Uma severa crise de fornecimento de energia tem deixado residências no escuro e sem água na China, impactando duramente na produção industrial e, consequentemente, no crescimento econômico do país. O problema, que engloba questões ambientais e econômicas, tende a afetar inclusive as cadeias de fornecimento globais.
Apagões foram registrados nos últimos dias sobretudo no nordeste da China, com ao menos dez províncias forçadas a aderir a um programa de racionamento. De acordo com o governo, há registros de cortes abruptos de fornecimento nas províncias de Heilongjiang, Jilin e Liaoning. No Sul, Guangdong também foi afetada.
O questionamento entre os chineses é quanto à extensão do problema. Eles temem que seja indicativo de uma “lacuna doméstica potencialmente grande no fornecimento que possa levar a uma ‘crise de energia'”, diz o jornal estatal Global Times.
Há relatos de que a falta de energia durou três dias em determinadas áreas, afetando uma série de questões na rotina da população. As redes 3G chegaram a sair do ar, deixando celulares sem sinal; semáforos ficaram desligados, tumultuando o trânsito; o comércio em muitas regiões teve que operar à luz de velas, e há casos de pessoas presas em elevadores por longos períodos. Sem energia, o fornecimento de água também foi afetado.
Uma série de fatores levou à escassez “inesperada e sem precedentes”, segundo o periódico do Partido Comunista Chinês (PCC). A alta demanda de carvão pela indústria elevou o preço a níveis históricos e diminuiu o suprimento do produto. Paralelamente, há um endurecimento das normas ambientais no tocante à emissão de gases, com a China determinada a reduzir a produção de energia a partir de combustíveis fósseis.
O problema é que quase 60% da economia chinesa depende do carvão, cujo fornecimento foi afetado pela pandemia de Covid-19 e por um conflito comercial com a Austrália, grande fornecedora do produto.
Crescimento econômico
Para a indústria, o impacto é enorme. Num caso extremo, uma fábrica têxtil da província de Jiangsu foi alertada para que cortasse totalmente a energia num período entre setembro e outubro. Com isso, cerca de 500 trabalhadores tiveram que deixar seus postos e receberam um mês de folga remunerada. As entregas de pedidos, tanto para o mercado doméstico quanto para o exterior, foram reprogramadas.
Diante do cenário, o banco de investimentos Goldman Sachs projeta um crescimento econômico menor que o esperado na China, com queda na projeção deste ano de 8,2% para 7,8%. A estimativa é de que 44% da indústria chinesa tenha sido afetada pela escassez energética, segundo a rede britânica BBC.
Racionar ou tarifar?
Adam Ni, analista do China Neican, um think tank australiano, afirma que as autoridades locais tiveram que recorrer ao racionamento porque os preços da eletricidade são controlados na China. “Com o aumento dos preços dos insumos, mas com os preços fixos do serviço de fornecimento, a geração de eletricidade se tornou menos lucrativa. E pode até se tornar um empreendimento deficitário”, disse ele.
Ni cita a preocupação com o inverno, quando a demanda de energia aumenta sobretudo no frio nordeste chinês. E diz que o racionamento é uma estratégia do governo para reduzir a insatisfação popular. “Uma vez que o aumento dos preços da eletricidade pode levar a mais descontentamento social do que o racionamento, especialmente entre as famílias, as autoridades optaram por restringir a demanda por meio do racionamento”.