ONU: Há ‘esperança para reduzir emissões’ de CO2, diz pesquisadora

Especialista foi uma das autoras de relatório da agência da ONU para o meio ambiente, divulgado no início do mês

Esta entrevista foi publicada originalmente no portal ONU News

Houve ligeira diminuição nas emissões de gás carbônico nos primeiros meses da pandemia, mas isso não significa um passo permanente na solução do aquecimento global.

A avaliação é da pesquisadora portuguesa Joana Portugal Pereira, professora em planejamento energético na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Pereira é coautora de Relatório de Lacunas das Emissões, lançado pelo Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente). A pesquisadora resumiu os pontos de sua pesquisa em conversa no último dia 9 com o portal de notícias da ONU.

ONU News: Depois de participar neste relatório sobre lacunas de emissões, qual a grande mensagem desta publicação para o mundo? 

Joana Portugal Pereira: O relatório deste ano, Emission Gap Report ou relatório que avalia as lacunas de emissões, este ano, pela primeira vez, é fruto do ano muito atípico que temos vindo a viver. Consolida várias análises que já foram apresentadas. Mostra que este ano, ao contrário de tendências anteriores, momentaneamente o mundo reduziu as suas emissões de gases de efeito estufa em aproximadamente 7% comparativamente com o ano anterior, 2019. 

A nossa avaliação mostra, porém, que essa redução momentânea e breve não é suficiente para mantermos a rota compatível com os compromissos climáticos do Acordo de Paris. Isto porque nós precisamos de ter metas ambiciosas de redução de emissões contínuas, coerentes e que sejam implementadas a uma escala global, regional e em todos os setores.  

Portanto, o relatório, este ano mais uma vez, mostra que mantendo a trajetória que temos vindo a seguir, que se coaduna com as políticas de mitigação que foram anunciadas, o mundo está no caminho para atingirmos um aquecimento global de aproximadamente mais 3º C até o final do século.  O que é claramente preocupante e claramente insuficiente para atingirmos um futuro que seja compatível com o que a ciência mostra que são níveis seguros de aquecimento global.  

ONU: Há “esperança para reduzir emissões” de CO2, diz pesquisadora
Geleiras no fiorde de Ilulissat, na Groenlândia, em imagem de março de 2014 (Foto: UN Photo/Mark Garten)

O relatório também mostra este ano, e no capítulo em que eu participei, nós fizemos uma avaliação muito detalhada e compreensível sobre os planos de recuperação econômica, que já têm vindo a ser anunciados por vários países, que rondam aproximadamente US$ 12,9 ou US$ 13 trilhões. Estes pacotes econômicos, infelizmente, a nossa análise mostra que aproximadamente apenas um quarto, são canalizados para atividades relacionadas com a economia verde e com tecnologias de baixo carbono.  

Ou seja, nós estamos aproximadamente a investir cerca de US$ 9 mil bilhões em tecnologias hipercarbônicas, pouco eficientes e que, de uma forma também gravíssima, poderão criar lock-ins energéticos e de infraestrutura para as próximas gerações. 

O relatório mostra e dá-nos uma mensagem de muita esperança: que ao invés de analisarmos estes pacotes e estímulos econômicos para indústrias e setores da economia hiper carbónicos, se os países adotassem saídas da pandemia e de recuperação verdes poderíamos reduzir as nossas emissões em aproximadamente 25%. Isso se traduz num nível de emissões em 2030 de aproximadamente 40 giga toneladas de CO2 equivalente, que nos levaria de uma forma tranquila, para cumprirmos as metas do Acordo de Paris até o final do ano. 

Como você analisa os achados sobre as emissões globais e suas tendências e sobre lacunas de emissões, capítulos 2 e 3 do relatório, que contaram com sua participação?

O capítulo 2 faz uma avaliação do perfil de emissões de gases de efeito estufa que temos no mundo e quais são as regiões mais responsáveis por essas mesmas emissões.

Com alguma incerteza associada, nós sabemos que em 2019 a emissão de gases de efeito estufa foram quase 60 giga toneladas de CO2 equivalente: 59.1 para ser mais preciso. E que aproximadamente 90% dessas emissões se devem à queima de combustíveis fósseis. As restantes estão associadas a atividades relacionadas com a mudança do uso do solo, ou seja o aumento crescente de desflorestamento que temos vindo a observar em algumas regiões do planeta, designadamente no Brasil, infelizmente.  

Quando comparamos as emissões numa plataforma regional sabemos que temos países que são os maiores poluidores: a China, os Estados Unidos, a Europa, a Índia, a Rússia e o Japão.  

E também não podemos descartar, e é talvez uma das grandes novidades deste relatório, as atividades associadas ao transporte pela aviação e por via marítima. Temos inclusive um capítulo detalhado para este tema. 

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