Autoridade iraniana nega pena de morte, mas pede punição ‘severa’ a manifestantes

Governo vem respondendo com repressão e violência às manifestações após a morte de uma jovem por conta do uso incorreto do véu islâmico. Um manifestante foi condenado à morte no último domingo

Em meio à onda de manifestações populares no Irã após a morte de uma jovem de 22 anos que usava o hijab incorretamente, um assessor do parlamento iraniano culpou a mídia ocidental por comparar as prisões de manifestantes a sentenças de morte. Após oito semanas, já são milhares de detidos e centenas de mortos pelas forças de segurança, além de um condenado à pena de morte. As informações são da revista Newsweek.

Seyed Nizamuddin Mousavi, porta-voz da presidência do Parlamento, negou que os manifestantes estejam pagando com a pena capital, mas reiterou que eles precisam ser “tratados com severidade”. Estima-se que aproximadamente 16 mil pessoas tenham sido presas ao longo de 951 protestos realizados em 140 cidades.

Já o número de mortos entre os que participaram dos atos é de 348, sendo 52 das vítimas crianças, segundo um tuíte publicado na terça-feira (15) pela ONG de Direitos Humanos do Irã (IHRNGO).

Criança no cenário de destruição em meio aos protestos no Irã (Foto: reprodução/Twitter)

De acordo com uma notícia de 6 de novembro da Agência de Notícias da República Islâmica do Irã, um veículo estatal, por meio de uma declaração assinada por 227 membros do parlamento, foi solicitado ao judiciário para que lide “decisivamente com os incitadores dos recentes distúrbios”.

Mousavi rejeitou as alegações de que o parlamento defenda a aplicação de pena de morte aos manifestantes. Em declaração à agência local Tasnim News, ligada à Guarda Revolucionária Islâmica, ele disse que os parlamentares jamais mencionaram tal sentença e que os esforços se concentram na “vingança” contra aqueles que tiraram a vida de agentes do governo durante os confrontos.

“A retribuição é aplicada àqueles que tiraram a vida de outras pessoas. Não é aceitável que as pessoas matem as outras com armas e as abatam sob pretexto de protesto. Nenhum apaziguamento é aceitável para esses crimes”, disse Mousavi.

O porta-voz também comparou alguns manifestantes a rebeldes do Estado Islâmico (EI) que “atacaram a vida e a propriedade das pessoas com armas”. Autoridades iranianas dizem que mais de 40 agentes de segurança perderam a vida no tumulto iniciado em setembro.

Punição extrema

O Irã condenou o primeiro manifestante à morte no domingo (12), um indivíduo responsabilizado pelo incêndio de um prédio do governo, segundo a mídia estatal. Desde então, outras quatro pessoas foram igualmente sentenciadas. 

Segundo a IHRNGO, há relatos de pelo menos 20 manifestantes iranianos atualmente enfrentando acusações puníveis com a morte. A organização ainda fez o alerta “sobre a possibilidade de execuções precipitadas sem qualquer pré-aviso”.

Ouvido pela reportagem, Tarek Kteleh, membro da ONG Citizens for a Secure and Safe America (Cidadãos para uma América Segura e Protegida, em tradução literal), focada na segurança no Oriente Médio e no progresso democrático na Síria, relatos de execuções de manifestantes acabarão se concretizando.

“O regime linha-dura acabará por executar e possivelmente matar manifestantes, atirando neles nas ruas se eles começarem a sentir mais perigo para a continuidade do governo”, disse.

Kteleh acrescentou que é de fundamental importância que Washington e a comunidade internacional somem esforços e “coloquem mais pressão do que nunca para amarrar as mãos do regime iraniano”.

Diana Eltahawy, vice-diretora da Anistia Internacional (AI) para o Oriente Médio e Norte da África, se manifestou sobre o assunto. Ela instou as autoridades iranianas a anular imediatamente todas as sentenças de morte  e retirar todas as acusações contra os presos em conexão com sua participação pacífica em protestos. 

“A pena de morte é a punição mais cruel, desumana e degradante, e sua natureza abominável é agravada por julgamentos criminais fundamentalmente falhos, desprovidos de transparência ou independência”, disse ela. 

Por que isso importa?

Os protestos populares tomaram as ruas do Irã após a morte de Mahsa Amini, uma jovem de 22 anos que visitava Teerã, capital do país, quando foi abordada pela “polícia da moralidade” por não usar “corretamente” o hijab, o véu obrigatório para as mulheres. Sob custódia, ela desmaiou, entrou em coma e morreu três dias depois.

Os protestos começaram no Curdistão, província onde vivia Mahsa, e depois se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedidos pelo fim da república islâmica. As forças de segurança iranianas passaram a reprimir as manifestações de forma violenta, com relatos de dezenas de mortes.

No início de outubro, a ONG Human Rights Watch (HRW) publicou um relatório que classifica o regime iraniano como “corrupto e autocrático”, denunciando uma série de abusos cometidos pelas forças de segurança na repressão aos protestos populares.

De acordo com a ONG, em ao menos 13 cidades do Irã foram registrados casos de uso de força excessiva ou letal. O relatório cita vídeos divulgados na internet que mostram agentes estatais usando rifles, espingardas e revólveres indiscriminadamente contra a multidão, “matando e ferindo centenas”.

Além dos mortos e feridos, a ONG destaca os casos de “centenas de ativistas, jornalistas e defensores de direitos humanos” que, mesmo de fora dos protestos, acabaram presos pelas autoridades. E cita também o corte dos serviços de internet, com plataformas de mídia social bloqueadas em todo o país desde o dia 21 de setembro, por ordem do Conselho de Segurança Nacional do Irã.

Tags: