Ciberataques a navios e portos dobram custos e expõem vulnerabilidades do setor marítimo

Fraudes digitais, falsificação de GPS e resgates milionários colocam o transporte marítimo no centro da mira de hackers e gangues internacionais

Cerca de 80% do comércio mundial depende do transporte marítimo. Mas, cada vez mais, navios e portos têm se tornado alvos de ciberataques sofisticados que geram prejuízos milionários e colocam em risco a cadeia global de abastecimento. As informações são da rede BBC.

Segundo o escritório de advocacia comercial HFW, sediado em Londres, os custos para lidar com ataques cibernéticos no setor dobraram entre 2022 e 2023, alcançando uma média de US$ 550 mil. Em casos mais graves, quando especialistas não conseguem remover os hackers, o valor médio de resgates pagos chega a US$ 3,2 milhões.

(Foto: WikiCommons)

O advogado Henry Clack, da HFW, explica que muitas dessas ofensivas são comandadas por quadrilhas internacionais.

“Nos casos em que a HFW esteve envolvida, as contrapartes mais comuns que encontramos são organizações criminosas nigerianas altamente estruturadas”, afirma. “Nos últimos anos, elas foram responsáveis por diversas fraudes sofisticadas do tipo man-in-the-middle [um tipo de ataque cibernético em que o hacker intercepta e manipula a comunicação entre duas partes para roubar dados ou aplicar fraudes]”.

Esse tipo de golpe ocorre quando hackers interceptam comunicações, se passam por ambas as partes e roubam dados sensíveis ou assumem o controle de sistemas corporativos. Depois, exigem dinheiro para devolver as informações ou liberar os computadores invadidos.

Estados hostis

Para John Stawpert, gerente de comércio marítimo da Câmara Internacional de Navegação (ICS), a interconexão global do transporte marítimo o transforma em um dos principais alvos de ataques cibernéticos.

“A segurança cibernética é uma grande preocupação. O transporte marítimo já foi listado entre os 10 principais alvos de criminosos digitais em todo o mundo”, diz.

Um estudo da Universidade de Ciências Aplicadas NHL Stenden, da Holanda, mostra que os casos vêm crescendo rapidamente: de apenas 10 incidentes registrados em 2021, o número saltou para pelo menos 64 em 2023. Parte dessas ações foi atribuída a governos como os de Rússia, China, Coreia do Norte e Irã.

Da falsificação de GPS à vulnerabilidade digital

A digitalização acelerada da indústria também ampliou os riscos. Serviços como o satélite Starlink, de Elon Musk, aumentaram a conectividade dos navios, e, com isso, as chances de invasão.

Casos de falsificação de GPS (spoofing) já causaram acidentes. Em 2024, o navio porta-contêineres MSC Antonia encalhou no Mar Vermelho após suspeita de ataque ao sistema de navegação. No Mar Báltico, episódios semelhantes foram atribuídos a ações russas.

Além disso, sensores usados para monitorar emissões em navios também são portas de entrada potenciais para criminosos digitais.

Reforço das regras de segurança

Para reduzir os riscos, a Organização Marítima Internacional (OMI) passou a exigir, desde 2021, que embarcações incluam protocolos de cibersegurança em seus sistemas de gestão. A medida transformou recomendações em obrigações legais para armadores e operadores.

“Pessoalmente, acho que o setor está em uma boa posição para enfrentar a ameaça, certamente em comparação com seis ou sete anos atrás”, avalia Stawpert. “Há muito mais consciência sobre ataques cibernéticos, e essa tendência deve se intensificar nos próximos anos”.

Enquanto isso, nos bastidores das negociações, Henry Clack segue em uma tarefa ingrata: conversar diretamente com hackers. “Quando isso acontece, geralmente é em casos de ransomware. A comunicação se resume a mensagens online, curtas e secas, às vezes apenas uma frase por dia”.

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