Médicos iranianos acusam chefe de Conselho de ocultar a causa da morte de Mahsa Amini

Jovem morreu após abordagem policial violenta, mas atestado de óbito sugere que não existe relação entre a morte e as agressões

Cerca de 800 médicos iranianos, todos membros do Conselho de Medicina do país, acusam o chefe do órgão, Mohammad Raeiszadeh, de servir ao governo central e assim ocultar a verdadeira causa da morte de Mahsa Amini, jovem que morreu após violenta abordagem policial por ter usado de forma incorreto o hijab, o véu muçulmano. As informações são da rede Radio Free Europe (RFE).

De acordo com os denunciantes, o Conselho legitimou a decisão do governo de encobrir a causa da morte da jovem, episódio que gerou uma onda de protestos populares que ganhou força ao longo do último mês e se espalhou por todo o território do Irã.

Segundo testemunhas, Amini foi levada para dentro de uma van e agredida por integrantes da chamada “polícia da moralidade“. Oficialmente, porém, o Conselho de Medicina atestou que a morte foi causada por uma doença, sem qualquer relação com as agressões. Os membros acusam o órgão e seu chefe de ignorar as “obrigações morais e sociais dos médicos de proteger as pessoas”.

A versão oficial foi contestada por Hossein Karampour, médico e principal autoridade da província de Hormozgan. Segundo ele, a mais provável causa da morte da jovem foi uma pancada na cabeça. Médicos que viram fotos de Amini internada afirmaram ainda que, embora não a tivessem examinado, o sangramento no ouvido exibido nas imagens realmente sugere que ela levou uma pancada na cabeça.

Mahsa Amini, jovem morta no Irã (Foto: reprodução/Twitter)
Por que isso importa?

Os protestos populares tomaram as ruas do Irã após a morte de Mahsa Amini, uma jovem de 22 anos que visitava Teerã, capital do país, quando foi abordada pela “polícia da moralidade” por não usar “corretamente” o hijab, o véu obrigatório para as mulheres. Sob custódia, ela desmaiou, entrou em coma e morreu três dias depois.

Os protestos começaram no Curdistão, província onde vivia Mahsa, e depois se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedidos pelo fim da república islâmica. As forças de segurança iranianas passaram a reprimir as manifestações de forma violenta, com relatos de dezenas de mortes.

No início de outubro, a ONG Human Rights Watch (HRW) publicou um relatório que classifica o regime iraniano como “corrupto e autocrático”, denunciando uma série de abusos cometidos pelas forças de segurança na repressão aos protestos populares.

De acordo com a ONG, em ao menos 13 cidades do Irã foram registrados casos de uso de força excessiva ou letal pelo governo. O relatório cita vídeos divulgados na internet que mostram agentes estatais usando rifles, espingardas e revólveres indiscriminadamente contra a multidão, “matando e ferindo centenas”.

Foram identificadas 47 pessoas que grupos de direitos humanos ou veículos de comunicação informaram ter morrido nos protestos. Entre elas, ao menos nove crianças e seis mulheres, sendo a maioria vítima de disparos de armas de fogo. Entretanto, a própria ONG admite que o número de mortos é provavelmente maior devido à subnotificação.

Além dos mortos e feridos, a ONG destaca os casos de “centenas de ativistas, jornalistas e defensores de direitos humanos” que, mesmo de fora dos protestos, acabaram presos pelas autoridades. E cita também o corte dos serviços de internet, com plataformas de mídia social bloqueadas em todo o país desde o dia 21 de setembro, por ordem do Conselho de Segurança Nacional do Irã.

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