Rebeldes do grupo M23, apoiados por Ruanda, tomaram o controle de Bukavu, uma das principais cidades do leste da República Democrática do Congo (RDC), informou o governo congolês no domingo (16). A ocupação ocorre em meio a uma ofensiva que tem expandido a influência do grupo na região, rica em minerais estratégicos. As informações são da Associated Press.
A Aliança do Rio Congo, coalizão de grupos armados que inclui o M23, declarou que a presença dos combatentes em Bukavu visa garantir a segurança da população, alegando que a cidade foi abandonada pelas forças governamentais.
“Nossas forças têm trabalhado para restaurar a segurança das pessoas e de suas propriedades, para a satisfação de toda a população”, disse Lawrence Kanyuka, porta-voz do grupo.

Moradores relataram que os soldados congoleses recuaram no sábado (15), permitindo a entrada dos rebeldes sem grande resistência. Milhares de civis também fugiram da cidade temendo confrontos.
Crise humanitária e apoio externo ao M23
O M23 é o mais forte entre os mais de 100 grupos armados que atuam no leste do Congo, disputando o controle de vastas reservas minerais, fundamentais para a produção global de tecnologia. Segundo um relatório de especialistas da ONU (Organização das Nações Unidas), os rebeldes recebem apoio de aproximadamente 4 mil soldados ruandeses.
Os conflitos na região já forçaram mais de seis milhões de pessoas a deixarem suas casas, tornando-se uma das maiores crises humanitárias do mundo.
Discurso de liderança rebelde e reação do governo
Em frente ao gabinete do governador de Kivu do Sul, Bernard Maheshe Byamungu, líder do M23 e sancionado pelo Conselho de Segurança da ONU por abusos de direitos humanos, discursou para moradores e classificou a situação anterior como um “caos” deixado pelo governo congolês.
“Vamos limpar a desordem deixada pelo antigo regime”, declarou Byamungu, enquanto parte da população pedia que os rebeldes avançassem até Kinshasa, a quase 1,6 mil quilômetros de distância.
O Ministério das Comunicações da RDC confirmou pela primeira vez, através das redes sociais, que Bukavu estava sob controle rebelde e afirmou que o governo está “fazendo todo o possível para restaurar a ordem e a integridade territorial”.
Temor de escalada regional
Diferente de 2012, quando o M23 ocupou temporariamente Goma e recuou após pressão internacional, analistas apontam que, desta vez, o grupo pode buscar influência política mais ampla.
O M23 afirma agir em defesa da minoria tutsi no Congo, enquanto Ruanda justifica seu envolvimento alegando que tutsis congoleses são perseguidos por milícias hutus, remanescentes do genocídio de 1994. O governo congolês nega essas alegações e acusa Ruanda de interferência direta no conflito.
Apesar da presença de tropas sul-africanas em Goma e burundesas em Bukavu, a resposta militar contra o avanço rebelde tem sido limitada. O presidente do Burundi, Evariste Ndayishimiye, sugeriu nas redes sociais que seu país não interviria diretamente.
O conflito dominou a agenda da cúpula da União Africana (UA) no último fim de semana, onde o secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou para o risco de uma escalada regional. Entretanto, a comunidade internacional tem adotado uma postura cautelosa, sem medidas concretas contra o M23 ou Ruanda, cujo exército é considerado um dos mais poderosos do continente.
Instabilidade histórica
O histórico de instabilidade na região remonta a conflitos anteriores, como a guerra de 1998, quando forças de países como Zimbábue e Angola intervieram para apoiar o então presidente congolês Laurent Kabila contra rebeldes apoiados por Ruanda e Uganda.
O atual impasse diplomático é agravado pelo fracasso das negociações de paz e pela presença de uma força de paz da ONU, cuja eficácia tem sido questionada pelo governo congolês. Para Mutiga, com Ruanda e RD Congo “traçando linhas vermelhas”, a diplomacia enfrenta desafios cada vez maiores.
Embora o governo congolês tenha saudado os esforços coletivos para pôr fim ao conflito, rejeitou a justificativa de Ruanda para o ressurgimento do M23. “A crise atual é, acima de tudo, um ataque à soberania e segurança da RD Congo, não uma questão étnica”, declarou o governo em nota oficial.