Depois de virar hino dos protestos, artista iraniano choca ao anunciar álbum autorizado pelo Estado

Lançamento do disco reacende debate sobre censura, autocensura e a pressão do governo sobre músicos iranianos

O cantor e compositor iraniano Shervin Hajipour, vencedor do Grammy por sua música ‘Baraye’, voltou ao centro do debate público após anunciar o lançamento de seu primeiro álbum autorizado pelo Estado. A decisão gerou polêmica nas redes sociais, especialmente entre apoiadores que veem o gesto como uma possível concessão ao governo iraniano. As informações são da Radio Free Europe.

A trajetória recente de Hajipour no cenário musical está diretamente ligada aos protestos de 2022 no Irã, desencadeados pela morte de Mahsa Amini. ‘Baraye’, composta a partir de mensagens publicadas por manifestantes, tornou-se o hino do movimento Mulher, Vida, Liberdade e rendeu ao artista o prêmio de Melhor Canção para Mudança Social no Grammy de 2023.

Após o sucesso, o cantor foi preso, condenado a mais de três anos de prisão e posteriormente perdoado, tornando-se um dos nomes mais simbólicos da resistência cultural iraniana.

Shervin Hajipour (Foto: WikiCommons)

O anúncio do novo álbum, intitulado ‘Vaqei’ e previsto para o fim de dezembro, foi feito no X, antigo Twitter. O artista afirmou que recebeu uma licença oficial das autoridades, permitindo que o trabalho seja lançado legalmente na República Islâmica. O disco está sendo distribuído pelo Instituto Cultural e Artístico Arad, responsável por viabilizar lançamentos musicais com autorização do governo.

A notícia foi suficiente para gerar críticas entre ativistas e parte da população, que questionam a decisão de Hajipour de seguir os trâmites oficiais do regime. Algumas mensagens afirmam que o músico estaria recuando de suas posições anteriores, já que ele próprio havia denunciado recentes restrições impostas pelas autoridades, como dificuldade para acessar shows, academias, alugar imóvel e exercer direitos civis.

Em resposta, Hajipour negou ter cedido a pressões políticas. Em postagem no X, ele afirmou que passou três anos impedido de trabalhar e que deseja continuar vivendo e produzindo música no Irã. Apesar da justificativa, as críticas continuaram, e artistas como Siavash Kamkar também se manifestaram, afirmando que o tratamento recebido pelo cantor seria diferente se ele fosse mulher. No Irã, artistas mulheres são proibidas de cantar solo em público desde 1979.

Outra parte da comunidade artística saiu em defesa de Hajipour, como a documentarista e ativista Mojgan Ilanlou, que disse considerar injustas as críticas direcionadas ao músico. Segundo ela, assim como profissionais de outras áreas precisam de autorização para exercer suas atividades, artistas também dependem de licenças oficiais, o que torna o processo inevitável para quem deseja continuar no país.

A pressão sobre músicos no Irã faz parte de um contexto mais amplo de restrições culturais. Gêneros como rap e rock são frequentemente censurados, e canções com críticas políticas são alvo de proibições e prisões. Mesmo assim, muitos artistas continuam publicando obras de forma independente em plataformas digitais.

O nome de Hajipour permanece associado ao movimento de 2022, e sua carreira segue marcada tanto pelo impacto social de suas músicas quanto pela tensão entre expressão artística e vigilância estatal. Apesar das controvérsias, veículos da mídia iraniana apontam que o novo álbum registra números elevados de pré-venda, sinalizando forte interesse do público.

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