Mianmar firma acordo nuclear com a Rússia e gera temor de que tenha fins militares

Oficialmente, país fala em gerar energia elétrica. Porém, analistas e ativistas sugerem que a finalidade do projeto pode ser outra

Um acordo firmado entre os governos de Rússia e Mianmar, para a construção de um reator nuclear no país asiático, tem gerado o temor de que a junta militar atualmente no poder venha a usar seu projeto atômico para fins militares. As informações são da rede Radio Free Asia.

O documento foi assinado em fórum econômico realizado entre 5 e 8 de setembro em Vladivostok, na Rússia. Oficialmente, ele prevê a construção de um reator de pequena escala no país asiático com os objetivos de gerar energia elétrica, realizar pesquisas científicas, produzir medicamentos e alimentar a indústria local.

“O roteiro fixa as etapas definidas para uma maior cooperação Rússia-Mianmar na esfera nuclear”, diz comunicado divulgado pelas nações, que projeta ainda a colaboração de Moscou com “treinamento de pessoal e trabalhos relacionados à melhoria da aceitação pública da energia nuclear em Mianmar”. 

Soldados de Mianmar durante desfile militar em Naipidau (Foto: Wikimedia Commons)

Por trás do objetivos divulgados oficialmente, entretanto, analistas e ativistas levantam a possibilidade de que o projeto nuclear venha a ser empregado com fins bélicos.

“Este acordo demonstra o objetivo de desenvolver armas nucleares”, disse Kaung Thu Win, ex-capitão do exército de Mianmar que se juntou aos opositores do regime. “Eles (os militares) tentarão desenvolver armas nucleares depois de usarem inicialmente a tecnologia para gerar eletricidade”.

Já Hla Kyaw Zawl, analista política baseada na China, diz que a geração de energia custaria menos se fosse feita através de recursos não nucleares. E que, devido aos elevados valores envolvidos, o acordo nuclear é absurdo, considerando a situação econômica caótica da nação asiática.

Assim, ela avalia que não se pode descartar a possibilidade de o projeto atômico ter uma finalidade militar oculta. “Vemos a tendência de países que não têm boas relações com as nações ocidentais e consideram a necessidade de ter armas nucleares para sobreviver”, afirmou Hla.

Por sua vez, Min Zaw Oo, diretor executivo do Instituto de Paz e Segurança de Mianmar, cita a questão da segurança regional. “Se eles avançarem, haverá mais preocupações entre os países da Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático)”, disse ele. “As preocupações não se limitariam ao fato de Mianmar possuir armas nucleares. Também haveria preocupações sobre a salvaguarda de um reator nuclear”.

Por que isso importa?

Em julho de 2021, uma autoridade russa admitiu que Moscou é o principal fornecedora de equipamento militar à junta que tomou o poder com o golpe de Estado de fevereiro do ano passado.

“Há uma estreita cooperação entre nós no fornecimento de produtos militares, incluindo aeronaves”, disse à época Alexander Mikheev, chefe da Rosoboronexport, empresa estatal russa de exportação de armamento.

Segundo ele, Mianmar é um dos principais clientes da empresa no sudeste asiático e parceiro-chave da Rostec, conglomerado russo aeroespacial e de defesa.

Aquela revelação gerou reações de ativistas pelos direitos humanos, que passaram a acusar Moscou de legitimar a junta em meio à violenta repressão que levou mais de mil pessoas à morte.

Min Aung Hlaing, general que atua como governante de fato de Mianmar, disse na ocasião que, “graças à Rússia, nosso exército se tornou um dos mais fortes da região” e que a amizade entre os dois países é “cada vez mais forte”.

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