Seis meses após tragédia do Adriana, grupos humanitários voltam a culpar a Grécia

Anistia Internacional e Human Rights Watch dizem que testemunhos indicam culpa da Guarda Costeira pela morte de cerca de 600 pessoas

No dia 14 de junho deste ano, o barco de pesca Adriana, que levava cerca de 750 pessoas, naufragou na costa da Grécia e deixou um número incerto de vítima fatais. Apenas 104 pessoas foram resgatadas vivas, o que coloca o número de mortos na casa dos 600. Seis meses depois, as investigações pouco avançaram e ninguém foi punido, o que levou duas das principais organizações humanitárias do mundo a culpar e cobrar as autoridades gregas nesta quinta-feira (14).

“O naufrágio em Pylos parece ser outro exemplo trágico da abdicação das autoridades gregas da responsabilidade de salvar vidas no mar”, disse Judith Sunderland, diretora associada da Human Rights Watch (HRW) para Europa e Ásia Central. “Um relato completo do que aconteceu é fundamental para garantir a verdade e a justiça para os sobreviventes e as famílias das vítimas e para ajudar a evitar mortes futuras.”

Tanto a HRW quanto a Anistia Internacional já haviam questionado Atenas em agosto, dando a entender que o governo foi culpado pelo naufrágio. Na ocasião, as duas entidades disseram que havia diferentes versões para a tragédia, e os relatos dos sobreviventes indicavam omissão das autoridades. Agora, seis meses depois da tragédia, ampliaram a pressão.

Cidade de Pylos, na Grécia, região do naufrágio do Adriana (Foto: pxfuel.com)

A embarcação havia iniciado sua viagem na Líbia cinco dias antes do naufrágio, com cerca de 750 migrantes e requerentes de asilo a bordo. Entre os passageiros havia muitas crianças, a maioria delas da da Síria, do Paquistão e do Egito. Apenas 104 pessoas sobreviveram, e 82 corpos foram recuperados.

Segundo as testemunhas, o Adriana, um barco de pesca cuja capacidade era bem inferior à lotação, virou porque foi interceptado e rebocado pela Guarda Costeira grega, que sempre desmentiu tais alegações.

“As autoridades estavam claramente cientes dos indicadores de perigo, como a superlotação e a insuficiência de comida e água no Adriana. E, segundo os sobreviventes, sabiam da existência de cadáveres a bordo e de pedidos de resgate”, diz a Anistia, negando ainda a alegação de Atenas de que as pessoas a bordo pediram para não serem resgatadas.

“Os sobreviventes disseram consistentemente que imploraram repetidamente por resgate, inclusive à própria Guarda Costeira”, afirma a ONG. “Após o barco virar, o navio da Guarda Costeira demorou a ativar as operações de salvamento, não conseguiu maximizar o número de pessoas resgatadas e se envolveu em manobras perigosas.”

As duas entidades afirmam que outras investigações igualmente apontam culpa das autoridades gregas. Porém, em vez de assumir a responsabilidade, o governo agiu contra os próprios sobreviventes, com nove deles detidos e acusados de crimes diversos, inclusive de contribuir para as centenas de mortes.

“Os fracassos históricos nas investigações da Grécia sobre naufrágios envolvendo pessoas em movimento e a impunidade generalizada para violações sistêmicas dos direitos humanos nas suas fronteiras levantam preocupações sobre a adequação dos inquéritos judiciais em curso sobre a tragédia”, dizem a Anistia e a HRW em comunicado.

Segundo Adriana Tidona, investigadora para casos de migração da Anistia, os familiares não apenas merecem justiça, mas também têm o direito de participar ativamente do processo judicial. Ela acrescenta que igualmente cabe ao governo do país europeu “garantir que as investigações sejam realizadas em tempo hábil, garantindo a integralidade e a integridade das provas admitidas.”

Tags: