A ONG Anistia Internacional divulgou um relatório na segunda-feira (16) detalhando como autoridades sérvias estão utilizando tecnologia avançada de espionagem, como ferramentas forenses da empresa israelense Cellebrite e o spyware NoviSpy, para monitorar jornalistas, ativistas ambientais e críticos do governo de maneira ilegal. As informações constam do relatório Uma prisão digital: vigilância e supressão da sociedade civil na Sérvia.
De acordo com a investigação, as ferramentas da Cellebrite são empregadas para desbloquear dispositivos e extrair dados pessoais sem o consentimento dos proprietários, enquanto o NoviSpy é instalado em telefones durante detenções ou entrevistas policiais.
“Nossa investigação revela como as autoridades sérvias utilizam a tecnologia de vigilância como instrumento de controle estatal e repressão direcionada à sociedade civil”, afirmou Dinushika Dissanayake, diretora regional adjunta da Anistia Internacional para a Europa.

O spyware NoviSpy, embora menos sofisticado que ferramentas como o Pegasus, é capaz de acessar dados sensíveis, ativar remotamente microfones e câmeras e capturar comunicações privadas. Em casos analisados, foi usado para monitorar jornalistas e ativistas durante investigações conduzidas pela polícia e pela Agência de Informação de Segurança (BIA).
Entre os casos relatados está o de Slavisa Milanov, jornalista investigativo independente que teve seu celular desbloqueado ilegalmente enquanto estava detido pela polícia. Após sua liberação, ele suspeitou que seu dispositivo havia sido adulterado e solicitou uma análise forense à Anistia Internacional, que confirmou o uso das ferramentas da Cellebrite e a instalação do NoviSpy.
Outro caso envolveu o ativista ambiental Nikola Ristix, cujo telefone foi infectado durante um depoimento à BIA. Os dados coletados incluíram mensagens de aplicativos como WhatsApp e Signal, bem como capturas de tela de atividades nas redes sociais.
Impacto nas liberdades civis
A vigilância digital tem gerado um clima de medo e autocensura entre os alvos. “Estamos em uma prisão digital. Temos uma ilusão de liberdade, mas, na realidade, ela não existe”, afirmou Goran, um ativista monitorado que teve a identidade real preservada. Outro ativista, Aleksandar, cujo nome real também é mantido sob sigilo, relatou o impacto psicológico da invasão de privacidade: “Minha segurança pessoal foi completamente destruída, causando enorme ansiedade e isolamento.”
Em resposta ao relatório, a Cellebrite afirmou que sua tecnologia não é projetada para instalar malware nem realizar vigilância em tempo real. A empresa também declarou que está investigando as alegações e poderá romper relações com clientes que violem os termos de uso. Já a NSO Group, desenvolvedora do spyware Pegasus, afirmou não ter como confirmar se a Sérvia é cliente, mas reiterou seu compromisso com os direitos humanos.
A Anistia Internacional exige que as autoridades sérvias interrompam o uso de spyware invasivo e investiguem as violações relatadas. “Os responsáveis por essas práticas devem ser responsabilizados, e as vítimas, devidamente compensadas”, concluiu o relatório.
Nos últimos anos, a Sérvia tem intensificado repressões contra a liberdade de expressão, com campanhas de difamação contra ONGs e a mídia, além de prisões e assédio judicial a manifestantes pacíficos.