ONU aponta expansão de nova modalidade de tráfico em países de língua portuguesa

Apreensão de 98 toneladas de cocaína revela técnica de ocultamento usada por traficantes, que têm no Brasil uma parte crucial de sua rota

Uma grande operação envolvendo policiais, autoridades de alfândega e agências de 58 países resultou na apreensão de 98 toneladas de cocaína. Entre os países de língua portuguesa, Portugal e Brasil integram a lista de nações envolvidas. Ao todo, foram 158 apreensões de substâncias ilícitas e 43 prisões entre novembro e dezembro de 2022.

De acordo com o Escritório da ONU sobre Drogas e Crime (UNODC), que participou da operação, os grupos criminosos estão ocultando a cocaína e outras substâncias dentro de contêineres que transportam substâncias lícitas.

Para montar o esquema, traficantes ameaçam e exploram funcionários da cadeia de transporte de suprimentos para se valer de uma carga legítima e usá-la de ponta a ponta.

Esse modus operandi foi observado em 107 dos casos envolvendo contêineres durante a operação. Ao desvelar este método de ocultamento, os agentes da lei apreenderam 62 toneladas de cocaína.

Segundo o UNODC, o sucesso da operação pode ser atribuído à colaboração com a indústria naval e ao uso de novas ferramentas de visualização de dados e tecnologias de inspeção. No relatório global sobre cocapina, lançado em março, foi registrado um aumento de 35% na produção, o maior desde 2016.

Drogas apreendidas pela UNODC na África, em 2015 (Foto: Divulgação/UNODC)
Tendências em Cabo Verde e Guiné-Bissau

De acordo com a chefe da seção de pesquisa sobre drogas do UNODC, Chloe Carpentier, o cultivo é concentrado em apenas três países sul-americanos: Colômbia, Bolívia e Peru. Todos eles têm fronteira com o Brasil, fazendo com que o país tenha um papel chave no transporte da droga.

Os produtores visam especialmente o mercado europeu, o segundo maior do mundo. Carpentier afirma que os grupos que traficam a cocaína usam rotas na África para chegar à Europa.

Ela avalia que, desde 2019, o fluxo da droga que passa pelo continente africano tem aumentado bastante em comparação com anos anteriores. A pesquisadora destacou como os países lusófonos na costa ocidental da África integram esta rota.

“Houve um aumento, saindo do Brasil, da zona de Recife e Natal, deste tipo de embarcação, que tem cocaína a bordo e trafica para a Europa através da África do oeste, em particular de Cabo Verde. Na Guiné-Bissau também. O país tinha um papel enorme nos anos 2005, 2007, depois baixou, mas agora temos também apreensões muito largas.”

A pesquisadora do Unodc indicou que as quantidades de cocaína apreendidas nos dois países nos últimos anos ultrapassam dez toneladas.

Moçambique e Angola na rota que sai do Brasil

Segundo ela, Moçambique e Angola também integram a rota da droga que parte do Brasil. O uso das vias marítimas está em expansão. Para Carpentier, o transporte via contêineres é parte da estratégia dos grupos criminosos que atuam nos países de língua portuguesa.

“Em Moçambique, o tráfico de cocaína e a ligação com o Brasil não é recente. Desde o início dos anos 2000 já se registrava, principalmente pelo ar, mas vimos que agora está se expandindo pela via marítima com uso muito grande de cargas. Em Angola, o tráfico está aumentando pela via marítima, em embarcações que tem contêiner, pois nelas se pode traficar grandes quantidades. É um tráfico de trânsito rumo a mercados lucrativos e em expansão da Europa do oeste, mas uma parte fica no país de trânsito”, disse a funcionária da ONU

O UNODC possui um programa de controle de contêineres (CCP) que atua na luta contra o comércio de substância ilícitas contidas em cargas transportadas via contêineres.

Com base na operação bem-sucedida, as agências alfandegárias envolvidas estão atualizando seus critérios de seleção de cargas e se preparando para lidar com as novas tendências de tráfico identificadas.  

Conteúdo adaptado do material publicado originalmente pela ONU News

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