Uma confusão entre soldados de China e Índia armados com paus e pedras é o mais recente capítulo de um litígio de fronteira que já dura décadas. O embate mais recente, antes da morte de ao menos 20 recrutas da Índia no último dia 15, havia ocorrido em 1967.
Os dois países se reúnem nesta segunda (22) para mais uma rodada de negociações, informou o jornal indiano “The Hindustan Times“.
No dia 17, os chanceleres dos dois países conversaram por telefone e, segundo informe oficial da Índia, “a questão poderia ter um sério impacto no relacionamento bilateral. A necessidade do momento é a de que a China reacesse suas ações e tome medidas corretivas”.
Em uma pensata, o especialista Bruce Riedel, da Brookings Institution, vê o ocorrido como tendo “consequências fatais e um desfecho imprevisível”. O cenário é estratégico: ali, encontram-se Índia, China e Paquistão, todos potências nucleares.
Indianos e chineses, comandados por nomes fortes do nacionalismo local, agora voltam à disputa após a construção, por Nova Délhi, de uma estrada na fronteira. Com o conflito recente, aponta Riedel, “o primeiro-ministro indiano Narendra Modi agora parece perdedor, imagem na qual ele não se sente confortável”.
Em um distante 1962, os dois países chegaram a entrar em guerra pela região. Ali, como hoje, o exército indiano leva desvantagem. Naquela época, o então premiê indiano Jawaharlal Nehru teve de pedir ajuda aos EUA, então governado com John F. Kennedy, e ao Reino Unido.
Para Riedel, “uma operação global começou para ajudar a Índia. Não foi suficiente.” O exército indiano investigou as causas da derrota, em um relatório secreto liberado ao público em 2014.
Passado recente
A ofensiva começou quando as tropas de Mao Tsé-tung cruzaram a fronteira em litígio, no estado de Ladakh, entre outubro e novembro de 1962. Nehru pede mais jatos e homens para um contra-ataque, e, antes que as tropas JFK pudessem chegar, Mao retirou seus homens da região – mas não de Ladakh.
A derrota indiana também representava uma oportunidade para o Paquistão, interessado em aumentar sua presença na região da Caxemira. Temendo os americanos, o governo paquistanês não atacou.
“Claro, Kennedy lidou com a crise no sul da Ásia ao mesmo tempo em que lidava com a crise dos mísseis em Cuba e a muito real ameaça de uma guerra nuclear com a União Soviética. Multitasking em sua melhor forma”, afirma Riedel.
A diferença é que, hoje, o relacionamento bilateral China-Paquistão é muito mais próximo que nos anos 1960. Há múltiplos investimentos de Beijing no território do rival indiano, hoje acompanhando com atenção os desdobramentos na cobiçada fronteira.
Para o especialista do CFR, os eventos daquela época ainda estão presentes na memória dos políticos da região. Porém, “todos os players sabem que devem evitar o pior”. E, hoje, as potências ocidentais podem não oferecer o mesmo tipo de cooperação dispensada aos indianos nos anos 1960.