Em junho de 2023, o brasileiro Fábio Samuel da Costa Oliveira foi preso no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, quando tentava embarcar em voo rumo à Turquia. O destino final planejado por ele era o continente africano, onde se juntaria a uma facção local do Estado Islâmico (EI). Preso desde então, foi julgado e condenado, em maio deste ano, a sete anos de prisão e cumpre pena na cidade de Três Corações (MG). Nos autos de um processo contra o jovem, aos quais A Referência teve acesso, consta que ele vinha recrutando ao menos um brasileiro para seguir o mesmo caminho e que planejava ataques contra uma igreja no estado de Minas Gerais e contra a diplomacia de Israel no Brasil.
Conversas que o jovem mantinha nos aplicativos de mensagem WhatsApp e Telegram foram usadas para embasar a acusação. Ele vinha mantendo contato com ao menos um cidadão brasileiro, à época menor de idade, ao qual chegou a encaminhar vídeos de combates entre o EI e Forças Armadas de nações africanas e do Paquistão. Compartilhou também vídeos de execuções sumárias praticadas pelos terroristas.
Os aplicativos serviam ainda para ele trocar informações com outros extremistas a respeito de armas, técnicas de luta e fabricação de explosivos improvisados. Em entrevista recente à Rede Record, o brasileiro confirmou ter usado material online disponibilizado pela organização terrorista para aprender combate corpo a corpo, manuseio de facas e produção de bombas caseiras. Um documento apresentado pelo repórter Roberto Cabrini revela que Fábio ajudava a recrutar seguidores não somente no Brasil, mas também em outros países de língua portuguesa, como Cabo Verde, Angola e Moçambique.
Já as informações dos autos processuais obtidas por A Referência indicam que o jovem chegou a planejar ataques em território brasileiro, intenção que igualmente manifestou através das plataformas de comunicação online. Um dos alvos seria uma igreja em Barbacena (MG), cidade onde vivia com a avó antes de ser preso. Outro, um consulado de Israel no país, embora não tenha dado maiores detalhes.
Um vídeo do jovem falando em inglês, citado no processo e exibido pela Rede Record, foi igualmente usado como prova para a condenação. Nele, Fábio destaca suas habilidades com facas, sua capacidade de realizar ataques pessoais em eventuais atentados e confirma o desejo de se juntar ao EI no exterior. O destino seria Moçambique, onde o EI protagoniza uma violenta insurreição sobretudo em Cabo Delgado.
O menor com quem Fábio vinha conversando também foi detido na oportunidade e, em seu depoimento, revelou que outro possível avo de ataques no país seria a embaixada de Israel em Brasília. Havia também a intenção de atacar uma representação diplomática dos EUA no Brasil em represália à prisão de Fábio, plano que não foi colocado em prática.
Terrorismo no Brasil
Casos mostram que o Brasil tornou-se um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al-Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista Veja mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista. E, mais recentemente, em outubro de 2022, um associado ao EI, com nacionalidade brasileira e negócios no país, foi sancionado pelos EUA.
Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras).
“O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”, avalia Soares. Saiba mais.