Somália prende militares acusados de ajudar o Al-Shabaab em ataque contra soldados

Ataque suicida matou ao menos 25 integrantes das forças armadas somalis, e um coronel foi preso acusado de traição

O governo da Somália anunciou na quarta-feira (26) a prisão de ao menos três oficias das forças armadas acusados de colaborar com o grupo terrorista Al-Shabaab. Eles teriam facilitado o acesso de um terrorista suicida a um campo de treinamento do exército, viabilizando assim um atentado que matou ao menos 25 soldados.

As informações quanto ao número preciso de vítimas fatais são desencontradas. Desde a explosão, a agência Reuters fala em 30 vítimas fatais, com base no depoimento de uma autoridade militar. Já o site somali Garowe e a rede Voice of America (VOA) noticiam 25 mortos.

No dia do ataque, um oficial do exército que pediu para ser identificado apenas como major Abdullahi confirmou “30 mortos e 73 feridos na explosão no campo de treinamento militar”. Ele afirmou ainda que nove soldados ficaram feridos com gravidade, o que poderia aumentar o número de vítimas fatais.

O atentado foi imediatamente reivindicado pelo Al-Shabaab, grupo terrorista mais atuante na Somália e que vem sendo alvo de uma grande campanha de contraterrorismo das forças armadas, com a colaboração inclusive dos Estados Unidos. Nas contas do governo local, ao menos três mil terroristas foram mortos na primeira fase de operações.

Traidores no exército

São antigas as suspeitas de que militares colaboram com os insurgentes, que invariavelmente realizam ataques dentro de instalações com segurança reforçada. Caso da Academia Militar Jaalle Siyaad, alvo da ação de segunda-feira, onde o terrorista suicida conseguiu se infiltrar e atingir dezenas de soldados que estavam enfileirados, tornando-se assim um alvo fácil.

Sheikh Adan Mohamed Nur, que preside a câmara baixa do Parlamento da Somália, levantou as suspeitas de traição publicamente, em vídeo divulgado através da internet após o ataque.

“Sei que entre os oficiais há pessoas boas, trabalhadoras e dignas. Mas os traidores facilitaram isso. Eu suspeito muito disso. É intolerável”, disse ele, atualmente servindo como presidente interino enquanto o presidente Hassan Sheikh Mohamud e o primeiro-ministro Hamza Abdi Barre estão fora do país.

Nur diz que emitiu ordens às forças de segurança para que abram uma investigação formal sobre os eventuais casos de traição. “Os criminosos que se escondem entre o exército e facilitam para o inimigo devem ser presos e levados à justiça. Quero uma resposta satisfatória”, afirmou.

De acordo com o capitão do exército somali Hussein Farah, que falou à Reuters, um dos três detidos é o coronel Abdullahi Dabow, um oficial de operações de infantaria que teria usado o automóvel pessoal para transportar o homem-bomba até o interior da academia militar.

Soldados do exército da Somália em treinamento, imagem de 2012 (Foto: Amisom/Flickr)
Por que isso importa?

O Al-Shabaab chegou a controlar Mogadíscio, a capital somali, até 2011, quando foi expulso de lá pelas forças da UA. Atualmente, controla territórios nas áreas rurais da Somália e luta para derrubar o governo nacional, tendo inclusive se expandido para a vizinha Etiópia e para outros países fronteiriços.

O grupo, que é vinculado à Al-Qaeda, concentra seus ataques no sul e no centro da Somália. As atividades envolvem ataques a órgãos e oficiais do governo e a entidades de ajuda humanitária, além de extorsão contra a população local e proteção de terroristas internacionais que se escondem no país.

Um levantamento feito pela ONU e divulgado em dezembro de 2022 aponta que 613 civis morreram no ano passado na Somália em ações terroristas. A maioria dessas pessoas, 315, foi vítima de dispositivos explosivos improvidas (IEDs, na sigla em inglês).

Os números, apresentados pelo Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), apontam, ainda, casos de vítimas civis atingidas pelas forças do governo, por milícias armadas aliadas às forças armadas somalis e por outros “atores não identificados”. As mais de 600 mortes representam um aumento de um terço em relação a 2021, maior número registrado no país desde 2017.

Devido ao crescimento do Al-Shabaab, o presidente Hassan Sheikh Mohamud iniciou, em agosto do ano passado, uma grande ofensiva contra os insurgentes. Na ocasião, ele comparou a facção a “uma cobra mortal” e disse que “não há solução a não ser matá-la, antes que ela mate você”.

Ao prometer confrontar os insurgentes, ele inclusive alertou a população para que não seja pega no fogo cruzado. “O Al-Shabaab será confrontado usando todos os métodos que a guerra permitir. Eles serão bombardeados, invadidos e submetidos a ataques aéreos. Então, fique longe deles”, disse Mohamud.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista. E, mais recentemente, em outubro de 2022, um associado ao EI, com nacionalidade brasileira e negócios no país, foi sancionado pelos EUA.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

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