No Tibete, China derruba monastério do século 19 para construir uma hidrelétrica

Decisão se enquadra no cenário de repressão imposta por Beijing na região, inclusive no aspecto religioso, com os budistas na mira

Um monastério budista construído no século 19, no Tibete, foi destruído pelo governo da China, que no lugar iniciou as obras de uma hidrelétrica. Três fontes com conhecimento da situação, que pediram anonimato devido à sensibilidade da questão, confirmaram a informação, divulgada com exclusividade pela rede Radio Free Asia (RFA).

Uma das fontes apresentou um vídeo, que aparece abaixo, para confirmar a alegação. As imagens mostram que nada sobrou do Monastério Atsok Gon Dechen Choekhorling, localizado no condado de Dragkar. A expectativa é a de que em breve toda a região fique submersa, tão logo sejam concluídas as obras da barragem da usina hidrelétrica de Yangqu, a maior do mundo imprensa em 3D.

As ações em Dragkar se inserem no que alguns especialistas chamam de “genocídio cultural” por parte de Beijing contra o Tibete. Tenzin Lekshay, porta-voz da Administração Central Tibetana, afirmou em novembro que Beijing está “desesperada” para criar uma imagem do Tibete com características chinesas que são desconhecidas pelo resto do mundo, buscando legitimar sua reivindicação sobre a região.

No Tibete, em particular, as autoridades chinesas limitam as atividades políticas e restringem a expressão pacífica de sua identidade cultural e religiosa. Os tibetanos frequentemente relatam discriminação e violações dos direitos humanos, alegando que essas políticas visam suprimir sua identidade nacional e cultural.

A questão religiosa é parte desse processo, dentro do que o presidente Xi Jinping chama de “sinicização” da fé”. Em dezembro de 2021, ele disse que pretende “manter o trabalho religiosos na direção essencial do partido” e “direcionar nosso país para a sinicização da religião.” Ainda segundo ele, é preciso “pegar o grande número de crentes religiosos e uni-los em torno do partido e do governo.” Os budistas são protagonistas nesse processo, bem como os uigures de Xinjiang.

Os monges são igualmente atingidos por essa repressão. Com a destruição do monastério, os religiosos que o ocupavam, cerca de 160, agora vivem em cabanas improvisadas, conforme o governo não cumpre a promessa de realocá-los para moradias melhor estruturadas nas proximidades.

Monastério Drepung, em Lhasa, Tibete (Foto: Birger Hoppe/Flickr)

Considerado sagrado pelos fiéis, o templo tende a ser reconstruído, algo que levará de dois a três anos para acontecer, isso se realmente o projeto seguir adiante. Para o governo chinês, não há qualquer perda histórica, sob o argumento de que o monastério não tem “nenhum valor ou importância significativa”.

A obra , entretanto, está travada. “Apenas algumas dezenas de milhares de yuans chineses foram alocados para a reconstrução, sem fundos adicionais planejados”, disse uma das fontes sobre o dinheiro necessário para reerguer o monastério em outra localização. A mesma pessoa disse que a população está proibida de fazer fotos e vídeos do local, para esconder a destruição.

De acordo com Lu Gang, secretário do Comitê Estadual do Partido da Prefeitura Autônoma Tibetana de Tsolho, o mais importante é a obra de infraestrutura, tratada com prioritário pelo Partido Comunista Chinês (PCC), que pretende inserir a hidrelétrica no plano mais amplo da “indústria nacional de energia limpa”.

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