BRICS testam moeda digital lastreada em ouro como alternativa ao dólar no comércio global

Protótipo chamado “Unit” busca reduzir a dependência do dólar e sinaliza avanço da desdolarização entre economias emergentes

Os países do BRICS deram um novo passo na busca por alternativas ao dólar no comércio internacional com o lançamento de um protótipo funcional de moeda digital lastreada em ouro. Batizada de “Unit”, a iniciativa foi apresentada como uma solução experimental para facilitar transações comerciais entre mercados emergentes sem o uso da moeda norte-americana, detalhou o Instituto de Estratégias Econômicas da Academia Russa de Ciências (IRIAS, da sigla em inglês). As informações são do site bne IntelliNews.

A Unit é um instrumento digital de negociação lastreado por uma cesta de reservas composta por 40% de ouro físico e 60% de moedas nacionais dos países do BRICS. A parcela cambial é dividida igualmente entre o real brasileiro, o yuan chinês, a rupia indiana, o rublo russo e o rand sul-africano. No projeto piloto, foram emitidas cem units, cada uma inicialmente equivalente a um grama de ouro.

Bandeiras dos cinco países fundadores do BRICS: Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul

A iniciativa surge em um contexto de crescente insatisfação do Sul Global com a hegemonia do dólar no sistema financeiro internacional. As sanções impostas à Rússia após a invasão da Ucrânia, especialmente as restrições relacionadas ao sistema SWIFT, aceleraram o debate sobre a vulnerabilidade de países altamente dependentes da moeda e da infraestrutura financeira controladas pelo Ocidente.

Nos últimos anos, diversos países passaram a adotar moedas nacionais em suas trocas comerciais. Rússia e China já realizam a maior parte do comércio bilateral em rublos e yuans, enquanto Índia e China também ampliaram o uso de moedas próprias. Na União Econômica Eurasiática (UEE, da sigla em inglês), um bloco econômico formado por Rússia, Armênia, Belarus, Cazaquistão e Quirguistão, a maior parte das transações ocorre fora do dólar. Ainda assim, desequilíbrios comerciais, como o déficit indiano em relação a Moscou no comércio de petróleo, mostram os limites desse modelo.

Dentro desse cenário, o BRICS também apresentou, anteriormente, a BRICS Pay, um sistema baseado em versões digitais das moedas nacionais, desenvolvido pelos próprios governos. A Unit, no entanto, vai além ao atrelar seu valor diretamente ao ouro, funcionando como uma referência comum para o comércio internacional entre os membros.

O valor da moeda foi projetado para variar diariamente conforme as oscilações das moedas que compõem a cesta em relação ao ouro. Em atualização recente, cada Unidade passou a corresponder a 0,9823 grama do metal, refletindo ajustes de mercado. Embora ainda esteja em fase experimental e não represente uma política oficial do bloco, o projeto é acompanhado de perto por bancos centrais e formuladores de políticas, especialmente em países do Sul Global e da África.

O objetivo central da iniciativa é permitir a liquidação de transações internacionais sem o uso do dólar, além de possibilitar que os países mantenham reservas de ouro dentro de suas próprias fronteiras. Com economias emergentes ampliando agressivamente suas compras de ouro nos últimos anos, a criação de um instrumento desse tipo pode simplificar negociações, reduzir riscos cambiais e aumentar a liquidez do mercado aurífero.

Apesar de ainda não ter sido formalmente adotada pelo BRICS como bloco, a Unit reflete o movimento de alguns países-membros em direção a uma nova arquitetura financeira internacional, menos dependente do dólar e mais alinhada aos interesses estratégicos das economias emergentes

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