Com a segurança do Brasil questionada, PF exalta operação que levou à prisão de radicais islâmicos

Entidade rechaça uso político de ação antiterrorismo e destaca benefícios da cooperação internacional para prender os extremistas

Desde a semana passada, a Polícia Federal (PF) vem realizando um grande ação antiterrorismo batizada de Operação Trapiche. Até agora, três indivíduos foram presos acusados de ligação com o Hezbollah, organização radical libanesa considerada terrorista pelos EUA. No Brasil, o trio teria como objetivos recrutar seguidores e até realizar ataques terroristas contra entidades judaicas. A operação, entretanto, foi alvo de questionamentos devido à cooperação da inteligência internacional, sobretudo após o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, exaltar a contribuição de seu país. Também gerou um debate sobre a até que ponto o país está seguro contra o terrorismo.

No dia 8 de novembro, logo a após o anúncio das primeiras duas prisões pela PF, o premiê israelense divulgou uma nota destacando a participação de sua principal agência de inteligência nos atos que viabilizaram a Operação Trapiche.

“Os serviços de segurança brasileiros, juntamente com o Mossad e seus parceiros na comunidade de segurança israelense, juntamente com outras agências internacionais de segurança e fiscalização, frustraram um ataque terrorista no Brasil, que havia sido planejado pela organização terrorista Hezbollah, dirigida e financiada pelo regime do Irã. Esta era uma rede extensa que operava em outros países”, diz o texto.

Polícia Federal brasileira (Foto: divulgação)

A manifestação não foi bem recebida pelas autoridades brasileiras, que a tomaram como inoportuna. “Não cabe à PF analisar temas de política externa. Contudo, manifestações dessa natureza violam as boas práticas da cooperação internacional e podem trazer prejuízos a futuras ações nesse sentido”, disse a PF em comunicado.

No mesmo texto, a PF, que não havia revelado a colaboração israelense, destaca ainda que “se utiliza da cooperação internacional como instrumento para combater de maneira eficaz a criminalidade organizada transnacional e para preservar a segurança interna.”

De fato, a cooperação de agências estrangeiras não é novidade, sobretudo em casos de terrorismo. Informações fornecidas pela inteligência norte-americana, por exemplo, ajudaram a prender, durante os Jogos Olímpicos Rio 2016, há cerca de sete anos, um grupo de indivíduos acusados de ligação com o Estado Islâmico (EI) que planejavam ataques contra atletas israelenses durante o evento esportivo.

Para especialistas, a cooperação não pode ser condenada, desde que oportuna. “Nós estamos falando da soberania brasileira, mas os serviços de inteligência estrangeiros nos ajudam, na medida em que chegamos a uma resposta a essa tentativa terrorista de uma maneira muito mais eficiente e eficaz”, afirmou Rubens Beçak, professor da FDRP-USP, livre-docente em Teoria Geral do Estado pela USP e professor visitante da Universidade de Salamanca, na Espanha, no curso Master em Estudos Brasileiros.

Beçak vê a cooperação do Mossad no caso mais recente como um sucesso. “As informações que podem ter sido trazidas pela inteligência israelense são bem-vindas, principalmente, pela larga tradição que o país tem em investigações de contraterrorismo.”

Segurança questionada

A situação, entretanto, faz ressurgir o antigo temor quanto à fragilidade do sistema de combate ao terrorismo no Brasil. Embora o país jamais tenha sido alvo de um atentado conduzido por grupos radicais islâmicos, o risco atualmente é maior, como disse À Referência, na semana passada, Barbara Krysttal, gestora de políticas públicas e analista de inteligência antiterrorismo.

“O Brasil, nos últimos anos, tem sido mais vezes cogitado como possível alvo para ataques terroristas”, disse ela, destacando ainda o maior interesse das organizações extremistas no recrutamento de seguidores. “O Brasil recorrentemente, nos últimos dez, cinco anos, tem tido um aumento significativo de grupos terroristas assediando jovens e cooptando adultos jovens para fazer parte de ações terroristas no mundo todo”.

A situação levou a deputada Carla Zambelli (PL-SP) a apresentar um requerimento de informações ao ministro da Defesa, José Múcio, questionando até que ponto o governo brasileiro tinha conhecimento da presença de fundamentalistas islâmicos no país e como tem agido para garantir a segurança do país.

“O Brasil, como Estado soberano, tem o dever de proteger seus cidadãos e território contra ameaças internas e externas”, diz ela no documento. “Diante disso, a operação mencionada, voltada para a prevenção de atos de terrorismo em solo nacional, assume um papel crucial na salvaguarda de nossos valores democráticos, da paz e da estabilidade.”

No requerimento, ela também destaca a importância da cooperação com a inteligência estrangeira, “em um momento em que a colaboração e a troca de dados são essenciais para a eficácia das ações
de segurança”, ante ao objetivo de “proteger os cidadãos e bens nacionais.”

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