Irã testemunha prisões violentas com retorno das ‘patrulhas da moralidade’

Apesar de terem desaparecido durante os protestos "Mulher, Vida, Liberdade", força de segurança responsável por garantir a conformidade com o código de conduta islâmico parece ter ressurgido

Após um ano e meio desde o início dos protestos “Mulher, Vida, Liberdade”, a polícia no Irã voltou a empregar as “patrulhas morais” para impor as estritas regras de vestimenta islâmica. Estas patrulhas, compostas por homens e mulheres em uniforme, foram avistadas em Teerã e outras cidades, acompanhadas pelas conhecidas vans brancas que transportam mulheres detidas para as delegacias de polícia. As informações são da rede France24.

O líder supremo da República Islâmica, aiatolá Ali Khamenei, fez declarações firmes sobre o hijab em dois discursos recentes. Em 3 de abril, enfatizou que o véu é “uma obrigação religiosa e legal que todos devem seguir”. Uma semana depois, reiterou que embora “não queira impor a religião a ninguém”, o inconformismo “será combatido”.

Esses discursos parecem ter influenciado Ahmad-Reza Radan, chefe da polícia nacional iraniana. Conhecido por sua aplicação rigorosa das regras do hijab, Radan anunciou em 11 de abril que a polícia iria reprimir as mulheres que não fizerem uso dele. Ele afirmou que todas devem usar o véu “corretamente” e que a polícia aplicaria a lei que regula o uso da vestimenta dois dias depois.

Mahsa Amini, jovem morta no Irã (Foto: reprodução/Twitter)

Desde segunda-feira (15), relatos e vídeos amadores mostraram detenções violentas de mulheres em Teerã e outras cidades do Irã. As prisões foram feitas por policiais, homens e mulheres, e incluíram o uso de tasers. Mulheres também relataram casos de assédio sexual durante as detenções.

No mesmo dia, a jornalista Dina Ghalibaf escreveu no X, antigo Twitter, que foi detida por uma patrulha moral na estação de metrô Sadeghiyeh, em Teerã. Ela relatou ter sido submetida a choques elétricos e assédio sexual antes de ser levada para a detenção. Ghalibaf foi libertada, mas presa novamente em sua casa na terça (16), após compartilhar o incidente nas redes sociais.

Repressão

A vestimenta, véu obrigatório que cobre as cabeças das mulheres, é obrigatório no país desde 1981, dois anos após a Revolução Islâmica. Pela lei atual, mulheres que aparecerem em locais públicos sem o véu estão sujeitas a uma pena que varia entre dez dias e dois meses de prisão ou uma multa de até 500 mil riais (R$ 56,6).

Uma foto viral nas redes sociais mostra a polícia de Teerã, em 16 de abril, se preparando para uma “patrulha moral”. Vídeos amadores do mesmo incidente também circularam online, mostrando policiais masculinos e femininos, alguns usando coletes amarelos fluorescentes, ao lado de motocicletas e uma van branca. Em outro vídeo, uma mulher é vista sendo forçada a entrar na van por policiais.

As táticas usadas pela polícia no incidente em Teerã são semelhantes às da “polícia da moralidade” iraniana, conhecida como “Gasht-e-Ershad” em persa, que foi criticada após a morte de Mahsa Amini enquanto estava sob sua custódia em setembro de 2022.

O projeto de lei ainda prevê que as mulheres que se recusarem a usar o hijab perderiam o direito a serviços essenciais, como bancos e transporte público. Elas também correriam o risco de ter seus veículos pessoais apreendidos pelco Estado e seriam proibidas de viajar. Multas e penas de prisão seriam ainda mais duras, e funcionárias públicas teriam os salários reduzidos ou perderiam o emprego.

Levante

Foi o uso incorreto do hijab que levou à morte de Mahsa Amini em setembro do ano passado. A jovem de 22 anos visitava Teerã, capital do país, quando foi abordada pela polícia da moralidade por não seguir o código de vestimenta. Agredida sob custódia, ela desmaiou, entrou em coma e morreu três dias depois.

A morte da jovem deu início a um levante popular que coloca em risco a própria existência da República Islâmica, estabelecida com a Revolução de 1979. Manifestações populares começaram no Curdistão, província onde Mahsa vivia, e depois se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedindo o fim do regime.

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