exilados. “Não se pode simplesmente ficar de braços cruzados, esperando que se defendam sozinhos”, declarou.

Jessica argumenta que é crucial que as democracias intensifiquem seus esforços para apoiar e proteger aqueles que continuam a desafiar a censura e destacar questões cruciais em seus países de origem.

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