A Marinha russa tem sido alvo preferencial dos ataques ucranianos na guerra, sobretudo a frota do Mar Negro encorada na Crimeia. Acumulando derrotas na região, anexada a seu território em 2014, Moscou vem gradualmente retirando de lá embarcações e pessoal, e nos últimos dias o governo ucraniano diz ter obtido novas vitórias que considera históricas.
No dia 15 de julho, Dmytro Pletenchuk, porta-voz da Marinha ucraniana, afirmou que a Rússia retirou da Crimeia seu último navio de patrulha, a fim de evitar que ele engrossasse as estatísticas de embarcações danificadas ou afundadas pelo inimigo. “Lembre-se deste dia”, disse através do Facebook o militar, relatando a suposta decisão russa que carece de verificação independente.
Dez dias depois, na última quarta-feira (25), ele afirmou que “não há mais um único navio de guerra russo no Mar de Azov”, que tem acesso ao Mar Nego através do Estreito de Kerch. De acordo com a revista Newsweek, se a informação for confirmada, a Ucrânia teria atingido parte da meta projetada em março por Pletenchuk, segundo quem o “objetivo final da Ucrânia é a ausência completa de navios militares da chamada Federação Russa nas regiões de Azov e do Mar Negro.”
Peter Dickinson, cientista político especializado em Ucrânia do think tank Atlantic Council, escreveu nesta semana que a “retirada dos navios de guerra russos da Crimeia é a mais recente indicação de que, contra todas as probabilidades, a Ucrânia está realmente vencendo a guerra no mar.”
Navios na mira, civis em fuga
Em maio, o mesmo Pletenchuk havia anunciado que um ataque ucraniano atingiu o que seria o último navio porta-mísseis russo na Crimeia. A embarcação seria o cruzador Zyklon, atingido dias depois de outro navio, o caça-minas Kovrovets, posicionado na mesma península. Em fevereiro, a Ucrânia relatou que até ali já havia afundado um terço da frota do Mar Negro da Rússia.
Embora esses números careçam de verificação independente, o presidente Vladimir Putin dá sinais de que o sucesso ucraniano é real, a ponto de ter anunciado em março a destituição do almirante Nikolai Yevmeno do comando da Marinha do país.
Quem ratificou o otimismo dos ucranianos foi o almirante Sir Tony Radakin, chefe do Estado-Maior de Defesa do Reino Unido. “No ano passado, vimos a Ucrânia, um país que mal tem uma Marinha, subjugar a Frota do Mar Negro russa por meio de uma combinação de drones e mísseis de longo alcance”, disse ele, conforme relato da Newsweek.
O suposto sucesso das Forças Armadas de Kiev também teria motivado a retirada de familiares de militares russos da Crimeia. A Newsweek também noticiou nesta semana que, de acordo com a inteligência ucraniana, muitos parentes de oficiais estacionados na península foram embora para “salvar suas vidas”, nas palavras de um porta-voz da Diretoria Principal de Inteligência (HUR, da sigla em ucraniano) de Kiev.
Os anúncios mais recentes, embora considerados históricos pela Ucrânia, não são inéditos. Os ataques constantes contra sua Marinha haviam forçado Moscou a iniciar ainda em 2023 a realocação de alguns de seus navios da Crimeia para outros portos. Em outubro, Aslan Bzhania, líder da região separatista da Abecásia, na Geórgia, revelou um acordo para receber parte da frota do Mar Negro.
Até agora, um momento marcante do sucesso de Kiev em seus ataques contra as embarcações russas foi o afundamento do Moskva, orgulho da frota russa, que veio a pique em abril de 2022. Embora Moscou insista em dizer que ele foi destruído por um incêndio no depósito de munições, serviços de inteligência ocidentais dizem que mísseis de cruzeiro disparados pelas forças ucranianas destruíram o navio.
A Ucrânia celebrou novamente o sucesso de uma operação contra a Marinha inimiga em setembro de 2023, quando um grande bombardeio atingiu uma base usada em Sebastopol, na Crimeia. Kiev alegou à época ter atingido ao menos um navio de desembarque e um submarino, além de um estaleiro onde os russos realizavam reparos em embarcações avariadas.
Daquela vez, diferente das negativas no caso do Moskva, o governo russo não escondeu que foi alvo de um duro ataque. Disse que a Ucrânia usou dez mísseis de cruzeiro, sete deles supostamente abatidos pelas forças de Moscou, e três drones, todos alegadamente neutralizados. Admitiu, no entanto, que duas embarcações foram atingidas, sem dar maiores detalhes.
De acordo com Dickinson, os ataques à Crimeira “se tornaram uma característica rotineira da guerra e são tidos como certos por todos os lados.” Ele acrescentou que, embora “a mídia do Kremlin minimize os ataques à Crimeia e ignore amplamente o naufrágio frequente de navios de guerra russos”, o faz apenas para evitar que o presidente Vladimir Putin seja “envergonhado”.