Israel não se responsabilizou por jornalistas que matou nos últimos 22 anos, diz ONG

Relatório examinou os casos de 20 jornalistas, 18 deles palestinos, que teriam sido mortos pelas forças israelenses desde 2001

Israel não assumiu nenhuma responsabilidade pelos 20 jornalistas mortos pelas suas forças armadas enquanto cobriam as atividades do exército nas últimas duas décadas, acusou o Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ) em um relatório divulgado na terça-feira (9). Do total, 18 dos profissionais de imprensa que perderam a vida eram palestinos. As informações são da rede CNN.

O relatório da ONG, intitulado ‘Padrão Mortal’, saiu pouco antes do aniversário de um ano da morte da jornalista da agência catari Al Jazeera Shireen Abu Akleh na Cisjordânia. Akleh, uma experiente jornalista de televisão familiarizada com reportagens nos Territórios Palestinos Ocupados, foi morta em 11 de maio de 2022, quando tentava relatar uma operação de prisão pelas forças de segurança israelenses e confrontos no campo de refugiados de Jenin.

“Nenhum membro da IDF [Forças de Defesa de Israel] foi responsabilizado pelas mortes de 20 jornalistas por fogo militar israelense nos últimos 22 anos”, acusou Robert Mahoney, ex jornalista da agência Reuters e que atualmente dirige projetos especiais para a organização sediada em Nova York.

Funeral da jornalista palestina Shireen Abu Akleh (Foto: Wikimedia Commons)

O grupo de defesa da imprensa disse ter documentado pelo menos 20 jornalistas mortos por fogo militar israelense desde 2001, acrescentando que 18 dos mortos eram palestinos. “As investigações de Israel sobre as mortes são lentas e não transparentes e muitas vezes ocorrem apenas sob pressão internacional”, acrescentou o relatório da CPJ.

A ONG detalhou no documento o que classificou como “sequência de rotina”, um padrão que ocorre quando um jornalista é morto nas mãos do IDF.

“Oficiais israelenses desconsideram evidências e alegações de testemunhas, muitas vezes parecendo inocentar os soldados pelos assassinatos enquanto as investigações ainda estão em andamento”, disse o CPJ, descrevendo o procedimento do IDF para examinar assassinatos militares de civis, como jornalistas, como uma “caixa preta”, com os resultados de tais apurações mantidos em sigilo.

O relatório também apontou que Gaza é o lugar mais perigoso para os jornalistas cobrirem as atividades das IDF, com 13 mortos, enquanto as sete mortes restantes ocorreram nas cidades de Ramallah, Nablus e Jenin, na Cisjordânia.

Nenhum dos jornalistas mortos nos últimos 22 anos era israelense e apenas dois eram jornalistas internacionais: Raffaele Ciriello, da Itália, baleado em 2002 em Ramallah e James Miller, do Reino Unido, baleado em Gaza em 2003.

“Quando as investigações acontecem, os militares israelenses geralmente levam meses ou anos para investigar assassinatos e as famílias dos jornalistas, em sua maioria palestinos, têm poucos recursos dentro de Israel para buscar justiça”, disse o CPJ.

O relatório insta as IDF para que mude seu procedimento em relação ao uso de fogo real no campo, bem como que sejam abertas investigações públicas no caso de fatalidades.

“Não há razão para que a primeira resposta de qualquer força de segurança ao lidar com civis e com jornalistas que estão com esses civis seja fogo real”, disse a ONG.

Impunidade

Apesar de Israel ter admitido pela primeira vez em setembro que havia uma “grande possibilidade” de suas forças armadas terem sido responsáveis pela morte de Shireen, a Procuradoria-Geral Militar disse em comunicado que não pretendia prosseguir com acusações criminais ou processos de qualquer um dos soldados envolvidos.

“Não há suspeita de infração penal que justifique a abertura de inquérito policial militar”, disse um comunicado à época.

Outras investigações realizadas sobre o ocorrido apontam um cenário diferente daquele do relatório israelense. Entre elas, uma do Escritório de Direitos Humanos da ONU (ACNUDH), cujo resultado foi divulgado em junho e que prontamente afastou a possibilidade de o disparo ter partido de um palestino.

A porta-voz do ACNUDH, Ravina Shamdasani, disse na ocasião que não havia evidência de atividade de palestinos armados nas proximidades de onde a jornalista foi morta. Segundo ela, Akleh e os colegas “procederam lentamente para tornar sua presença visível para as forças israelenses posicionadas na rua. Nossas descobertas indicam que nenhum aviso foi emitido e nenhum tiroteio estava ocorrendo naquele momento e naquele local”.

O CPJ pesquisa e analisa globalmente questões relacionadas à segurança de jornalistas, incluindo a manutenção de um índice global anual de impunidade que em 2022 listou a Somália com 19 assassinatos como o pior país em termos de responsabilidade quando se trata de mortes de jornalistas. Israel não foi classificado em sua lista dos 11 principais países problemáticos.

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