ONG denuncia violação de direitos humanos no Congo

De acordo com a HRW, houve prisões e mortes por parte do governo movidas por interesses políticos

O governo da República Democrática do Congo tem utilizado a pandemia do novo coronavírus para desrespeitar os direitos humanos. Há relatos de prisões, agressões e mortes no país, segundo denúncia do grupo de direitos humanos HRW (Human Rights Watch).

Advogados, jornalistas e ativistas foram as principais vítimas dos abusos. Desde janeiro, a HRW documentou pelo menos 39 casos de ameaças e assédio relacionados à liberdade de expressão e de imprensa em metade das 26 províncias do país.

ONG denuncia violação de direitos humanos no Congo
Mulher pede fim de conflitos na República Democrática do Congo (Foto: Eskinder Debebe/UN Photo)

Foram contabilizadas 17 prisões. Destas, duas pessoas ainda estão encarceradas. Dos 19 jornalistas assediados, oito foram presos. Quem criticava o governo sofreu intimidações, ameaças, espancamentos, prisões e até processos judiciais. 

Rápida dissipação

De acordo com Thomas Fessy, pesquisador sênior de Congo na Human Rights Watch, “os ganhos em direitos humanos do primeiro ano de mandato do presidente Felix Tshisekedi parecem estar se dissipando rápido”. 

Fessy defende que o governo deva reconhecer a incoerência dos ataques a jornalistas como prática antidemocrática. “A menos que Tshisekedi pare de recorrer às ferramentas de repressão de seu antecessor, suas garantias de respeito pelos direitos humanos não serão nada além de promessas vazias”, afirma.

O ministro dos Direitos Humanos congolês, André Lite, condenou os abusos. “Mesmo que o presidente tenha pedido, os tribunais devem ser intransigentes no que diz respeito aos direitos fundamentais”, disse. 

Lite ainda declarou que condenados por exercerem seus direitos básicos ganharão “perdão presidencial para esvaziar seus registros criminais”. O Conselho Superior de Magistrados também será informado para que haja punição adequada aos juízes, afirmou.

A HRW lembrou declaração de especialistas da ONU disseram no início da pandemia. “Lembramos urgentemente aos Estados que qualquer resposta de emergência ao coronavírus deve ser proporcional, necessária e não discriminatória”. 

De acordo com a organização, medidas de emergência não devem permitir às autoridades proibir ou reprimir manifestações pacíficas por razões políticas sob o pretexto de proteger a saúde.

Enchentes atingem República Democrática do Congo
Onde fica a República Democrática do Congo (Foto: Reprodução/Google Maps)

Queda de braço

Em março, o governo proibiu grandes reuniões, como forma de conter a propagação do coronavírus. Mas as forças de segurança do país passaram a usar força excessiva e letal para dissipar as multidões. De acordo com a HRW, só no começo deste mês, a polícia matou pelo menos três pessoas em manifestações de diferentes províncias. 

A resposta dos manifestantes também é agressiva. Um policial foi morto e outro ficou gravemente ferido pela multidão que os apedrejou. Há também relatos de destruição de propriedades públicas e privadas.

Abaixo, confira alguns dos relatos de repressão do governo:

Província de Congo-Central

Em 12 de julho, oficiais da agência nacional de inteligência prenderam Patrick Palata, editor da Tala Tala TV, em Matadi, próximo à fronteira com Angola. Ele foi interrogado sobre uma série de entrevistas na TV gravadas no dia anterior à sua prisão, sobre investigações  da morte de uma mulher que teria sido baleada por um dos guardas pessoais do governador durante um protesto contra pedágios. Ele foi libertado no dia 14 de julho, sem acusação, mas suas gravações foram confiscadas.

A província de Mongala

Os ativistas Peter Tetunabo, Taylor Engonga e Yannick Mokanga e o jornalista Fabrice Ngani, foram presos arbitrariamente em 9 de maio. Os quatro estavam prestes a entregar uma nota ao parlamento provincial criticando o governador Ngbundu Malengo por “má governança”. Eles disseram à HRW que não foram informados das acusações contra eles quando foram transferidos para a prisão em Lisala, capital da província. Engonga e Tetunabo foram libertados sob fiança. A acusação foi de desprezo pela autoridade, e não foram autorizados a retornar para suas cidades. Mokanga foi libertado sem acusações em 8 de junho.

Ngani foi libertado em 4 de junho e disse que foi maltratado em detenção. As autoridades provinciais proibiram Ngani e outros cinco jornalistas de exercer suas funções. “Não tenho meios e sou pobre, mas tenho enfrentado homens fortes”, disse ele à Human Rights Watch. Vários programas políticos de rádio também foram suspensos. 

Manifestações pacíficas reprimidas em 2020

Kinshasa

Em 30 de março, a polícia abriu fogo contra manifestantes do grupo Bundu dia Kongo, Ao menos três pessoas morreram e outras 11 ficaram feridas, segundo uma fonte da ONU. Os membros do Bundu dia Kongo estavam marchando para “perseguir o espírito do coronavírus”.

Kivu do Norte

Em 21 de maio, a polícia matou Freddy Kambale, 22, ativista da Luta pela Mudança (LUCHA), durante uma marcha de protesto contra a insegurança na cidade de Beni. Em 13 de julho, um tribunal condenou um policial, Eric Ombeni, à prisão perpétua pelo assassinato de Kambale. 

Kinshasa

De acordo com a polícia, três pessoas morreram – duas por eletrocussão e uma esmagada pela multidão – em 9 de julho, enquanto fugiam da polícia, interrompendo um protesto de rua contra o fechamento do mercado “Zando”, devido a restrições contra a Covid-19.

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