Pelo menos 145 pessoas morreram sob custódia desde o golpe de Estado em Mianmar

Grupos de direitos humanos e analistas observam que muitas vítimas são membros do partido da presidente deposta e classificam tais mortes como "crimes de guerra"

Pelo menos 145 pessoas morreram durante interrogatórios conduzidos pelas autoridades birmanesas nos últimos 19 meses, período que corresponde ao golpe de Estado pela junta militar de Mianmar, orquestrado no dia 1º de fevereiro de 2021. A maioria perdeu a a vida por participar de protestos antigolpistas. As informações são da rede Radio Free Asia.

Segundo grupos de direitos humanos e do movimento de resistência autodenominado Governo de Unidade Nacional (NUG, na sigla em inglês) muitas das vítimas que morreram sob custódia eram membros do partido deposto NLD (Liga Nacional pela Democracia), da presidente democraticamente eleita Aung San Suu Kyi. As mortes dos dissidentes são classificadas como “crimes de guerra” por tais organizações.

Um dos grupos que está de acordo com a associação à prática desse tipo de violação do direito internacional pelos militares birmaneses é o Burma Human Rights Network, sediado no Reino Unido. O diretor executivo da entidade, Kyaw Win, comparou as mortes a “crimes cometidos por um governo fascista”.

“Matar alguém enquanto está detido é uma forma muito hedionda de assassinato. Esses tipos de casos são semelhantes aos crimes cometidos pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial”, disse ele.

Protesto em Mianmar pró-democracia e contra militares (Foto: WikiCommons)

Win diz que há evidências que atestam sua afirmação e que elas serão fornecidas a organizações para a construção de um caso levados ao tribunal internacional. “Os culpados serão punidos”, acrescentou.

Já o porta-voz do NUG, Kyaw Zaw, afirmou que o governo paralelo birmanês igualmente possui “provas sólidas” de que a junta militar é responsável por crimes de guerra.

“Todos os perpetradores em todos os níveis serão obrigados a assumir a responsabilidade, tenham eles emitido ordens ou cometido os crimes. A justiça será feita”, garantiu.

Um dos porta-vozes da junta militar, general Zaw Min Tun, declarou em entrevista em janeiro deste ano que não negava que tais mortes tivessem ocorrido durante o regime militar. No entanto, garantiu que as autoridades locais conduziam prisões e interrogatórios “de acordo com as normas internacionais”. 

“Incidentes de morte sob custódia são investigados como casos de homicídio culposo”, disse ele à RFA na época.

Segundo dados da Associação Tailandesa de Assistência a Presos Políticos (AAPP), as autoridades são responsáveis pelas mortes de pelo menos 2.332 civis e pela prisão de aproximadamente 16 mil desde o golpe do ano passado, baixas que ocorreram principalmente durante protestos pacíficos anti-junta. De acordo com a entidade, mais de 12,5 seguem no cárcere.

Por que isso importa?

Mianmar enfrenta “uma campanha de terror com força brutal”, segundo palavras da ONU (Organização das Nações Unidas). A repressão imposta pelo governo já causou a morte de ao menos 1,5 mil desde o golpe de 1º de fevereiro de 2021, que sucedeu as eleições presidenciais de novembro de 2020.

Na ocasião, o NLD venceu as eleições com 82% dos votos, ainda mais do que havia obtido no pleito de 2015. Em fevereiro, então, a junta militar, que já havia impedido o partido de assumir o poder antes, derrubou e prendeu a presidente eleita Aung San Suu Kyi.

O golpe deu início a protestos no país, respondidos com violência pelas forças de segurança nacionais. Cerca de 12 mil pessoas já foram presas, invariavelmente sem indiciamento ou julgamento prévio, e muitas famílias continuam à procura de parentes desaparecidos. Jornalistas e ativistas são atacados deliberadamente, e serviços de internet têm sido interrompidos.

No início de dezembro, tropas da junta militar foram acusadas de assassinar 11 pessoas em uma aldeia no noroeste do país. De acordo com uma testemunha, as vítimas, algumas delas adolescentes, teriam sido amarradas e queimadas na rua. Fotos e um vídeo chocantes que viralizaram nas redes sociais à época mostravam corpos carbonizados deitados em círculo no vilarejo de Done Taw, região de Sagaing.

A ação dos soldados seria uma retaliação a um ataque de rebeldes contra um comboio militar. Uma liderança local da oposição afirmou que os civis foram queimados vivos, evidenciando a brutalidade da repressão à população que tenta resistir ao golpe de Estado orquestrado em fevereiro deste ano.

Em meio à violenta repressão por parte do exército, alguns manifestantes fugiram para o exterior ou se juntaram a grupos armados em partes remotas do país. Conhecidos como Forças de Defesa do Povo, esses grupos estão amplamente alinhados com o governo civil deposto.

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