Taleban veta mulheres no taekwondo, que levou Afeganistão a dois pódios olímpicos

Responsável pelo esporte afegão diz que Taleban vai permitir cerca de 400 modalidades, mas se recusou a falar sobre o esporte feminino

A proibição do esporte feminino já é uma realidade no Afeganistão controlado pelo Taleban. Embora o grupo extremista não tenha emitido uma nota oficial sobre o veto, ele se faz presente na rotina das atletas afegãs. Depois do críquete feminino, cuja proibição foi anunciada pelo vice-líder da comissão cultural do Taleban, Ahmadullah Wasiq, agora a repressão atinge outra modalidade muito popular no país: o taekwondo. As informações são da rede France 24.

O Afeganistão tem apenas duas medalhas olímpicas em sua história. São dois bronzes conquistados pelo atleta do taekwondo Rohullah Nikpai em Beijing 2008 e Londres 2012. As conquistas de Nikpai no masculino popularizaram o esporte no país, inclusive entre as mulheres. Porém, agora que o Taleban assumiu o poder, a prática deve se restringir aos homens.

“No esporte, quando perdemos, ficamos nos sentindo péssimas. E agora fomos derrotadas pelo Taleban”, disse Zarghunna Noori, que tem 22 anos e sonha defender a bandeira afegã nos Jogos Olímpicos. “Todas na seleção nacional de taekwondo sonhavam que um dia chegariam ao Jogos e hasteariam a nossa bandeira em outros países, em competições internacionais. Mas agora somos todas forçadas a ficar em casa, e ficamos mais deprimidas a cada dia”.

Zarghunna Noori, atleta do taekwondo que sonha defender o Afeganistão nos Jogos Olímpicos (Foto: reprodução/Facebook)

Na semana passada, o talibã Bashir Ahmad Rustamzai, que vai comandar o esporte afegão, disse que o governo permitiria cerca de 400 modalidades. Mas se recusou a falar especificamente sobre a questão do esporte feminino, embora os indícios apontem para a exclusão das mulheres, se não de todos, da maioria dos esportes.

Wasiq, quando falou em nome do governo sobre o tema, não se limitou ao críquete, outra modalidade popular no país. “É a era da mídia, e haverá fotos e vídeos, e então as pessoas assistirão. O Islã e o Emirado Islâmico [Afeganistão] não permitem que as mulheres joguem críquete ou pratiquem o tipo de esporte em que ficam expostas”.

Sem a perspectiva de retomar os treinos, Noori já admite a possibilidade de deixar o Afeganistão, a fim de evitar que “dez anos de trabalho duro sejam desperdiçados”. No momento, parece ser a única forma de manter vivo o sonho olímpico. “Ninguém que mora em seu próprio país quer deixá-lo. Mas as condições são tais que não vemos um terreno comum que nos permita progredir. Isso não existe no país”.

Música proibida

A repressão se estende à música, e nesse caso o extremismo talibã atinge tanto mulheres quanto homens. Embora não haja uma política oficial por parte do governo, os músicos afegãos já sabem que serão perseguidos, de acordo com a revista indiana Outlook. As apresentações de música ao vivo, por exemplo, estão formalmente proibidas.

“A situação atual é opressiva”, disse Muzafar Bakhsh, que tocava em casamentos e agora vem sendo obrigado a vender seus pertences para sobreviver. “Continuamos vendendo para não morrer de fome”, afirma ele, cujo avô era um ustad, maestro de música clássica afegã.

A extinta Orquestra de Mulheres Afegãs ‘Zohra’, ligada ao Instituto Nacional de Música do Afeganistão (Foto: World Economic Forum/Flickr)

Uma realidade dura para um país com forte tradição musical, influenciada pela música clássica iraniana e indiana. E que também tem uma próspera cena musical pop, com a adição de instrumentos eletrônicos e batidas de dança a ritmos mais tradicionais, algo que floresceu nos últimos 20 anos.

Questionado se o governo vai proibir a música em todo território nacional, o porta-voz talibã Bilal Karimi disse à Associated Press que ainda não há uma definição oficial. “No momento, está sob revisão. Quando uma decisão final for tomada, o Emirado Islâmico irá anunciá-la”.

Por que isso importa?

O governo interino instituído pelo Taleban é formado exclusivamente por homens que militavam no grupo e são, assim, tidos como leais ao movimento extremista. É um gabinete notadamente linha-dura e sem nenhuma mulher, contrariando a promessa prévia de que seria inclusivo.

Entre as imposições dos talibãs às mulheres que voltaram a viger no Afeganistão estão a proibição de saírem de casa desacompanhadas, o veto à educação em escolas e ao trabalho e inúmeros casos de mulheres solteiras ou viúvas forçadas a se casar com combatentes.

Para lembrar as afegãs de suas obrigações, os militantes ergueram cartazes em algumas áreas para informar os moradores sobre as regras. Em certas regiões, as lojas estão proibidas de vender mercadorias a mulheres desacompanhadas.

A repressão se estende à educação. O Taleban não só proibiu as mulheres de estudarem como fechou escolas no país. Em certas áreas, a educação foi permitida para meninas somente até a quarta série.

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