Milhares de norte-coreanos estão sendo levados à Rússia sob o pretexto de participarem de programas de intercâmbio educacional, mas acabam submetidos a condições de trabalho análogas à escravidão. A denúncia foi publicada nesta segunda-feira (24) pelo site The Insider, segundo o qual os trabalhadores enfrentam jornadas extenuantes e têm parte dos salários confiscada por empresas russas e pelo governo da Coreia do Norte.
De acordo com a reportagem, o esquema é liderado pelo Centro Intergovernamental de Migração (MMC), que recruta os trabalhadores sob a justificativa de “treinamento prático”. Na realidade, os norte-coreanos chegam a trabalhar até 20 horas por dia, em seis dias da semana. Para burlar as sanções do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), a entidade afirma que os migrantes são estudantes de programas educacionais.

O chefe do MMC, Sergei Tkachuk, afirmou que o processo de seleção envolve exigências da embaixada da Coreia do Norte em Moscou. “As ordens devem ser de pelo menos cem pessoas, a empresa deve ter ao menos três anos de existência e estar financeiramente saudável”, explicou.
Cada empregador paga cerca de US$ 1,6 mil (R$ 8,8 mil) por trabalhador ao governo norte-coreano, além de uma taxa extra de 20 mil rublos (R$ 1,4 mil) ao próprio MMC.
Os contratos, que violam diretamente as resoluções 2375 e 2397 da ONU, sancionadas com apoio da própria Rússia em 2017, incluem trabalhadores em diferentes setores: construção civil, indústria alimentícia, agricultura e até assistência odontológica. Entre os contratantes estão empresas de Moscou, São Petersburgo, Sochi e até regiões ocupadas na Ucrânia, como Crimeia, Luhansk e Donetsk.
O número de norte-coreanos entrando na Rússia com visto de estudante disparou em 2024. Dados do Serviço Federal de Migração mostram que 13.221 cidadãos da Coreia do Norte chegaram ao país este ano — um aumento de mais de 1.000% em relação a 2023, quando foram registradas apenas 1.117 entradas. Cerca de 60% (7.887 pessoas) afirmaram ter como motivo “educação”.
Cedric Ryngaert, chefe do Departamento de Direito Internacional da Universidade de Utrecht, na Holanda, avaliou que o governo russo está consciente da ilegalidade da prática. “O que vemos são sanções ‘tigre de papel’ — resoluções que existem apenas no papel, mas não são cumpridas na prática”, afirmou.