Cinquenta milhões de pessoas vivem em ‘escravidão moderna’, diz relatório

Coreia do Norte e a Eritreia têm as taxas mais altas do mundo, apontou organização de direitos humanos

Um novo estudo publicado em Londres revela um aumento significativo no número de vítimas da escravidão moderna nos últimos anos. De acordo com o último Índice Global de Escravidão, divulgado pela organização de direitos humanos Walk Free nesta quarta-feira (24), estima-se que 50 milhões de pessoas estavam vivendo em situações que ferem a dignidade humana em 2021. Isso representa um aumento de dez milhões em relação à estimativa anterior feita cinco anos atrás. As informações são da rede Deutsche Welle (DW).

O documento aponta que a situação da escravidão moderna está se deteriorando, especialmente em um contexto de conflitos armados cada vez mais intensos, degradação ambiental generalizada e os impactos da pandemia de Covid-19, entre outros fatores.

De acordo com a definição da organização Walk Free, a escravidão moderna abrange diversos conceitos jurídicos, como trabalho forçado, servidão por dívida, casamento forçado, práticas análogas à escravidão e tráfico humano. Esses termos englobam uma variedade de situações em que indivíduos são explorados, privados de sua liberdade e sujeitados a condições de trabalho degradantes e coerção.

Mulher em situação de trabalho forçado (International Labour Organization/Flickr)

“A escravidão moderna está escondida à vista de todos e está profundamente entrelaçada com a vida em todos os cantos do mundo. Todos os dias, as pessoas são enganadas, coagidas ou forçadas a situações de exploração que não podem recusar ou abandonar”, disse o estudo, que acrescentou: “Todos os dias, compramos os produtos ou usam os serviços que foram forçados a fazer ou oferecer sem perceber o custo humano oculto”.

O trabalho forçado afeta cerca de 27,6 milhões de pessoas na escravidão moderna, enquanto o casamento forçado afeta aproximadamente 22 milhões de pessoas, representando quase uma em cada 150 pessoas em todo o mundo, de acordo com o relatório.

Evidências de práticas de escravidão moderna também têm sido documentadas em lugares como a Coreia do Norte (104,6 pessoas por 1.000 habitantes), a Eritréia (90,3) e a Mauritânia (32). Arábia Saudita, Turquia, Emirados Árabes Unidos e Kuwait também ficaram entre os 10 primeiros.

“Esses países compartilham algumas características políticas, sociais e econômicas, incluindo proteções limitadas para liberdades civis e direitos humanos”, disse o estudo.

Recentemente, em entrevista à DW, três norte-coreanos que conseguiram fugir do país denunciaram os abusos do regime e cobraram uma ação global para ajudar os compatriotas presos injustamente no país.

“A Coreia do Norte é um inferno”, afirmou Jung Gwang-il, dissidente norte-coreano e presidente da organização humanitária No Chain, sediada em Seul, na Coreia do Sul. “É difícil para as pessoas do mundo exterior entender como é a situação na Coreia do Norte “.

Segundo o relatório, muitas regiões afetadas pela escravidão moderna são marcadas por conflitos, instabilidade política ou autoritarismo. Além disso, algumas áreas abrigam uma grande população de refugiados e trabalhadores migrantes que não possuem as mesmas proteções legais que os cidadãos locais, tornando-os altamente vulneráveis à exploração.

Dimensionando a extensão do problema e a necessidade de ação urgente para combater a exploração, o relatório destaca que a escravidão moderna também é uma realidade em países do G20. Estima-se que 11 milhões de pessoas sejam exploradas na Índia, 5 milhões na China e 1,8 milhão na Rússia.

Regimes autoritários

O estudo também observa que em vários países, os governos obrigam seus cidadãos a trabalhar em diversos setores, incluindo prisões privadas, ou através de recrutamento forçado. Essas práticas evidenciam violações graves dos direitos humanos e um desrespeito à dignidade das pessoas envolvidas.

Neste mês, o antropólogo alemão Adrian Zenz, conhecido por ter publicado diversos relatórios e artigos importantes sobre a situação dos uigures na Região Autônoma de Xinjiang, na China, apresentou um novo estudo sobre o trabalho forçado da minoria étnica muçulmana pelas mãos do Estado.

Construído a partir de registros internos do Estado chinês, o relatório revela como a mão de obra uigur em Xinjiang se tornou coercitiva a partir de 2019. Ele detalha como regiões da província compilaram listas de indivíduos classificados como “preguiçosos”, “bêbados” e “outras pessoas com motivação interior insuficiente para o trabalho”. A identificação servia para que elas fossem posteriormente submetidas a programas de “educação de pensamento” e enviadas a colheita de algodão.

O relatório ainda observou que, embora a principal responsabilidade pela mudança caiba nos governos nacionais, “é necessária uma abordagem que envolva toda a sociedade – os parceiros sociais, os participantes da economia social e solidária, as empresas, os investidores, os grupos de sobreviventes, a sociedade civil e uma série de outros atores têm papéis fundamentais a desempenhar”.

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