Jorge, um recruta cubano, acreditava que obter um passaporte russo seria o passaporte para uma vida melhor. Contudo, a decisão o levou à linha de frente de um dos conflitos mais brutais da atualidade: a guerra entre Rússia e Ucrânia. A história, relatada pelo site Politico, revela um sistema que usa a promessa de cidadania e altos salários para atrair estrangeiros ao combate, apenas para prendê-los no conflito indefinidamente.
Com a necessidade de reforçar suas tropas, Moscou tem recrutado estrangeiros de várias regiões, como Nepal, Gana, Síria e Sri Lanka. No caso de Cuba, o regime autoritário e as sanções norte-americanas transformaram a oferta russa em uma saída para muitos. “Agora, dizem que, por sermos cidadãos russos, precisamos continuar lutando até o fim da guerra”, relata Jorge, que está na região de Kursk. Seu depoimento, junto com outros casos semelhantes, ilustra como esses recrutas estão sendo usados como peças descartáveis.

Embora muitos tivessem a esperança de trabalhar em funções civis na Rússia, outros admitiram ter se alistado conscientemente devido às dificuldades financeiras.
A realidade, porém, foi cruel. Muitos cubanos tiveram seus passaportes confiscados pelas autoridades russas, ficando presos à guerra. David, cujo contrato de um ano acabou em julho, relata que seu documento foi retirado sob o pretexto de segurança. “Estão usando a cidadania para nos prender. Parece chantagem”, desabafou.
Desde o início da guerra em 2022, o presidente russo Vladimir Putin evitou uma segunda mobilização geral, preferindo atrair voluntários estrangeiros e oferecendo cidadania expressa. Enquanto isso, os mobilizados, nativos ou estrangeiros, permanecem na linha de frente por tempo indeterminado. Essa estratégia tem sido amplamente criticada por grupos de direitos humanos.
A relação entre Moscou e Havana também suscita questionamentos. Em 2023, após relatos sobre o recrutamento de cubanos, o governo de Miguel Díaz-Canel classificou os homens como “mercenários” e alegou punir os responsáveis. Apesar disso, o recrutamento continuou. Críticos do regime cubano apontam que a cooperação com Moscou é movida pela dependência de combustíveis e trigo russos, enquanto recrutas cubanos são usados como moeda de troca.
O impacto desse cenário é devastador. David, que sofreu ferimentos de estilhaços, confessou que as condições na linha de frente são desumanas. “Faço o que disse que nunca faria. É matar ou morrer, e tenho quatro filhos para sustentar”, afirmou. Enquanto isso, outros enfrentam traumas psicológicos e continuam sendo enviados ao front, muitas vezes antes mesmo de seus ferimentos cicatrizarem.
Para os cubanos, fugir tornou-se uma opção desesperada, mas arriscada. Carlos Estrada González, que tentou escapar, foi punido com seis dias sem comida em um buraco. Outros simplesmente desapareceram, como Denis Frank Pacheco Rubio, que morreu em combate apesar de seu contrato ter expirado meses antes.