Russo é preso porque a filha fez na escola um desenho de protesto contra a guerra

Aleksey Moskalev estava na mira das autoridades desde o ano passado e agora foi detido, com a menina enviada a um orfanato

As autoridades da Rússia prenderam um cidadão local, Aleksey Moskalev, porque a filha dele, Masha, de 12 anos, há pouco menos de um ano fez na sala de aula um desenho de protesto contra a guerra na Ucrânia. A menina agora está um orfanato, de acordo com informações da ONG OVD-Info, que monitora a repressão no país.

O homem já estava na mira do governo, sob a acusação de “desacreditar as forças armadas,” desde abril de 2022. Na ocasião, a filha fez na escola um desenho que mostra uma mulher vestindo as cores da bandeira ucraniana, com uma criança no colo e sob uma chuva de mísseis. A ilustração traz ainda bandeiras dos dois países envolvidos na guerra e as frases “Não à guerra” e Glória à Ucrânia”.

Então, a professora de artes da menina levou o desenho ao diretor da escola, que por sua vez notificou as autoridades. Aleksey passou a ser investigado pelo FSB (Serviço de Segurança Federal, da sigla em inglês), e em dezembro do ano passado foi formalmente acusado, sob a justificativa de havia postado nas redes sociais conteúdo crítico ao conflito.

Após ter a casa invadida e ser interrogado de forma violenta pelas autoridades, o homem decidiu deixar a cidade de Efremov, onde vivia. Mas nem por isso deixou de ser perseguido. Neste quarta-feira (1º), quase um ano após o desenho, ele acabou detido e encaminhado a um presídio. Como ele criava a filha sozinho, vez que a mãe da menina os abandonou há quase dez anos, Masha foi enviada a um orfanato.

Masha Moskaleva exibe o desenho e a frase “Eu sou contra a guerra!”, em russo (Foto: reprodução/ovd.news)
Por que isso importa?

Na Rússia, protestar contra o governo já não era uma tarefa fácil antes da eclosão da guerra na Ucrânia. Os protestos coletivos desapareceram das ruas a partir do momento em que a Justiça local passou a usar a pandemia de Covid-19 como pretexto para punir grandes manifestações, alegando que o acúmulo de pessoas feria as normas sanitárias. Assim, tornou-se comum ver manifestantes solitárias erguendo cartazes com frases contra o governo.

Desde a invasão do país vizinho por tropas russas, no dia 24 de fevereiro, o desafio dos opositores de Putin aumentou consideravelmente, com novos mecanismos legais à disposição do Estado e o aumento da violência policial para silenciar os críticos. Uma lei do início de março, com foco na guerra, pune quem “desacredita o uso das forças armadas”.

Dentro dessa severa nova legislação, os detidos têm que pagar multas que chegam a 300 mil rublos (R$ 22 mil). A pena mais rigorosa é aplicada por divulgar “informações sabidamente falsas” sobre o exército e a “operação militar especial” na Ucrânia, que é como o governo descreve a guerra. A reclusão pode chegar a 15 anos.

O cenário mudou levemente com a mobilização militar parcial anunciada no dia 20 de setembro. O risco de serem obrigados a lutar na Ucrânia levou milhares de reservistas a fugir do país, com fronteiras lotadas em países como GeórgiaMongólia e Cazaquistão. Entre os que ficaram, a ideia de aceitar a convocação nunca foi unanimidade, e protestos populares voltaram a ser registrados em todos os cantos. 

Somente na primeira semana que sucedeu o anúncio, a OVD-Info registrou quase 2,5 mil detenções em protestos populares contra a mobilização. E o número real de detidos tende a ser maior, vez que a entidade contabiliza somente os nomes que confirmou e que foi autorizada a divulgar, tendo sempre como base as listas fornecidas pelas autoridades.

Desde o início da guerra, a ONG reporta mais de 19,5 mil detenções em protestos contra a guerra em todo o país, com 400 pessoas levadas ao tribunal para responder criminalmente por seus atos. A enorme maioria dos casos, cerca de 15 mil, foi registrada no primeiro mês de guerra. Depois, houve um pico entre setembro e outubro, devido ao recrutamento. Entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023, foram registradas somente 22 detenções, um sinal de que a repressão estatal tem funcionado.

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