Sem vistos, EUA ameaçam interromper funcionamento da embaixada em Moscou

Decisão da Rússia de proibir seus cidadãos de trabalhar, aliada ao baixo número de vistos concedidos, inviabiliza funcionamento do prédio

Os Estados Unidos correm o risco de interromper a maioria dos procedimentos realizados na embaixada do país em Moscou, a não ser que o governo russo mude sua política e aceite fornecer uma maior quantidade de vistos para os diplomatas norte-americanos. O alerta foi feito na quarta-feira (27) por uma autoridade nacional, segundo o jornal independente The Moscow Times.

O primeiro serviço interrompido na embaixada foi o de fornecimento de vistos. Desde o início do mês, pessoas que necessitem do documento são aconselhadas a se deslocar até a embaixada norte-americana em Varsóvia, na Polônia, que fica a cerca de 1,2 mil quilômetros de Moscou.

“Precisamos progredir logo. Vamos enfrentar a situação. Não no mês que vem, mas em algum momento do ano que vem. É difícil mantermos algo além da presença de um zelador na embaixada”, disse um alto funcionário do Departamento de Estado.

Segundo a fonte, ficou difícil manter inclusive funções não burocráticas, tais como abrir e fechar os portões e operar os elevadores do edifício. Ainda assim, ele mantém a esperança de contornar a situação. “Faremos tudo o que for humanamente possível para manter essa missão aberta”.

Sem vistos, EUA ameaçam interromper serviços na embaixada do país em Moscou
Embaixada dos EUA em Moscou, foto de junho de 2008 (Foto: Wikimedia Commons)

Reciprocidade

A atuação diplomática dos EUA na Rússia sofreu um baque em agosto, quando Moscou proibiu as embaixadas no país de contratarem cidadãos russos ou de países terceiros. Assim, o governo norte-americano foi obrigado a demitir cerca de 200 cidadãos locais que empregava em suas missões diplomáticas russas.

Segundo Washington, falta reciprocidade na relação diplomática entre os dois países. Isso porque a Rússia considera cidadãos locais ao calcular o número de pessoas autorizadas a trabalhar nas missões. Os EUA, por sua vez, incluem na matemática apenas os cidadãos russos.

A diplomacia norte-americana já chegou a contar com 1,2 mil pessoas em atuação na Rússia, e hoje tem por volta de 120. Os russos têm 230 em solo norte-americano. “Eles têm uma presença muito maior aqui nos Estados Unidos do que nós na Rússia”, disse o funcionário.

Por que isso importa?

A tensão entre EUA e Rússia não se limita ao corpo diplomático. O desacerto é especialmente relevante em assuntos militares e de segurança digital. Um dos focos de atrito é a anexação da Crimeia pela Rússia, em 2014, bem como a suposta presença de militares e mercenários russos no conflito de Donbass, no leste da Ucrânia.

Em março de 2014, as autoridades da Crimeia realizaram um referendo sobre a “reunificação” da região com a Rússia, que teve aprovação superior a 90%. Após o referendo, considerado ilegal pela ONU (Organização das Nações Unidas), a Crimeia passou a se considerar território russo, adotando o rublo como moeda e mudando o código dos telefones.

A anexação é reprovada especialmente pela Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), e apenas nove países tratam a Crimeia como parte da Rússia: Zimbábue, Venezuela, Síria, Nicarágua, Sudão, Belarus, Armênia, Coreia do Norte e Bolívia. Para a comunidade internacional, trata-se de um território ucraniano sob ocupação russa.

O governo russo também é acusado de apoiar os separatistas ucranianos que enfrentam as forças de Kiev na região leste da Ucrânia desde abril de 2014. A situação levou a uma aproximação entre Kiev e Washington, contestada por Moscou e que ajudou a intensificar a tensão entre as duas superpotências.

O conflito armado no leste, que já matou mais de 13 mil pessoas, opõe o governo ucraniano às forças separatistas das autodeclaradas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, que juntas compõem a região de Donbass e têm suporte militar russo. Entre as demandas dos grupos pró-Moscou estão maior autonomia das duas repúblicas autoinstituídas, de maioria étnica russa.

Outro foco de atrito entre norte-americanos e russos é a segurança cibernética. Washington e seus aliados acusam Moscou de patrocinar grupos hackers responsáveis por ciberataques contra governos e empresas ocidentais, bem como de semear desinformação online para abalar democracias e direcionar resultados eleitorais.

Em julho, o presidente norte-americano Joe Biden chegou a cobrar explicitamente uma ação de Moscou durante conversa telefônica com o líder russo Vladimir Putin. A conversa, porém, não surtiu efeito, e os casos de ações digitais maliciosas realizadas por grupos de hackers ligados ao Kremlin tem aumentado.

Mais recentemente, a Rússia foi excluída de uma reunião virtual de combate a crimes digitais organizada pelos Estados Unidos. Trinta países foram convidados para o evento, e Moscou ficou de fora. Na pauta, tópicos como uso de criptomoedas no pagamento de resgates virtuais e a legislação global de combate a ações do tipo ransomware.

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