“A Coreia do Norte é um inferno”, diz dissidente, que cobra ação global contra os abusos no país

Homem que fugiu do país critica o Ocidente por priorizar a beligerância de Pyongyang e ignorar as questões de direitos humanos

Nos últimos anos, a Coreia do Norte tem atraído as atenções do Ocidente em razão dos frequentes testes de mísseis realizados por suas forças armadas. Em meio à tensão, amplificada pela capacidade nuclear de Pyongyang, outra questão ficou em segundo plano: os abusos de direitos humanos. Em entrevista à rede Deutsche Welle (DW), três norte-coreanos que conseguiram fugir do país denunciaram os abusos do regime e cobraram uma ação global para ajudar os compatriotas presos injustamente no país.

“A Coreia do Norte é um inferno”, afirmou Jung Gwang-il, dissidente norte-coreano e presidente da organização humanitária No Chain, sediada em Seul, na Coreia do Sul. “É difícil para as pessoas do mundo exterior entender como é a situação na Coreia do Norte “.

Ele e outros dois compatriotas que fugiram denunciam os maus-tratos sobretudo contra prisioneiros políticos, invariavelmente detidos sob a acusação de manter algum tipo de relação com a Coreia do Sul ou seus cidadãos. Os três foram entrevistados em Estrasburgo durante um evento do Parlamento da União Europeia (UE), sediado na cidade francesa.

Um trem movimentado na estação de metrô de Kaeson, Pyongyang (Foto: Thomas Evans/Unsplash)

“Os prisioneiros são tratados como sub-humanos. Existem vários tipos de centros de detenção no país”, declarou Jung, citando tortura com choques elétricos e espancamento como práticas habituais para obter confissões forçadas. “Em seguida, são transferidos para campos de prisioneiros políticos, onde são submetidos a mais de 18 horas de trabalhos forçados por dia”.

Segundo outra dissidente, que pediu anonimato por questões de segurança, aqueles que conseguem fugir do país rumo à Coreia do Sul são tratados como traidores pelo regime do Norte. “Mas não somos traidores. Saímos da Coreia do Norte porque a vida era difícil. Não podíamos comer direito e estávamos sujeitos à repressão política e econômica”, disse ela.

Armas antes, comida depois

O trio de dissidentes alega que o Ocidente age, de certa forma, exatamente como o regime ditatorial de Kim Jong-un, que coloca as questões militares acima do bem-estar da população. “O regime de Kim quer gastar dinheiro em seu programa nuclear e de mísseis e não em fornecer comida para seu povo”, diz Robert Collins, especialista em Coreia e consultor sênior da HRNK, ONG norte-americana que busca chamar a atenção do mundo para os abusos na Coreia do Norte.

Nesse sentido, sobram críticas inclusive para a ONU (Organização das Nações Unidas). “Já se passaram dez anos desde que a Comissão de Inquérito da ONU sobre a Coreia do Norte foi estabelecida. Nada mudou nesses dez anos. Absolutamente nada”, disse Jung.

Greg Scarlatoiu, diretor executivo da HRNK, concorda com a análise. “O desafio antes, durante e depois da [formação da] Comissão de Inquérito da ONU é que os direitos humanos sempre são superados por outras questões: militares, nucleares, mísseis, segurança…”.

Michiel Hoogeveen, membro do Parlamento da UE, reforça o pedido dos dissidentes para que a questão humanitária seja mais debatida. “Não devemos esquecer os 25 milhões de pessoas que vivem lá, disse ele. “Apesar das discussões e engajamento da ONU, não estamos falando o suficiente sobre isso”.

Na visão de Jung, deve haver um objetivo comum entre as nações, que é levar o ditador ao banco dos réus. “Nos próximos dez anos, continuarei trabalhando para indiciar Kim Jong-un ao Tribunal Penal Internacional (TPI), como tenho feito nos últimos dez anos. Peço à comunidade internacional que apoie nossos esforços”, declarou.

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