O jacarandá é a forma de flora ou fauna mais traficada no mundo, de acordo com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. No último relatório do órgão, que considera dados recolhidos entre 2014 e 2018, o jacarandá respondia por 31,7% das apreensões mundiais, contra 30,6% de partes de elefantes. E nenhum país exporta tanto esse tipo de madeira quanto a Nigéria, a ponto de ela estar ameaçada de extinção no Estado nigeriano de Taraba. A informação foi divulgada inicialmente pelo jornal Daily Trust e confirmada pela reportagem d’A Referência.
De acordo com Kerstin Canby, diretora de política florestal, comércio e iniciativa financeira da ONG Forest Trends, o risco de extinção é iminente, embora não seja possível fazer uma projeção de tempo. Segundo ela, faltam dados. “Não temos conhecimento de nenhum inventário oficial recente de jacarandá nas florestas de Taraba”, disse ela À Referência. Questionada se o risco de extinção é real, foi incisiva: “Sim. Absolutamente”.
O relatório da ONU (Organização das Nações Unidas) reforça a ameaça de desaparecimento da espécie. “A demanda por madeira de lei tropical cresceu muito nas últimas duas décadas. E, onde o comércio associado a essa demanda não é bem regulamentado, pode ser incompatível com a sobrevivência dessas espécies e das florestas que as contêm”.
O principal destino da madeira nigeriana é o mercado estrangeiro. Em 2018, as importações globais de toras de madeira tropical totalizaram 18 milhões de metros cúbicos, que representam mais de US$ 3 bilhões. A China é de longe o destino preferencial, respondendo por 82% do volume total de importações da commodity. E o problema pode ser ainda pior, porque mesmo os dados coletados pela ONU podem ser imprecisos. “Falta transparência”, resume Canby.
Na Nigéria, a ação da China não se limita à importação. Muitos chineses se instalaram em Taraba para atuar também na extração. Eles contam com o suporte de moradores locais, que conhecem bem a região, para localizar as áreas com maior concentração de jacarandás. O lucro é milionário, e o retorno do investimento é rápido.
Rabiu Maihula, que atua na extração de jacarandá em Taraba, conta que o negócio é bastante lucrativo. “Eu ganhei meu primeiro milhão de nairas (cerca de R$ 12 mil) com as receitas do comércio jacarandá e continuei a ganhar mais dinheiro até o surto do Covid-19, quando os portos e estradas para Lagos fecharam e os comerciantes estrangeiros não puderam se mover”, disse ele ao Daily Trust.
Repressão governamental
Embora discretamente, o governo nigeriano tem se movimentado na tentativa de coibir a exploração do jacarandá. Segundo a Forest Trends, existe uma iniciativa promissora do Estado de Ekiti. Por ora, ela consiste apenas em documentar o processo de exploração, mas é possível que na esteira seja adotada alguma ação prática. Se isso ocorrer, o passo seguinte seria expandir o projeto para outras regiões da Nigéria.
E Canby considera a possibilidade viável. “O governador de Ekiti é o presidente do Fórum de Governadores da Nigéria. Portanto, há oportunidade de que o Estado de Ekiti possa liderar os outros estados da Nigéria”.
Por que isso importa?
A Nigéria já é o maior centro de exportação de madeira ilegal da África, segundo a organização NHRC (Comunidade de Direitos Humanos da Nigéria). “As atividades de cartéis ligados a esses países destroem de 350 mil a 400 mil hectares por ano”, disse o porta-voz do órgão Taiwo Adeleye.
Só em 2005, cerca de 11 mil hectares de floresta foram desmatados no país africano. Entre 1990 e 2000, o país havia perdido 406,7 mil hectares, cerca de 35,7% de todo seu componente florestal. Desde então, os governos estaduais da Nigéria reivindicaram 96,5 mil quilômetros quadrados de terra como área florestal reservada.
Ao conquistar a independência, em 1960, a Nigéria possuía oito parques nacionais e 445 reservas nacionais. Hoje, mais da metade das unidades de conservação ou não está mais sob o apelo legal ou foi destruída.