Dezenas de soldados são mortos em suposto ataque jihadista em Burkina Faso

Soldados teriam conseguido reagir e dizem ter matado cerca de 40 "terroristas", segundo comunicado do exército

A onda de violência em Burkina Faso fez dezenas de novas vítimas na quinta-feira (27). Dessa vez, um ataque contra um destacamento das forças armadas deixou 33 militares mortos e 12 feridos no leste do país africano, de acordo com a agência Al Jazeera.

Cercados pelos agressores, os soldados teriam conseguido reagir e alegam ter matado cerca de 40 “terroristas”, segundo um comunicado divulgado pelas forças armadas.

O episódio ocorreu na cidade de Ougarou, província de Gnagna, no leste do país, e não está claro quem realizou o ataque, embora o governo trate o caso como como terrorismo.

O ataque aos militares acontece após um controverso episódio que gerou reações internacionais, inclusive da ONU (Organização das Nações Unidas). Na semana passada, homens com uniformes do exército atacaram uma aldeia no norte de Burkina Faso e deixaram cerca de 150 mortos.

Inicialmente, levantou-se a possibilidade de que fossem extremistas disfarçados. Depois, porém, testemunhas apontaram o dedo para os militares, que teriam atacado civis acusados de dar abrigo a membros de uma facção da Al-Qaeda, o Grupo de Apoio ao Islã e aos Muçulmanos (GSIM), na sigla em francês), também conhecido pelo nome em árabe Jamaat Nasr al-Islam wal Muslimin (JNIM).

Os soldados teriam contado com a ajuda de uma milícia civil armada ligada ao governo burquinense, a Voluntários para a Defesa da Pátria (VDP). Na ocasião, o grupo paramilitar buscava vingança após perder cerca de 30 homens em um ação dos insurgentes dias antes.

Soldados das forças de Burkina Faso durante exercício militar (Foto: WikiCommons)
Por que isso importa?

Burkina Faso convive desde 2015 com a violência de facções da Al-Qaeda e do EI, insurgência que levou a um conflito com as forças de segurança e matou milhares de pessoas. Grupos armados lançam ataques ao exército e a civis, desafiando também a presença de tropas estrangeiras.

Os ataques costumavam se concentrar no norte e no leste, mas agora estão se alastrando por todo o país, com cerca de 40% do território nacional fora do controle do governo central. Burkina Faso superou Mali e Níger como epicentro da violência jihadista na região.

pior ataque extremista já registrado em Burkina Faso ocorreu em 5 de junho de 2021, quando insurgentes incendiaram casas e atiraram em civis ao invadirem a vila de Solhan, no norte. Na ocasião, 160 pessoas morreram.

Após um período de relativa calmaria, a violência aumentou no último ano após a tomada do poder no país por uma junta militar em janeiro de 2022. Oficiais descontentes derrubaram o presidente eleito Roch Marc Christian Kabore, que vinha enfrentando protestos pela forma como lidou com a sangrenta insurgência jihadista. Mais tarde, em setembro, um segundo golpe levou a nova mudança no poder, com Traoré assumindo o governo central. A instabilidade só faz crescer o problema da insurgência.

Para especialistas, os extremistas decidiram aproveitar a divisão pública no país. “Os novos ataques sinalizam uma onda crescente de militância no norte de Burkina Faso e levantam preocupações sobre o alcance crescente de grupos terroristas que, sem dúvida, estão dificultando ainda mais o trabalho da junta de proteger o país”, disse Laith Alkhouri, CEO da Intelonyx Intelligence Advisory, uma empresa que realiza análises no setor de inteligência.

A situação tornou ainda mais delicada em 2023, após a França acatar um pedido do governo central burquinense e retirar suas tropas da nação africana. Paris mantinha entre 200 e 400 membros de suas forças especiais por lá, parte da Operação Barkhane de combate ao extremismo no Sahel.

A violência descontrolada gerou uma crise humanitária que forçou mais de dois milhões de pessoas a fugir de suas casas, com milhares de mortes ligadas ao conflito. Estima-se que quase cinco milhões de pessoas sofram de insegurança alimentar em Burkina Faso, três milhões delas no estágio agudo.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al-Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista Veja mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem seguidores do EI foram presos e dois fugiram.

Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras).

Ele acrescenta: “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

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